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Paula Gama

REPORTAGEM

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Nova gasolina: o que muda se o governo autorizar mais etanol na mistura

Mudança traz vantagens para o meio ambiente, mas novo combustível deve render menos no tanque  - Shutterstock
Mudança traz vantagens para o meio ambiente, mas novo combustível deve render menos no tanque Imagem: Shutterstock

Colunista do UOL

10/05/2023 12h00

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Recentemente, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou a criação de um grupo de trabalho técnico para estudar os efeitos do aumento da participação do etanol na gasolina, de 27,5% para 30%, como forma de melhorar a independência energética do país. Segundo o governo, o aumento deve acontecer de maneira gradual. Mas, afinal, como ele impactará o consumidor?

A promessa do governo é abrandar dois problemas de uma vez só: reduzir a importação de gasolina e acelerar a transição energética.

Vamos fazer essa avaliação técnica junto com a indústria automotiva e o setor produtivo de etanol para dar segurança aos consumidores. O aumento do teor de etanol vai contribuir para a segurança energética do nosso país, com a redução das importações de gasolina e para a transição energética, pela redução das emissões de gases do efeito estufa" Alexandre Silveira

No entanto, sempre que se fala na alteração percentual de álcool na gasolina, vêm outras perguntas à cabeça do consumidor: nossos carros estão preparados para essa mistura? O combustível ficará mais barato? A gasolina passará a render menos no tanque?

Para responder aos questionamentos, vamos por partes. Na questão ambiental, não há dúvidas sobre o ganho que o aumento do uso do etanol trará. De acordo com a Copersucar, líder mundial na comercialização de açúcar e etanol, estima-se que o aumento de três pontos percentuais de etanol na gasolina (de 27% para 30%) aumente o consumo do biocombustível em aproximadamente 1,3 bilhões de litros, o que evitaria a emissão de mais de 2,8 milhões de toneladas de CO2 por ano.

O executivo ainda lembra que a redução da poluição em grandes cidades brasileiras nas últimas décadas teve uma grande contribuição do etanol, seja na composição com a gasolina ou no seu uso exclusivo no tanque, principalmente após a criação do carro flex há 20 anos.

"Um bom exemplo vem de São Paulo. Considerando que a cidade é uma das 10 cidades mais populosas do planeta e está entre as 50 com o pior trânsito do mundo, é normal esperar que ela se encontre entre as cidades mais poluídas. Entretanto, a capital paulista não aparece nem entre as 1.500 cidades mais poluídas. A participação do etanol com mais de 40% da matriz de combustíveis de carros leves é um fator importante desta equação positiva para o meio ambiente e para a sociedade", comenta Luís Roberto Pogetti, Presidente do Conselho da Copersucar.

O professor Renato Romio, do Instituto Mauá de Tecnologia, concorda nesse ponto, mas explica que o Grupo de Trabalho precisará estudar o impacto negativo da nova mistura nos veículos que não são flex, já que os bicombustíveis continuarão a funcionar normalmente com o aumento da presença de etanol na gasolina.

"Não há dúvidas do impacto positivo na redução da emissão de CO2, que afeta o aquecimento global. Mas certamente será necessário dedicar um tempo para estudar os veículos que circulam somente a gasolina, como carros mais antigos ou importados. Será preciso entender se o novo percentual pode trazer prejuízos técnicos, como danos às peças e aumento do desgaste, e também o desempenho em relação a emissões de outros poluentes, que poluem localmente a cidade, como NOX, HC e CO", explica o especialista.

Essa questão foi levantada em 2015, quando o percentual de etanol anidro na gasolina passou de 25% para os atuais 27,5%. Na época, para atender aos modelos importados a gasolina, ficou estabelecido que a gasolina premium continuaria com o percentual de 25%.

A solução fez com que a Anfavea - associação das montadoras - recomendasse que esses modelos fossem abastecidos somente com a gasolina premium até que estudos sobre o tema fossem concluídos. No fim das contas, foi verificado que a nova mistura não prejudicava os motores 100% a gasolina.

O carro vai consumir mais?

Sobre consumo, a primeira pergunta que fizemos ao especialista Renato Romio foi se seria necessário atualizar a lista de eficiência do Inmetro. A resposta foi não, mas isso não significa que o desempenho não irá mudar.

"Os testes do Inmetro são feitos com gasolina E22, ou seja, com 22% de etanol. Não significa que estão errados, porque é necessário estabelecer uma regra e aplicar em todos, a lista serve para avaliar qual veículo é mais econômico e acerta nisso", esclarece.

Na prática, porém, é esperado que o consumo aumente na proporção da nova mistura. "Vai aumentar um pouco porque o álcool tem menos energia dentro dele. No entanto, dependendo do preço final do combustível, não necessariamente vai aumentar o gasto. Não sabemos como será a política de preços, mas sabemos que o etanol anidro, usado na mistura, é mais barato que a gasolina, embora mais caro que o etanol hidratado, que é o combustível que encontramos nas bombas", diz Romio.

E o preço?

Para compor o preço da gasolina, muitas questões devem ser analisadas. Uma delas é o custo da produção. Via de regra, é mais barato produzir etanol, mas há exceções. Em 2021, por exemplo, durante a crise hídrica, chegamos a um momento tão crítico que a Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes (Fecombustíveis) sugeriu que o governo reduzisse temporariamente a porcentagem de etanol para 18% - pedido que não foi atendido.

É que enquanto o preço da gasolina é ajustado de acordo com parâmetros internacionais, o valor do etanol - que é um derivado da cana-de-açúcar- depende da disponibilidade da matéria-prima. Ou seja, de safras e entressafras.

"Cabe ao governo monitorar as questões que envolvem oferta e demanda, principalmente nos períodos de entressafra, para proteger o consumidor final que paga pelo produto", disse a Federação à época. A grande justificativa era a baixa oferta de etanol e, principalmente, a elevação do custo do anidro (misturado à gasolina).

Ainda não é possível falar em preços, pois depende da regulamentação do novo combustível. Mas se a história serve como referência, uma das principais críticas à mudança em 2015 foi que continuamos pagando o mesmo valor por um combustível de produção mais barata.

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