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Câmbio automático: como funciona a manutenção obrigatória que gera polêmica

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Colunista do UOL

31/05/2022 04h00

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Para a dica de hoje eu revisito o assunto sobre troca de óleo de câmbio, especialmente da transmissão automática, para esclarecermos alguns pontos de uma vez por todas e iniciarmos uma discussão que, se acharem pertinente, podemos destrinchar com mais cuidado.

Tive uma conversa riquíssima sobre esse tema com Danilo Silva, engenheiro de aplicações, e Elvira Brito, gerente técnica, ambos da Motul, que desenvolve e comercializa óleo lubrificante para diversas aplicações na área automotiva.

O primeiro ponto da conversa foi, claro, se é ou não necessária a substituição do óleo do câmbio automático. E a resposta do Danilo, para o meu conforto, foi sim - não só para esse tipo, mas para o mecânico também.

Satisfeita com esse início, comecei a fazer os questionamentos clássicos, como por exemplo sobre os manuais de proprietário que não mencionam nada a respeito dessa manutenção - ou pior, que designam o componente como "For Life", ou seja, para vida toda.

Danilo ressaltou que algumas montadoras já estão mudando essa postura e prevendo a substituição do óleo do câmbio automático, mas que, realmente, ainda algumas persistem na ideia de que o óleo de câmbio é "eterno" - e é nesse caso que o céu fecha.

O que conversamos foi que, na realidade, o que as montadoras com essa postura estão determinando é que você não precisa substituir o óleo do câmbio automático até o fim da vida da caixa de câmbio. E aí temos uma grande questão.

A ideia é que você use a caixa de câmbio até quebrar. Aí você arrumará sua caixa e, consequentemente, trocará o óleo dela. Ou comprará uma caixa de câmbio nova, com tudo zerado, inclusive o óleo.

Só que sabemos que a vida real não aceita muito bem esse modelo de consumo, né? Em alguns países pode ser tranquilo substituir uma caixa de câmbio depois de cento e poucos mil quilômetros, mas aqui no Brasil precisamos de outra solução.

Ter um plano de manutenção preventiva que inclua a troca do óleo de câmbio fará com que o tempo de vida da caixa seja prolongado e talvez a peça nunca quebre - pelo menos não devido ao óleo que deixou de fazer o que deveria lá dentro. Daí a importância máxima dessa conversa.

Então você está falando para desrespeitarmos o manual do proprietário, com que você enche tanto a nossa paciência?

Nesse caso, sim. Mas ainda precisamos respeitar o fabricante da caixa de câmbio. Esse sim vai recomendar a substituição do óleo lubrificante do componente que ele fabrica com um período de uso certinho e, como sempre, especificações.

Uma observação importante que temos que fazer aqui antes de prosseguirmos é que é muito comum vermos nos manuais de montadoras, que não preveem a troca desse óleo, a recomendação de fazer a substituição apenas se o carro rodar nas famosas "condições severas".

Mas vejam só: que carro não anda em condição severa? Só os que têm a maior parte da sua vida rodando em estradas. Condição severa diz respeito a carros que:

- só fazem percursos pequenos (já falamos, mais de uma vez, sobre como percursos pequenos ou ficar muito tempo parado faz mal para o carro);

- pegam muito trânsito

- trafegam em estradas de terra.

Ou seja... quase todos.

Então é altamente provável que seu carro se encaixe em um desses perfis e precise da troca do óleo de câmbio para que o "For Life" da sua caixa de câmbio não seja ainda menor.

Mas, por favor, não esqueçam da discussão inicial. Qualquer caixa de câmbio precisa dessa manutenção preventiva se vocês não quiserem que ela faleça e tenha que ser totalmente substituída.

"Está bom, mas como essa troca tem que acontecer?"

Aqui chegamos em um ponto com algumas derivações muito importantes:

1) Existe a troca parcial e a troca total do óleo de câmbio. Em uma caixa de câmbio mecânica, onde a retirada do óleo é feita por gravidade, vamos tirar tudo mesmo (em um sentido generalista da palavra, né? Alguma coisinha sempre fica lá dentro) e colocar o óleo novo até o nível correto.

Mas em uma caixa de câmbio automático, com um circuito complexo de lubrificação, a troca parcial pode significar alguma coisa entre 40 e 60% de substituição que não é legal. O óleo do conversor de torque, por exemplo, não é trocado em uma parcial - e tem muito óleo ali dentro.

2) O tipo de máquina que realizará esse procedimento também faz diferença. Máquinas manuais dependem demais da experiência do profissional que a está operando, enquanto que as automatizadas pesam o óleo que está saindo pra repor a mesma quantidade.

Aqui temos que fazer um parêntese também. A máquina devolver para o câmbio a quantidade exata que saiu não quer dizer que tudo esteja certo. É preciso conferir o nível do óleo depois da troca, pois se alguma coisa aconteceu e essa caixa de câmbio estava com a quantidade errada de óleo, a máquina devolverá para ela a quantidade errada. Ela não tem a inteligência para identificar uma situação dessas.

3) Não estranhem se cerca de 20% a mais da capacidade de óleo da sua caixa de câmbio aparecer na nota de serviço. Deixando muito simples para vocês entenderem, é normal o profissional usar essa quantidade excedente pra garantir uma troca de melhor qualidade. Fazemos isso com fluido de freio também, por exemplo.

Quando é preciso substituir o fluído de freio, abrimos os sangradores das rodas até ver sair um fluido bem clarinho, indicando que a limpeza no sistema foi eficiente.

4) E não custa lembrar, que a especificação do óleo que será colocado na caixa de câmbio tem que obedecer rigorosamente o que o fabricante (da caixa) determina.

Se eu não convenci vocês até agora, então acrescentarei uma informação do papo com Danilo, que talvez faça diferença. Para aqueles que acreditam que o óleo de câmbio está ali, super seguro e isolado, dentro de um circuito perfeitamente hermético, saiba que o sistema tem um respiro. Pois é, então temos o óleo de câmbio se degradando por, basicamente, dois fatores principais:

- oxidação (padrão de qualquer óleo)

- contaminação externa, que acontece, em geral, por água. Água que pode vir do exterior, através do respiro, ou do sistema de arrefecimento do carro, que também precisa arrefecer o câmbio automático.

Não é raro termos defeitos que permitem que o líquido de arrefecimento (composto por água desmineralizada + aditivo para radiador) invada a caixa de câmbio automático, especialmente quando o sistema conta com um pequeno radiador de óleo perto do câmbio.