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OPINIÃO

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Inimigos do carro popular: por que não existe mais veículo barato no Brasil

Colunista do UOL

04/05/2023 12h00

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Antes de completar a maioridade, dediquei boa parte da minha vida planejando a compra do meu primeiro carro. Ciente das poucas chances de ganhar um automóvel dos meus pais, comecei a trabalhar com 16 anos e felizmente consegui juntar o suficiente nos anos seguintes para concretizar esse sonho.

Naquela ocasião, a imprensa noticiava o projeto Arara-Azul da General Motors. A ideia era simplificar ainda mais o Chevrolet Corsa, não só em equipamentos e acabamento, como também no próprio processo de construção, com o objetivo final de oferecer o modelo por menos de R$ 10 mil e se tornar o carro mais barato do Brasil.

A situação estava favorável para mim, restava apenas esperar o lançamento do carro e meu aniversário de 18 anos. Por coincidência do destino, as duas coisas aconteceram bem próximas, lá no ano 2000.

O Arara-Azul acabou sendo batizado de Celta, e fui conhecer o veículo em uma concessionária da Chevrolet. O Celta nasceu extremamente simples e parecia ter apenas o necessário para ser chamado de "carro". Eu nem ligava para isso, apenas queria sair de lá com meu automóvel próprio.

Mas não rolou. O preço beirava os R$ 14 mil, bem acima do previsto no início do projeto. O jeito foi ir para o mercado de usados e comprar algo que meu dinheiro pudesse pagar.

Independentemente disso, o Celta foi um sucesso, assim como foi o Fiat Uno, Volkswagen Gol, e qualquer outro carro tido como "popular" aqui no Brasil.

Hoje não temos mais esse tipo de carro. Os mais baratos beiram os R$ 70 mil, o que me faz pensar que se estivesse completando 18 anos hoje, possivelmente nem me planejaria para comprar um carro zero km, de tão distante que estaria da minha realidade.

Faz falta, na minha opinião, esse tipo de carro. Sendo bem realista, nada leva a crer que teremos algo do tipo em um futuro próximo pelos seguintes motivos:

Desinteresse

Para os fabricantes, não faz mais sentido oferecer carros baratos. O volume de vendas pode até ser bom, mas a margem é muito baixa e passa a ser desinteressante investir em projetos assim. Alguns exemplos, como o da Ford, têm mostrado que é melhor focar no mercado dos endinheirados - que é pequeno, mas suficiente para ser mais lucrativo do que antes.

Falha no airbag da Takata resultou no maior recall de automóveis da história - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

Excesso de itens de segurança

Hoje nossos carros são obrigados a ter duplo airbag, freios ABS, cintos de segurança de três pontos e apoio de cabeça para todos passageiros, assim como controles de estabilidade e tração. A tendência é que as exigências futuras sejam ainda maiores.

Não sou contrário aos itens de segurança, tenho certeza de que salvam vidas, mas esses são um dos fatores que encarecem nossos carros. Será que essa questão é uma preocupação de quem está cada vez mais distante dos carros devido aos preços? Será que viajar em pé em um ônibus lotado ou pilotar uma motocicleta é mais seguro do que um verdadeiro carro popular sem esses itens?

Tecnologia dos motores

As exigências por carros mais eficientes do ponto de vista energético têm encarecido os investimentos nos propulsores. Até mesmo projetos antigos, de décadas passadas, estão recheados de tecnologias, como variadores de fase, injeção direta e turbocompressores, só para ficar em alguns exemplos.

É um caminho sem volta. O motor daquele Celta que quase foi meu primeiro carro hoje não atenderia os critérios de emissões de poluentes. Simples, robusto, econômico e com baixa manutenção, atendia muito bem a realidade do brasileiro. A evolução desse motor ainda vive no cofre do Chevrolet Spin, mas são tantas modificações que parece outro propulsor.

O carro elétrico pode ser bom, mas também tem as suas desvantagens - Shutterstock - Shutterstock
Imagem: Shutterstock

Elétricos

Muito se fala dos carros elétricos. Já testei vários e são bem legais, mas são inimigos do baixo custo de produção, portanto distantes de servirem como carros populares. Pensando em um país como o nosso, ainda acredito que os elétricos continuaram sendo para poucos, por mais que muitos colegas pensem o contrário.

Ao que parece, os fabricantes estão arrastando as asinhas para eles, o que novamente demonstra, para mim, o desinteresse em atender parte dos brasileiros que quer apenas um carro barato.

Crédito

Se os preços dos carros estão nas alturas, uma maneira de conseguir alcançá-los é através de financiamentos. Mas, como o leitor bem sabe, os juros do nosso país estão entre os mais altos do mundo.

Enquanto não mudar isso, o comprador pode até visitar as concessionárias e sentar na mesa para negociar, mas assim que o vendedor apresenta os valores das parcelas do financiamento, o plano da compra é adiado.

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