Seres para de vender carros no Brasil; outras chinesas podem fazer o mesmo?
A fabricante chinesa Seres, que chegou ao Brasil no fim de julho do ano passado, já paralisou suas operações, acendendo um sinal de alerta sobre montadoras asiáticas que pretendem operar no país. A marca, em parceria com a gigante da tecnologia Huawei, está passando por uma reestruturação interna por tempo indeterminado. A informação foi publicada pelo Autoesporte e confirmada pelo UOL Carros.
Em 2024, apenas oito unidades foram emplacadas, sendo cinco do modelo Seres 3 e três do Seres 5, segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). A situação acende um alerta porque a vida das montadoras chinesas que importam carros para o nosso país não está fácil. A disputa sobre os impostos de importação para carros elétricos, especialmente aqueles provenientes da China, tem se intensificado.
Durante uma coletiva da Anfavea na última quinta-feira (5), a situação chegou ao ponto de ameaça explícita. "Se o Brasil não rever isto imediatamente, nós corremos o risco de ter a produção impactada, inclusive com o fechamento de fábricas já no segundo semestre", alertou Marcio de Lima Leite, presidente da Anfavea, a associação das montadoras.
Até o ano passado, carros híbridos e elétricos eram isentos de imposto de importação. Este tributo é uma tarifa cobrada pelo governo sobre produtos importados, com o objetivo de proteger a indústria nacional da concorrência estrangeira. Após pressão de quem tem fábrica por aqui, o governo traçou um plano de retorno gradual do imposto até 2026, chegando aos 35%.
Ciro Possobom, CEO da Volkswagen no Brasil, se manifestou na coletiva de imprensa da Anfavea pedindo a reinstauração imediata dessa tarifa. "O que a gente pede claramente é voltar isso [imposto para eletrificados importados] para 35% e estimular a indústria local. Eu acho que isso é interesse para todos os brasileiros", destacou.
Ricardo Bacellar, consultor automotivo, destaca que a chave para o sucesso das montadoras chinesas no Brasil está na estratégia adotada. "Quando a empresa não se compromete, é fácil fechar as portas e sair. Quem não está caminhando na direção de produzir, vai ficar completamente descoberto," afirmou. Bacellar ressalta que duas montadoras chinesas, BYD e GWM, estão trabalhando para produzir no Brasil, eliminando o risco de serem barradas pelas novas tarifas.
Para Bacellar, o modelo de negócios das montadoras chinesas deve ir além da simples importação e venda de veículos. "É importante criar fábricas, trazer tecnologia, criar cadeia de fornecedores, criar empregos. Isso blinda da dependência de taxa de importação," explicou. Ele acredita que, se a estratégia for fincar raízes no Brasil, os novos impostos podem atrapalhar, mas não serão uma barreira intransponível.
Desde que a BYD e a GWM se estabeleceram no país, com planos de construir fábricas e bons resultados de vendas, diversas outras montadoras chinesas também anunciaram intenções com o mercado brasileiro. Entre elas estão Neta, Zeerk, MG, Foton e Omoda Jaecoo. O sucesso dessas pioneiras serve de inspiração para as novas entrantes, mas tudo vai depender da estratégia adotada.
"Brincando de mercado brasileiro"
Milad Kalume, consultor automotivo, afirma que uma razão para o interesse das marcas chinesas é o sucesso já observado das marcas BYD e GWM no Brasil.
"Essas novas chinesas estão surfando no sucesso da BYD e da GWM. Vamos aguardar para entender se realmente vão ter uma estrutura digna de mercado brasileiro, porque só começar a vender aqui e brincar de mercado brasileiro não é bom nem para elas e nem para o Brasil", explica Kalume.
Ele ressalta a importância de uma infraestrutura robusta para o sucesso no mercado brasileiro. "Diversas vieram, saíram, sem deixar assistência técnica para o brasileiro. Testaram o mercado, prometeram e saíram. Disso o país não precisa mais. Precisa ter uma estrutura, investimento em concessionárias, em peças de reposição, um respeito com o consumidor brasileiro."
Kalume também comenta sobre as barreiras tributárias de entrada de veículos chineses nos mercados dos Estados Unidos e México. "Nenhuma montadora gostaria de vir para o Brasil sem antes ir para os EUA, mas elas esbarram em diversas restrições, como a tributação em 100% dos eletrificados chineses. Por que não vão para o México? Porque é muito influenciado pelos EUA. O outro mercado relevante é o Brasil, com potencial de crescimento para 3 milhões a 3,5 milhões de veículos por ano."
A paralisação das operações da Seres no Brasil pode ser um indicativo dos desafios que as montadoras chinesas enfrentam ao tentar se estabelecer no país. No entanto, com uma estratégia bem definida, investimentos em infraestrutura e compromisso com o mercado local, essas empresas têm potencial para superar as barreiras e conquistar uma fatia significativa do mercado automotivo brasileiro.
As experiências da BYD e da GWM mostram que é possível ter sucesso, desde que haja um planejamento robusto e uma execução eficaz.
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