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Carro popular: por que plano do governo não resolve encrenca das montadoras

Pedro Ladeira/Folhapress
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Colunista do UOL

19/05/2023 12h00

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Na primeira quinzena de maio foram emplacados 88,7 mil automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus, números 3,5% superiores aos da primeira metade de abril, quando as vendas somaram 85,7 mil veículos. Os dados são preliminares do Renavam e foram obtidos pela reportagem da Agência AutoData.

Há, neste momento, expectativa de incremento das vendas no País. No entanto, mesmo que esse desempenho fosse muito superior do que as vendas diárias de 8 mil unidades [a melhor para a primeira quinzena no ano: em abril ficou em 7,8 mil unidades, superior às 7,3 mil de março], ainda assim seria insuficiente para ocupar as fábricas de veículos no Brasil.

Por isto está em gestação no governo um plano para ajudar a indústria automotiva nacional recuperar ritmo de produção e vendas que justifique as 4,5 milhões de unidades/ano de capacidade instalada aqui.

Muito tem sido especulado nos últimos tempos, desde que, durante o Seminário AutoData Megatendências, em março, surgiu pela primeira vez a sugestão de retomar a produção de um "carro popular" no País. Sim, fomos nós, de AutoData, que trouxemos em primeira mão a opinião de Antonio Filosa, COO da Stelantis para a América do Sul e de José Maurício Andreta Júnior, presidente da Fenabrave, os primeiros líderes deste setor a levantarem a questão naquele Seminário.

Desde então temos escutado diariamente pessoas ligadas ao tema e as negociações com o governo para a formatação daquilo que será anunciado muito provavelmente pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços Geraldo Alckmin no dia 25, na sede da Fiesp, em São Paulo. Independente do impacto das medidas a serem anunciadas, algumas constatações já podem ser antecipadas:

Nenhuma medida trará, de imediato, crescimento significativo das vendas. Especula-se incremento de, no máximo, 10%;

As fabricantes não vão sacrificar a segurança e a eficiência energética dos seus produtos, retirando itens para reduzir significativamente os preços;

Qualquer incentivo, como linha de crédito exclusiva para compra de veículos, terá efeito limitado e de curto prazo.

Executivos das empresas envolvidas, que estão visitando Brasília levando seus pleitos ao governo já que a Anfavea não participa das negociações, sob a condição de anonimato, dizem que está sendo muito importante o governo reconhecer as dificuldades de operar no Brasil.

E o fato de costurarem um plano para ajudar de alguma forma não só as empresas, mas também os consumidores que desejam comprar um carro zero km, é um grande passo para salvar o País da desindustrialização. Mas nada será imediato. Nem suficiente.

Encrenca é muito mais profunda: enquanto a população brasileira não tiver poder de compra real, esse problema vai persistir no setor automotivo. E não se trata apenas dos automóveis. É uma demanda estrutural, atinge grande parte da cadeia de valor do mercado interno.

Assim, as medidas de 25 de maio podem ajudar algumas fabricantes a venderem mais carros novos, talvez com alguma desoneração da carga tributária, talvez com estímulo ao consumo, talvez as duas coisas, além de outras medidas que surgem neste momento apenas no campo da imaginação.

Mas não há milagre: enquanto não houver quantidade significativa de trabalhadores empregados, estabilidade neste emprego, o poder de compra não aumentará. Claro, o crédito também precisa estar disponível com taxas mais baixas e contrapartidas duras aos maus pagadores, mas as condições precisam ser [muito] atraentes para o consumidor neste momento de grandes incertezas.

As fabricantes argumentam que a oferta de veículos mais simples, os chamados populares, não trará margens capazes de justificar um mix de produtos baseados apenas nesses modelos. Está claro que é preciso ter um carro com preço baixo, compatível com a média do consumidor brasileiro que deseja um zero km. Mas, também, será necessário criar melhores condições para que o degrau de cima, com preços acima de R$ 100 mil, continue crescendo.

Sem uma equação que envolva todos os segmentos e faixas de preços dos veículos, a questão da ocupação das fábricas não será resolvida. Até porque ninguém vai mudar a rota dos seus investimentos e transformar as atuais linhas de produção em fábricas de carros populares no exato momento em que se discute uma transformação sem precedentes como a produção de veículos híbridos e elétricos.

Os executivos mais pragmáticos dizem que vender carro para quem tem dinheiro é o melhor negócio. As marcas chinesas que estão chegando parecem que aprenderam essa receita rapidinho.

Assim, a única saída é fazer com que a população economicamente ativa no Brasil tenha dinheiro para que todos façam um ótimo negócio e saiam passear de carro novo.