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Fernando Calmon

FCA e Renault juntas? Fusão envolve governos e isso pode complicar tudo

Emmanuel Macron, presidente da França, em visita a unidade da Renault - Reuters
Emmanuel Macron, presidente da França, em visita a unidade da Renault
Imagem: Reuters

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

28/05/2019 07h00

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Foi missão complicada acompanhar, na segunda-feira, os desdobramentos do anúncio de negociação, na Europa, entre FCA (Fiat Chrysler Automobile) e Grupo Renault, ao mesmo tempo em que, aqui no Brasil, acompanhávamos o congresso "Automotive Business Experience", com a presença de diversos dirigentes importantes, anúncios (como a chegada este ano do elétrico da Caoa Chery ou do sedã de luxo Audi A8) e boas perspectivas para o Brasil. Um olho aqui, outro lá foi possível colher, entre participantes, que vai haver certo conflito de experiências de mercado, bem como um confronto de culturas, que não são iguais, entre os membros dessa hipotética fusão.

Não há caso prévio similar a este na indústria, e é preciso definir quem vai mandar em quem. Nesse tipo de fusão, apesar das promessas de constituição "50/50", é preciso saber quem vai presidir.

As cláusulas da proposta feita pela FCA à Renault são extensas e muito complexas, ainda se levará algum tempo até que terminemos de entender os detalhes, termos e meandros. Mas é possível apontar problemas de antemão: com exceção da linha da Jeep, não existe complementaridade das linhas de Fiat-Chrysler e de Renault.

Sobretudo na Europa, todos os modelos atualmente fabricados são concorrentes entre si e a união poderia trazer mais problemas internos que ganhos.

Mais: é necessário que a fusão passe pelo crivo dos governos, sobretudo o Governo da França.

Problema é que Governo da França tem a chamada "Golden Share" dentro do Grupo Renault -- detém 15% das ações do grupo automotivo, mas com poder de decisão.

Na mesa diretora, pela proposta feita pela FCA, estariam 11 membros: quatro da FCA, quatro da Renault e três vagas em aberto. Mas isso também traz a reboque a condição de que um CEO da futura empresa seja da própria FCA. E isso pode não agradar não apenas aos executivos da Renault. Pode desagradar o Governo da França -- estaria representado em uma dessas três vagas do conselho?

Nos Estados Unidos, o Grupo Chrysler foi salvo da bancarrota por acordo entre Casa Branca e acionistas, que permitiu a entrada da Fiat como garantidor do negócio.

Mesmo no Brasil, onde acaba de fazer dois anúncios de ampliação dos negócios -- um com injeção de R$ 7,5 bilhões na fábrica de SUVs da Jeep em Goiana (PE), outro, complementar, de R$ 8,5 bilhões na unidade da Fiat em Betim (MG) para motores -- boa parte dos avanços do Grupo FCA veio nos últimos anos como fruto de investimentos calçados em necessários acenos dos governos estaduais e mesmo federal em contrapartidas estabelecidas por planos como "Inovar-Auto" e "Rota 2020". E há cobrança dos compromissos assumidos lá e cá.

É preciso lembrar que este não é o primeiro aceno da FCA para os franceses. Antes, tentou acordo com a Peugeot Citröen, mas acabou rechaçada pela direção da PSA -- que tem menor grau de influência governamental do que a própria Renault.

Há ainda a necessária observação dos conselhos de regulamentação em diferentes mercados, seja na França, nos Estados Unidos e mesmo por aqui -- onde temos o Cade. Essa fusão fala em 8,87 milhões de unidades entregues ao ano, mas a (improvável) inclusão da Nissan no acordo elevaria o total a 15 milhões. Como ficaria a concorrência?

Pensando em Brasil, trataria de praticamente 31,7% de participação no mercado, coordenando mais de 1.300 concessionárias. A atual líder, GM, coordena "apenas" 18% do mercado de carros no Brasil.

Muita coisa deve e vai mudar nas próximas 48 horas, mas é certo que tudo o que envolve a participação do governo acaba sendo um negócio bastante complicado.