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5 situações que provam que o brasileiro compra carro para o próximo dono

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Colunista do UOL

18/08/2022 04h00

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Vou lançar um desafio: quero que o leitor vá até a sua garagem, olhe para o seu carro e deixe nos comentários se ele é exatamente do jeito que você gostaria que fosse.

Arrisco dizer que a maioria não escolheu o carro para atender seus gostos pessoais, tampouco suas reais necessidades. O que mais vejo são escolhas que priorizam o que o próximo dono quer. Como não é possível saber quem será o proprietário seguinte, as escolhas passam a ser as mais comuns possíveis para atingir o maior número de futuros interessados no carro.

Aqui não cabem julgamentos, pois eu também, por mais que já tenha tido carros um pouco fora do comum, também penso em como seria uma possível revenda antes de fechar um negócio. Carros não são objetos descartáveis, mas sim bens de uso que exigem muitas horas de trabalho para serem adquiridos, portanto é natural valorizar aquilo que pagamos, planejando o quanto será recuperado no futuro.

Esse comportamento é antigo e não faltam exemplos que mostram como nós, brasileiros, somos influenciados a ter aquilo que o mercado considera como sendo bom, sempre com o pensamento de que pode facilitar a revenda. Separei cinco exemplos que provam isso.

Número de portas

Houve um tempo em que o brasileiro só queria saber de carro com duas portas. Muitos modelos só foram oferecidos assim, mesmo alguns com apelo familiar, casos de Ford Belina e Chevrolet Caravan. Outros que chegaram a ter opção de carroceria quatro portas tiveram vendas pífias nessa configuração, como Volkswagen Brasilia e Chevrolet Chevette.

Por mais prática que as portas traseiras fossem, passavam imagem de carro de serviço, como os de táxi, e o preconceito era forte. Também tinham desculpas esfarrapadas, como as de que a carroceria perdia resistência com as portas extras ou que as crianças poderiam abrir a porta com o veículo em movimento. Com isso, muitos casais com filhos acabavam seguindo a onda do mercado e optavam por carros duas portas.

Os anos foram se passando e esse conceito ficou no passado. O carro com só duas portas, que já foi preferência, hoje é um mico que ninguém quer ter, mesmo que seja alguém sozinho e que raramente ande com mais pessoas no carro.

Escolha da cor

Estive no lançamento do novo Hyundai HB20 e, para minha tristeza, apresentaram uma paleta de cores das mais deprimentes. Das seis opções, apenas um belo tom de azul foge do comum - o restante são variações de prata, cinza, preto e branco. Até mesmo o clássico vermelho ficou fora.

Amarelo, verde, laranja e afins? Essas morreram há décadas. Inclusive se pudéssemos voltar no tempo veríamos ruas bem mais coloridas. As cores que hoje são padrão, no passado era exceção. Quantos Fuscas pretos e pratas o leitor já viu? Provavelmente poucos.

A escolha da cor tem tudo a ver com a preocupação de uma possível dificuldade de revenda. No exemplo que dei do HB20, é mais do que certo que o belo azul será a cor menos escolhida. Tenho certeza de que muitos donos de carros pretos, pratas ou cinzas gostariam que fossem com cores mais exclusivas.

Tipo de combustível

Sabe aquela história de escolher um combustível que seja mais limpo e melhor para o meio ambiente? Papo furado. Convenhamos que a escolha do combustível está atrelada, na maioria das vezes, ao que é mais favorável para o próprio bolso.

O Brasil já teve momentos em que quase toda a frota de veículos era movida a álcool, mas a partir do momento que ficou desinteressante, os movidos a gasolina voltaram a reinar - isso em um tempo em que nem se falavam de diesel em carro de passeio.

A solução para melhor atender as flutuações da economia foi desenvolver um motor que aceitasse os dois tipos de combustível, algo que aconteceu nos anos 2000 com a tecnologia popularmente chamada de flex. Rapidamente os "não flex" passaram a ser rejeitados, o que forçou a indústria aplicar até em modelos de luxo, destinados a um público que possivelmente nem se preocupe com os centavos que está economizado com a escolha de um ou de outro combustível.

Hoje essa tecnologia evoluiu bastante, mas é certo que não tem a mesma eficiência que teria se fosse calibrado para rodar somente com um combustível. Fora os problemas mecânicos que surgiram na onda no flex. Basta conversar com um dono de oficina mecânica para atestar isso. No fim, a tecnologia que deu liberdade de escolha no abastecimento está longe de ser unânime, mas todos são "obrigados" a aceitar para atender o mercado.

Tipo de câmbio

Cresci escutando que carros automáticos eram para preguiçosos, idosos ou pessoas com deficiência. Carros manuais reinavam em todas as categorias. Mas os primeiros foram ficando cada vez mais confiáveis, resistentes e acessíveis, portanto, mais aceitáveis. Quem tinha aqueles preconceitos do passado só precisava de alguns minutos ao volante para reconhecer seu conforto no uso diário.

Mais uma vez o costume mudou a ponto de praticamente eliminar a outra opção. Como "ninguém" mais quer carro manual, comprar veículos assim passou a ser uma péssima escolha pensando na futura revenda. Mesmo quem realmente tem prazer em guiar carros manuais acaba optando pelo automático.

Tipo de carroceria

Os utilitários esportivos estão com tudo, mas quantas pessoas realmente precisam deles? Caros, pesados e beberrões, nem são tão espaçosos como suas infladas carrocerias sugerem. Inclusive em alguns exemplos perdem em espaço interno e de bagagem, como no caso do Toyota Corolla sedã em comparação com o irmão SUV Corolla Cross.

Mas nem sempre foi assim. Quando surgiram, eram associados a carros com apelo familiar, e nem todos queriam passar essa imagem. Aí veio o Ford EcoSport e popularizou a categoria, que em pouco tempo passou a ser preferência nacional. As peruas morreram, os sedãs estão agonizando e em breve não teremos nada que não sugira ser um SUV.

Eu lamento que seja assim, mas como nos exemplos acima, é como as coisas funcionam. No fim, compramos carros para o próximo dono. Quantos aqui têm um SUV automático, flex, prata e quatro portas na garagem?

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