Rosas, Tom e Gaviões se destacam ao fugir do óbvio entre desfiles mornos
A primeira noite de desfiles do Carnaval paulistano trouxe escolas de samba técnicas, bonitas, beirando à perfeição, mas mornas. Com enredos estáticos, de romances, cidades, lendas e bairros, se destacaram as agremiações que foram além do óbvio.
Neste sentido, Rosas de Ouro, Tom Maior e Gaviões da Fiel, as três últimas, deram o seu recado. A Roseira tocou em uma ferida ainda aberta no Brasil: o racismo. A escola contou com personalidades negras no desfile e homenageou nomes importantes na história preta do Brasil.
No último carro, entre fotos de Glória Maria e Pelé, que morreram recentemente, a Rosas se mostrou atenta ao cenário atual e reproduziu a frase "Vocês existem e são valiosos para nós", dita pelo Ministro de Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, no seu discurso de posse, no mês passado.
Já a Tom Maior, na sequência, exaltou a força das mulheres pretas do Brasil e no mundo. A escola citou religiões de matrizes afro e também discursou contra o racismo e a intolerância religiosa, com o enredo "Um Culto às Mães Pretas Ancestrais", do carnavalesco Flávio Campelo.
A Tom também se destacou ainda por conta do seu samba. É um dos melhores da safra de 2023 e funcionou ainda mais na avenida com a voz de Gilsinho. O intérprete conquistou a arquibancada que cantou junto mesmo já com o sol nascendo.
Gaviões. Ainda na seara da crítica, a Gaviões da Fiel fechou a primeira noite, já com o dia claro. Com uma torcida literalmente 'Fiel' que aguardou a escola até o fim, mantendo as arquibancadas cheias, a agremiação fez um bonito Carnaval abordando a intolerância religiosa, com o enredo: "Em nome do pai, dos filhos, dos espíritos e dos santos... amém!".
Em todo momento, a escola dialogou com diferentes religiões e lembrou do sincretismo religioso ao associar na bateria São Jorge e orixá Ogum. Nomes como Irmã Dulce e Chico Xavier também foram citados no desfile.
Independente Tricolor, Tatuapé, Barroca e Vila Maria
Todas as escolas tiveram um bonito desfile visual e beiraram a perfeição para os jurados. A mais penalizada entre elas foi o Barroca Zona Sul, já que uma chuva intensa caiu enquanto a agremiação desfilava - mas que não fez a escola perder o ânimo.
Enquanto a Independente Tricolor descartou qualquer insegurança pelo fato de abrir o Carnaval, apresentando um enredo honesto e boas fantasias, a Tatuapé mirou em um enredo CEP. A escola homenageou a cidade de Paraty, litoral sul do Rio de Janeiro.
Embora a qualidade visual das alegorias e fantasias seja indiscutível, o enredo limitou a criatividade da Tatuapé. O primeiro setor inteiro da agremiação representava o mar de Paraty. Na sequência, a arquitetura, pontos turísticos e fatos curiosos sobre a cidade foi apresentado, bem como suas belezas naturais.
A Vila Maria por sua vez homenageou a si própria, o seu bairro e a sua comunidade. A ideia original parecia boa. Na pista, porém, a escola investiu em uma sequência pouco compreensível.
Era possível ver em linha reta um carro alegórico chinês, uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, um casal de mestre-sala e porta-bandeira vestidos em homenagem a Cubatão, uma alegoria enorme com o tema natalino e o Michael Jackson fechando o desfile.
É claro que existe uma explicação para tudo isso conforme o enredo. No entanto, é pouco provável que o público do Anhembi tenha compreendido o fio condutor de toda essa história.
O ponto positivo fica na inovação: a escola deu um spoiler sobre o que apresentará no ano que vem já nesse desfile. Em 2024, o enredo da Vila Maria será o cantor Michael Jackson.