O que muda e quem se beneficia com isenção do IPVA para híbridos flex em SP
A isenção do IPVA para veículos híbridos flex e movidos a hidrogênio no estado de São Paulo, proposta pelo governador Tarcísio de Freitas e aprovada na Assembleia Legislativa, deveria marcar uma nova fase de incentivo à indústria de mobilidade limpa. Mas, com a retirada de híbridos a gasolina e elétricos do benefício, acabou sendo um movimento de fortalecimento da cadeia do etanol.
A medida evidencia um paradoxo: embora tenha sido criada para impulsionar a indústria paulista, no curto prazo, ela beneficia principalmente montadoras com fábricas fora do estado.
Na prática, quem comprar um carro de R$ 250 mil enquadrado no benefício não precisará pagar R$ 10 mil anuais de IPVA em 2025 e 2026. Depois disso, o imposto será retornado gradualmente, passando para 1% em 2027 e chegando à alíquota total de 4% em 2030.
Além de favorecer a classe média alta, público-alvo dos veículos híbridos flex, a isenção tem foco em agradar os produtores locais de etanol e pode incentivar outros estados com mesma vocação, como Goiás e Pernambuco, a adotarem políticas semelhantes em resposta.
Quem realmente se beneficia?
Segundo o texto aprovado, os beneficiados são os proprietários de veículos:
- Híbridos com motor elétrico e combustão, abastecidos com etanol;
- Movidos exclusivamente a hidrogênio.
O valor dos carros contemplados não pode ultrapassar R$ 250 mil, faixa de preço que atende, sobretudo, a classe média alta. Entre os modelos híbridos flex que se encaixam no benefício estão:
- Toyota Corolla e Corolla Cross Hybrid - os únicos híbridos flex atualmente produzidos no estado, na fábrica de Sorocaba (SP).
- Fiat Pulse e Fastback Hybrid - fabricados pela Stellantis em Betim (MG).
- Caoa Chery Tiggo 5x Pro Hybrid e Tiggo 7 Pro Hybrid - produzidos em Anápolis (GO).
O especialista em mercado de consumo automotivo Roberto James chama a atenção para essa contradição. "Essa isenção foi feita para beneficiar a indústria paulista, mas, neste momento, apenas a Toyota tem produção local. Mesmo assim, o governo fez um cálculo pragmático: vai perder com o IPVA, mas ganha ao impulsionar o consumo e a produção de etanol, que é estratégico para São Paulo."
Além da Toyota, a GWM, que atualmente só comercializa elétricos e híbridos a gasolina, começará a produzir no estado em 2025. A montadora também deve se beneficiar no futuro, pois é esperado que seus novos modelos já sejam equipados com a tecnologia flex - ainda mais depois da medida.
Outras montadoras com fábricas paulistas, como Volkswagen e Chevrolet, que prometeram lançar modelos híbridos flex, ainda não têm produtos prontos para competir nesse mercado.
Rodízio: efeito colateral
Um dos efeitos colaterais mais evidentes da isenção é o impacto no rodízio municipal de veículos em São Paulo. Atualmente, híbridos e elétricos estão isentos do rodízio por emitirem menos poluentes, o que está alinhado com o objetivo ambiental da restrição.
Contudo, com a chegada de veículos híbridos-leves, mais acessíveis, e o aumento da frota desses veículos com a isenção do IPVA, o trânsito nos horários de pico pode piorar significativamente.
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Quero receberO rodízio, que restringe a circulação no Centro Expandido de São Paulo de segunda a sexta-feira, das 7h às 10h e das 17h às 20h, foi criado para reduzir os congestionamentos e a poluição do ar. Desrespeitar a regra resulta em multa de R$ 130,16 e a adição de quatro pontos na CNH.
No entanto, o aumento da quantidade de carros híbridos, que já têm isenção, coloca em xeque um dos principais trunfos do rodízio: reduzir o número de veículos circulando nos horários de maior movimento. "À medida que os híbridos se popularizam, a eficácia do rodízio fica comprometida. Hoje, o impacto ainda é pequeno, mas se as vendas dispararem, precisaremos discutir uma revisão das regras", alerta Roberto James.
O assunto já está em debate. Tramita na Câmara Municipal de São Paulo o Projeto de Lei 836/2024, que propõe a exclusão dos carros híbridos da isenção do rodízio e do desconto do IPVA. A proposta reflete uma preocupação crescente com o impacto dessas políticas na mobilidade urbana.
Contraponto à reforma tributária?
A decisão de São Paulo chegou a ser vista como uma resposta aos incentivos fiscais mantidos no Nordeste durante a reforma tributária, que favorecem principalmente Stellantis, BYD e Caoa. No entanto, na prática, apenas uma montadora do estado está sendo beneficiada no momento.
Por outro lado, o setor do agronegócio paulista pode ser mais impactado positivamente. Estados como Goiás, Minas Gerais e Pernambuco, grandes produtores de etanol, devem se sentir pressionados a adotar políticas semelhantes.
Segundo os cálculos do governo, a estimativa é que o estado deixe de arrecadar cerca de R$ 300 milhões com a medida no primeiro ano e, no segundo, por volta de R$ 450 milhões, valores considerados pequenos diante do orçamento estadual de R$ 370 bilhões.
Roberto James acredita que a medida terá retorno econômico no médio prazo, movimentando a cadeia do etanol e impulsionando o mercado de veículos híbridos. "O IPVA vai deixar de ser cobrado, mas o governo ganha com o ICMS das vendas e com o impacto na indústria. Além disso, fortalece o setor de etanol, que é uma vocação paulista e gera empregos no campo e na cidade."
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