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Como disputa entre Nescau e Toddy trouxe primeiro Dodge Charger ao Brasil

Colunista do UOL

23/10/2021 04h00

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(SÃO PAULO) - Encerrada há poucos dias, a última promoção do Toddy foi assim: você comprava um pote do Chocobranco ou do Cacauzêra, cadastrava o cupom fiscal e recebia o valor da compra de volta por um aplicativo.

Mas houve um tempo em que as campanhas envolvendo o achocolatado sorteavam muito mais do que os R$ 9 que custa em média um pote do produto: em 1968, quem encontrasse um vale-brinde nas latas de Toddy poderia ganhar foguetes, bonecas astronautas, Fuscas ou, o mais sortudo dos participantes, um Dodge Charger.

Charger Toddy prop - Divulgação  - Divulgação
Imagem: Divulgação

"Tudo começou com uma série de premiações do Nescau, com liquidificadores, TVs e até um Fusca. O fabricante do Toddy viu suas vendas caírem e reagiu dando, além de brinquedos e Fuscas, também um Dodge Charger. Daí todo mundo começou a comprar Toddy", relembra Fabio Pagotto, fundador e diretor do Chrysler Clube do Brasil.

Vale frisar que não se tratava do Charger nacional, que seria lançado dois anos depois, mas sim da versão americana; e que o exemplar da promoção foi a primeira unidade do muscle car a desembarcar por aqui.

Lançado em janeiro de 1966, o modelo fora anunciado como "o novo líder da rebelião Dodge". Dali para a NASCAR e para o cinema - The Dukes of Hazzard e Bullitt - foi um pulo.

Ocorre que a vida deste Charger não foi tão doce quanto um copo de Toddy.

"Dizem que foi uma família do bairro do Jabaquara (zona sul de São Paulo) que levou o sorteio. Em 1995, o Betão, especialista em modelos do tipo, comprou dessa família e começou a desfazer algumas alterações que o carro sofreu, como motor e câmbio de Opala quatro-cilindros, rodas que não eram dele e até um para-brisa de Maverick. Ele começou então a reerguer o carro, mas em 1998 o vendeu", relembra o colecionador Márcio Gouvêa.

Dali, o Charger "Toddy", como ficou conhecido, pulou de mãos em mãos. "Todo mundo que pegou o carro tentou fazer muito por ele, mas sem condições financeiras", concluiu Gouvêa.

Alexandre Badolato, dono da maior coleção de Dodges no Brasil, também se recorda das escabrosidades sofridas pelo Charger: ëscondido por anos, esse carro era uma lenda. Até um dia aparecer num encontro de antigos do Pacaembu todo transformado, com para-brisa de Maverick, assoalho de Kombi e cheio de massa. Daí pulou de mãos em mãos por uns 20 anos, mas nunca conseguiu voltar ao estado original".

Jornal Charger Toddy - Arquivo pessoal  - Arquivo pessoal
A nota no jornal informava sobre o desembarque do Charger no Brasil
Imagem: Arquivo pessoal

Pois o Dodge Charger 1968 na cor Brighton Red está renascendo das cinzas, 53 anos após desembarcar aqui para cumprir a missão de ser um presente de sorteio.

Há dois anos um colecionador decidiu mudar de vez o trágico destino desse raro Dodge. "Foram muitas mudanças ao longo dos anos. O motor chegou a ser trocado por um seis-cilindros, que depois deu lugar a um quatro-cilindros de Opala. Alguém fazia uma besteira e o próximo dono consertava. Daí passava para outro dono, que novamente fazia uma mudança. E assim o carro foi sendo destruído", explica Fabio, o atual proprietário.

Charger Toddy banco - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Imagem: Arquivo pessoal

Pintado de preto, com painel desmontado, vidros riscados e acabamentos puídos ou toscamente remendados, sem rodas e muitas das peças originais, parecia se tratar de outro carro quando Fabio o resgatara. O azar, contudo, ainda demoraria para desgrudar desse Charger.

"Compramos muitas das peças, como frisos, para-choques e pneus, logo no início da restauração. Só que elas ficaram perdidas por um ano e meio devido a complicações na alfândega. Quando um amigo me perguntou se eu não estaria interessado em peças de Dodge que estavam num container em Santa Catarina, descobri que na verdade aquelas eram as minhas peças", conta.

Meticulosamente restaurado, o primeiro Charger importado enfim terá sossego.

"Tentei fazê-lo igual a quando ele nasceu. E ele aceitou. Foi por isso que consegui terminar o carro. Fui apenas um meio. Vou curti-lo, dirigi-lo, mas depois disso adoraria que ele fosse para num museu, onde outras pessoas pudessem conhecê-lo. Ele pertence mais à história da indústria nacional do que a mim", sonha o colecionador.