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Por que SP anda na contramão ao liberar estacionamento em calçadões
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Quando o assunto é priorização da circulação a pé, a legislação brasileira avançou muito na última década. Porém, os espaços de pedestres permanecem inadequados, sobretudo para quem possui mobilidade reduzida ou deficiência. Os poucos espaços que privilegiam a circulação de pedestres são constantemente ameaçados.
Recentemente foi anunciado que calçadões localizados na Área Central de São Paulo serão destinados para o público do Theatro Municipal estacionar seus veículos no período noturno sob a justificativa de que esses não são utilizados por pedestres após o cair da noite.
Entre outras questões, essa justificativa está relacionada com o esvaziamento das áreas centrais, fenômeno que atingiu a maioria dos centros urbanos e está estritamente vinculado com a redução do número de moradias e aumento do número de estabelecimentos comerciais e de serviço, o que torna esses espaços muito dinâmicos durante o dia e praticamente desertos durante noite.
Em geral, há um grande volume de pedestres que tem interesse em frequentar as lojas, mas também em conhecer o patrimônio histórico da cidade - materializado em prédios e estátuas, no piso da calçada e em inúmeros detalhes que aos poucos constroem o imaginário coletivo da cidade.
Características que, em outras capitais latinoamericanas como Bogotá-CO, Quito-EC e Montevidéu-UY, motivaram medidas para qualificar os espaços públicos e os tornar mais seguros para pedestres, por exemplo a implantação de calçadões, o alargamento de calçadas e a redução de velocidade veicular.
Em alguns casos os calçadões não foram bem-vindos, como quando foram relacionados com a queda no volume de vendas dos estabelecimentos comerciais. Porém, com o tempo, foram incorporados à rotina da cidade e, por vezes, disputados entre pedestres, mesas e cadeiras de restaurantes, comércio de ambulantes e placas de "compro ouro". Ademais, após a pandemia do novo coronavírus, converteram-se em espaços seguros de convivência pública como alternativa aos espaços enclausurados e climatizados com ar condicionado.
Cheios ou vazios, muitas pessoas questionam a permanência dos calçadões enquanto espaço exclusivo para pedestres, principalmente em cidades onde políticas de priorização do transporte ativo (pedestres e ciclistas) não avançaram no sentido de ampliar gradualmente restrições à circulação veicular como fizeram capitais nacionais europeias - Barcelona-ES e Paris-FR -, ou cidades de países vizinhos da América do Sul - tais como Buenos Aires-AR e Medellín-CO.
Destaca-se a cidade colombiana que recentemente assinou uma lei prometendo banir a circulação de veículos movidos a gasolina após 2035 com a intenção de melhorar a qualidade do ar, que nos últimos anos atingiu índices que colocam a vida da população em risco.
A medida anunciada pela cidade de São Paulo - uma semana antes de seu aniversário de 469 anos, comemorado nesta última quarta-feira (25) - gerou polêmica. Grupos da sociedade civil, da academia e de especialistas em geral explicaram que a ação de transformar calçadões em estacionamentos no período da noite, para além de induzir a deterioração dos calçadões - que certamente serão danificados pelos veículos -, vai na contramão das tendências globais de redução da circulação de veículos para privilegiar o uso do transporte a pé, por bicicleta e transporte público coletivo em centros urbanos.
Além de impor um desafio adicional para quem circula pelas ruas da Área Central de São Paulo à noite, uma vez que cria obstáculos e lugares hostis para pedestres que, em tempos de aumento da insegurança pública, podem desestimular ainda mais o uso de áreas centrais da cidade.
Também já circulam nas redes sociais fotos e vídeos denunciando o estacionamento de veículos durante o dia, todos ocupando as vagas que já foram demarcadas no pavimento dos calçadões, ou seja, sobre áreas calçadas com pedras portuguesas, ao lado de estátuas e à frente de prédios históricos.
Ocupação ligeira que deixa evidente a leitura causada por essa demarcação das vagas no espaço que, apesar de coletivo e voltado para pedestres, pode estar sob a ameaça de tornar-se mais um estacionamento banal a céu aberto para uso exclusivo de veículos privados, dentre as centenas que já existem.
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