Motos, 1/4 da frota do país, seguem 'invisíveis' para candidatos a prefeito
Os prefeitos eleitos e reeleitos, que tomarão posse em 1º de janeiro próximo, deveriam por força das atuais circunstâncias conhecer de maneira profunda as demandas dos motociclistas brasileiros.
Estatística do Ministério das Cidades e do Denatran (Departamento Nacional de Trânsito), obtida por intermédio de dados do Renavam (Registro Nacional de Veículos Automotores) de agosto, indica que 26,3% da frota circulante no país é composto por motos e similares. Aos carros de passeio, cabe a parcela de 56,2% do total da frota nacional -- que tem pouco mais de 74 milhões de veículos. Ou seja, o carro bate a moto em uma proporção de 2 para 1, no momento.
Um olhar mais aprofundado nos dados revela que o crescimento na frota de motos na última década foi de cerca de 236%, percentual largamente superior ao desenvolvimento da frota de carros de passeio no mesmo período, 81%, e ao pulo que o total de veículos deu de 2002 a 2012, estimado em 110%.
Os números impressionam e revelam uma realidade que já está sob o sol do Brasil faz algum tempo, goste-se ou não: em nosso país se anda cada vez mais de motocicleta.
Para aqueles que administrarão as cidades brasileiras nos próximos quatro anos, prestar atenção nestes eleitores, que se locomovem cada vez mais com um guidão nas mãos, seria obviamente sábio. Saber do que eles precisam, como melhorar as condições de uso do veículo, como preparar as vias da cidade para o crescente fluxo de motos e como gerir a relação -- nem sempre fluida e/ou amistosa -- entre motociclistas, motoristas de carros e ônibus e caminhoneiros deveria ser prioridade, especialmente nas grandes cidades.
EM SÃO PAULO, CANDIDATOS IGNORAM A MOTO
Ainda assim, os candidatos que em poucos dias disputarão o segundo turno das eleições na cidade de São Paulo não parecem estar muito sensíveis a questões relacionadas à moto e seus usuários.
Na maior metrópole do país, ela é vista de forma ambígua: para uns é a solução de transporte ideal, com economia de tempo e combustível; para outros (motoboys ou motofretistas), é a ferramenta do ganha-pão diário; há a "tribo" que enxerga a moto como um veículo mágico, apaixonante, e faze dela o modo de lazer preferencial; e, na contra-mão destes, estão os que estigmatizam o veículo de duas rodas por razões variadas, parcela da população que gostaria de ver motos e motociclistas fora das ruas.
Fernando Haddad (PT) ou José Serra (PSDB), seja quem for o futuro prefeito de São Paulo, assumirá uma cidade com quase 1 milhão de motocicletas, 13% do total de veículos que rodam na capital. Minoria, é certo, mas que, como dito no início, é crescente e que necessita de atenções específicas. Infelizmente, uma breve análise dos respectivos programas de governo revela que nenhum deles deu a devida atenção às motos e seus usuários.
No projeto do tucano, a motocicleta é citada timidamente, mas de maneira positiva ao motociclista: o político revela a intenção de implantar novas moto-faixas, "acompanhadas de campanhas de educação no trânsito e uso adequado dessa faixa de rolamento". Em que pese a revelada intenção da administração atual, do prefeito Gilberto Kassab e da atual gestão da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), de não mais dar continuidade a tal solução, entre vários motociclistas há consenso de que as faixas exclusivas da avenida Sumaré e da rua Vergueiro são uma iniciativa conveniente.
Outra pequena bola dentro de Serra é mencionar a criação de novos bolsões de estacionamento para motos na região central da cidade e no entorno da avenida Paulista, necessidade que foi tema desta coluna em outubro passado (releia aqui).
Já no programa de governo petista, na única vez que a palavra motocicleta é citada, a referência tem caráter punitivo, com promessa de "aumentar da quantidade de equipamentos de controle de velocidade de motocicletas". Haddad revela, também, a intenção de "aprimorar e ampliar os cursos de aperfeiçoamento para motofretistas", algo positivo. Mas é superficial a intenção de "oferecer qualificação profissional para jovens que atuam em áreas não formais de trabalho (como DJs, motoboys, web designers etc.)", o que dá margem a imaginar que o candidato, e/ou sua equipe, desconhecem que motoboy (ou motofretista) é atualmente uma atividade regulamentada e, portanto, não exatamente "informal" na acepção do termo.
Em manifesta exibição de menosprezo face às necessidades dos que rodam com o quase milhão de motos na capital paulista, Haddad oferece bem mais espaço às bicicletas em seu programa de governo, dedicando no capítulo "Mobilidade Urbana e Transporte Público" extenso tópico às bicicletas, com seis itens/propostas que premiam e incentivam seus usuários, algo louvável. É certo que a bicicleta é um potencial veículo de transporte na cidade, e cujo uso deve ser promovido e incentivado, mas é mais certo ainda que a moto e seus usuários, não apenas por representarem massa infinitamente maior de cidadãos, são confirmadamente vetores majoritários da mobilidade paulistana e precisariam, sim, de sólidas propostas para a melhoria das condições de utilização. Para o bem não apenas dos motociclistas, mas da comunidade como um todo.
MOTO É PRÁTICA
Salvo engano, nem Serra, nem Haddad são ou foram motociclistas. Talvez, o último prefeito de São Paulo que realmente andava de moto foi Miguel Colassuono, que comandou a cidade de 1973 a 1975 de modo "biônico" (indicado, não eleito diretamente). Na época, motos eram poucas e demandas de trânsito relacionados ou não a elas, idem.
Todavia, para gerir bem São Paulo ou qualquer outra cidade brasileira, mais do que experiência prática ao guidão serve a capacidade de analisar aprofundadamente as necessidades dos habitantes da cidade. E a cidade de São Paulo, dona da maior frota de motos do país e da maior quantidade de problemas a elas relacionados, não pode ter um prefeito que ignore esta condição.
Cercar-se de "especialistas de trânsito", teóricos sem a devida vivência ao guidão, não serve. Deixar experientes motociclistas opinarem sobre propostas de soluções aos mais frequentes problemas que os assolam no dia a dia seria o mais inteligente passo que qualquer prefeito, de qualquer cidade brasileira, poderá dar.
MOTONOTAS!
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+ Francis Maris Cruz, prefeito eleito de Cáceres (MT), não é um político de carreira, mas sim um bem-sucedido empresário, que do nada construiu um império empresarial cuja base são dez concessionárias de motocicletas espalhadas nas regiões Norte e Centro-Oeste. A cidade que administrará tem, de acordo com os dados do Denatran, uma frota total de 33.656 veículos, dos quais a maioria (56,7%) são motocicletas.
+ Norte, Nordeste e Centro-Oeste são as regiões onde a proliferação do uso da motocicleta apresenta maiores índices. E não apenas, como seria mais fácil supor, em cidades pequenas, desprovidas de infraestrutura.
+ Juazeiro do Norte (CE), é exemplo de uma grande cidade nordestina onde a proporção motos-automóveis é francamente favorável às duas rodas: da frota de quase 78 mil veículos, 44 mil são motos (56,8%). Seguem o mesmo perfil Sobral (também cearense, com 64,3% de motos contra 25,2% de carros em frota de 65 mil veículos, Ji-Paraná (RO), com frota de 66 mil veículos, 55,2% dos quais motos, e Mossoró (RN), com 107 mil de frota e 47,6% de motos contra 38% de carros.
+ São Paulo, Estado mais rico e populoso da federação, mostra que apesar do maior poder aquisitivo e melhor infraestrutura que as encontradas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, o aumento na preferência pela moto é crescente, especialmente nas cidades do interior. Bom exemplo é a rica Araçatuba, conhecida como a "capital do boi gordo", pelo forte peso da agropecuária na economia local, que tem uma frota de 138 mil veículos dos quais 37,5% são motos (47,3 % de carros).
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