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Por que montadoras pedem que Lula reviva imposto de 35% para carro elétrico
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Em sua tradicional coletiva de imprensa para apresentar os resultados do último mês, na última terça-feira (7), a Anfavea - associação das montadoras - fez uma declaração um tanto polêmica: revelou que pretende pedir ao governo Lula o fim da isenção de imposto de importação para os carros elétricos.
Com a mudança, haveria a incidência de 35% de tributo sobre o preço dos veículos elétricos importados de países fora do acordo comercial com o Brasil (Mercosul e México). Essa alíquota já foi cobrada dos modelos a bateria importados.
Afinal, o que está por trás do pedido?
Segundo a Anfavea informou a esta coluna, a questão tem sido discutida dentro da comissão de veículos elétricos da entidade, que tem membros das 26 associadas, e ainda não foi levada ao governo - já que não existe um consenso sobre quando a barreira alfandegária a elétricos importados deveria ser imposta.
"A ideia é ter um horizonte para as montadoras se programarem com previsibilidade. A grande meta é de que, no final da década, tenhamos produção plena de híbridos e elétricos no país", afirma a Anfavea.
Durante a coletiva de imprensa, o presidente da entidade, Márcio Leite, disse que a intenção é proteger o mercado brasileiro de uma possível inundação de produtos elétricos de países com custo mais baixo de produção -que poderiam competir com os veículos de volume a combustão e prejudicar nossa indústria de autopeças.
Cobrança segundo cotas de importação
Ainda não se sabe se a proposta incluirá veículos híbridos - que unem motores elétricos e a combustão.
Além disso, a ideia é de não afetar as montadoras de luxo, que vendem em menor volume, pois pretende-se manter uma cota de importação com imposto zerado.
Nesse cenário, quem sofreria mais seriam as chinesas, como JAC, BYD e GWM, que têm a missão de vender modelos em maior volume.
A Renault, que faz parte da Anfavea e comercializa o e-Kwid, um dos elétricos mais baratos do país, também seria impactada.
Diante das informações postas à mesa, é difícil não interpretar que a Anfavea pretende proteger as montadoras que produzem no país das que importam elétricos da China.
Atualmente, comparando dois modelos equivalentes, um carro elétrico custa, em média, o dobro de um equivalente a combustão.
Mas a tendência é de que essa diferença caia nos próximos anos, principalmente com chegada de mais carros da China - onde o custo de produção é menor.
Os elétricos de baixo custo poderiam concorrer com hatches, sedãs e SUVs a combustão das marcas generalistas.
Carro elétrico ainda é muito caro
As importadoras de elétricos de entrada, hoje vendidos na faixa de R$ 150 mil, argumentam que o mercado desse tipo de produto ainda é muito pequeno para um protecionismo tão grande.
Na prática, a medida inviabilizaria para muitos brasileiros a aquisição de carros com zero emissão, já que o elétrico mais barato saltaria para mais de R$ 200 mil.
Para o consultor automotivo Cássio Pagliarini, da Bright Consulting, o objetivo da Anfavea com essa solicitação é equilibrar a concorrência entre o veículo elétrico produzido aqui e o veículo a baterias importado importado.
Segundo o especialista, com o imposto de importação zero, até as montadoras que têm amplo parque industrial no Brasil preferem importar seus veículos elétricos.
"Para veículos elétricos, essa medida é ainda mais sensível, pois todas as montadoras têm modelos disponíveis nos seus portfólios na Europa, nos EUA ou na China", afirma.
Ele explica que, nesses casos, a produção local tem uma competição interna dentro da própria empresa.
É o caso da Renault, que produz carros no Brasil, mas importa o Kwid elétrico da China.
"As alternativas em discussão vão desde a simples elevação linear da alíquota do imposto de importação para os eletrificados importados até programas mais severos que limitem a importação com imposto de importação reduzido para empresas que não disponham de produção local", pondera Pagliarini.
"Essa última alternativa é mais radical, pois corta a importação de novas tecnologias por empresas que não estão instaladas por aqui e que não têm escala para montar uma produção nacional, privando o consumidor brasileiro de avanços tecnológicos mais audaciosos. A decisão final deve ser balanceada", complementa.
Efeito colateral
Para a ABVE (Associação Brasileira de Veículos Elétricos), a medida é precipitada, pois ainda não há mercado no país para viabilizar uma produção local.
"O setor gosta muito de previsibilidade. A volta da cobrança do imposto de importação para elétricos deve vir de forma gradual, junto com uma política industrial que permita aumentar o volume de venda, bem como a infraestrutura de recarga e o desenvolvimento de fornecedores locais. Aí, sim, seria viabilizada a produção local", opina o presidente da instituição, Adalberto Maluf.
Segundo Maluf, dois de seus associados, GWM e BYD, têm planos de produzir no Brasil.
No entanto, a cobrança repentina do imposto de importação impediria essas montadoras de alcançar o volume mínimo de vendas para abrir a fábrica.
"O imposto pode, inclusive, colocar em risco investimentos que já estão em andamento em função de não haver previsibilidade", argumenta.
O que dizem as importadoras
UOL Carros consultou algumas empresas que poderão ser impactadas pela mudança.
Para Ricardo Bastos, diretor de Relações Institucionais e Governamentais da GWM Brasil, nosso país ainda está testando a tecnologia de carros elétricos e precisa avançar em infraestrutura. Por isso, ainda é cedo para pensar em uma mudança nas regras de importação.
"Colocar em debate uma mudança em regras que reduz o acesso ao carro elétrico dá um sinal muito ruim para as marcas que estão aqui e para quem está estudando o mercado. Não é legal falar em mudança de regra enquanto não se tem a tecnologia dominada no país", opina.
Apesar de não aprovar a medida, a GWM não considera voltar atrás na decisão de vender e produzir carros no Brasil, mas uma eventual mudança poderá impactar a linha de produtos planejada para o nosso mercado.
"Nosso projeto é de longo prazo, o plano não muda. Mas a alteração da regra pode nos afetar no sentido de volume. O volume e a quantidade de modelos foram decididos em função do mercado que vemos hoje", afirma Bastos.
O presidente da JAC Motors, Sérgio Habib, pontua que, em países com renda per capita semelhante à do Brasil, como a Tailândia, o mercado de elétricos, via de regra, representa menos de 1% do total de venda de veículos.
Lá, o governo deu um incentivo de US$ 5 mil para quem comprar modelos a eletricidade e o percentual de carros elétricos assou para 3%. Ainda assim, é pouco expressivo.
"Os carros puramente elétricos representam menos de 0,5% do total de vendas de veículos do país, e vai continuar assim por muito tempo. A Anfavea é essencialmente protecionista, sempre foi. Mas, quando o assunto é carro elétrico, não tem de quem proteger. O volume é muito baixo".
Segundo Habib, a proposta "não faz sentido" porque o Brasil não tem maturidade de mercado para receber nem mesmo uma fábrica de baterias.
"Para ser produtiva, uma fábrica de baterias tem de produzir o suficiente para para 100 mil carros por ano. Não temos mercado para isso e também não podemos nos iludir achando que vamos exportar, porque o transporte de bateria é muito difícil, é um material inflamável que não pode ir de avião ou trem, apenas caminhão ou navio. Outro ponto é que o governo atual tem um compromisso de investir em economia verde. Seria estranho aumentar a alíquota do carro elétrico", argumenta Habib.
Já a BYD afirma que "o segmento de veículos elétricos é muito recente no Brasil e ainda não possui maturidade nem volume suficientes para se consolidar de imediato no mercado. Representa um importante instrumento de modernização da própria indústria automotiva e não podemos dizimá-lo antes que consiga a sua própria sobrevivência".
A Renault, que faz parte da Anfavea, disse que não comentará a declaração do presidente da associação.
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