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BYD Shark: preço salgado gera polêmica, mas é realmente caro demais?

A BYD Shark é cara? O preço de R$ 379.800 para a única versão, anunciado em 19 de outubro em um grande evento em Goiânia, assustou. A própria rede esperava que a picape viesse por R$ 300 mil ou, no máximo, R$ 330 mil. A repercussão nas redes sociais foi instantânea e o assunto ainda está em alta.

Até o fechamento desta reportagem, havia quase 550 comentários nos conteúdos sobre o preço da BYD Shark em minhas plataformas digitais (YouTube, Instagram e TikTok). Do total, menos de dez defenderam a tabela da picape, que foi considerada cara.

A razão para isso é o preços das versões topo de linha das picapes médias consagradas no segmento. A Hilux SRX Plus sai por R$ 333.290. A Ranger Limited Pack, a R$ 351.990. Já a S10 High Country é tabelada em R$ 311.990. A Shark chega mais cara que todas elas.

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Imagem: Rafaela Borges/UOL

Mas há razões para a BYD cobrar todo esse valor pela Shark? Na verdade, há sim. Como produto, e pelo pacote tecnológico que oferece, a novata é superior às concorrentes. O problema é que esse segmento tem consumidores muito conservadores. Para piorar, a BYD escolheu como alvo o agronegócio. Algo que, em minha opinião, foi um erro de estratégia.

Por que vale o que custa

A BYD Shark vale o que custa porque, para começo de conversa, é a primeira picape híbrida plug-in do Brasil. Essa tecnologia garante redução de consumo, de emissões de poluentes e, de acordo com informações da fabricante, autonomia até 840 km (ponto muito valorizado pelos clientes do segmento).

Mas não é só isso: 10 centímetros mais comprida que a média da categoria, é também espaçosa para quem viaja atrás, coisa que outras picapes médias feitas sobre chassi não são. Aliás, com assoalho plano, acomoda bem três passageiros na segunda fileira.

O acabamento também é superior à média do segmento, com materiais suaves ao toque e emborrachados em portas e painéis. Quanto às tecnologias, tem ACC, sistema de manutenção em faixas, tela multimídia giratória e câmeras 360 multivisão. Coisas que a Ranger Limited Pack também tem, certo?

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Imagem: Rafaela Borges/UOL

Correto! Mas o modelo da Ford não tem os 435 cv de potência entregues pela Shark, que acelera de 0 a 100 km/h em 5,7 segundos - e será a picape mais rápida do Brasil até o início de novembro, quando a RAM lançará a nova 1500, que cumpre a mesma missão em 5,3 s. A Ranger até tem uma versão mais potente e rápida, a Raptor.

O modelo de 397 cv, a gasolina, acelera de 0 a 100 km/h em 5,8 segundos, praticamente um empate com a Shark. O problema é que custa quase R$ 100 mil a mais. A Ranger Raptor tem tabela de R$ 475 mil.

O lançamento da Shark, em 19 de outubro, foi no Autódromo Ayrton Senna, em Goiânia, considerada a capital do agronegócio do Brasil. A ação foi totalmente focada no público do agro. E este, na minha opinião, foi um erro da BYD, que deveria voltar suas atenções a um outro tipo de consumidor.

Como é a picape do agronegócio

A Ranger Raptor não é focada no público do agronegócio, e sim em aventureiros. Afinal de contas, mesmo tendo toda a tradição da Ranger - que não é pouca coisa, como você poderá conferir adiante -, é um modelo a gasolina. Claro que essa não é a única razão, mas é uma delas.

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Porque o público do agronegócio faz questão de picape a diesel. Outros pontos importantes valorizados por esse consumidor são sistema de tração 4x4 temporário (com reduzida), suspensão traseira por eixo rígido e boa capacidade de carga. São características relacionadas à valentia.

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Imagem: Rafaela Borges/UOL

E quem atua no agronegócio quer valentia, mesmo que não use a picape no trabalho pesado. Isso é algo não raro de ocorrer, no caso de versões topo de linha. Os donos de propriedades rurais compram esses modelos e até vão com eles à fazenda, mas dificilmente os colocam à prova em funções muito exigentes.

Ainda assim querem a garantia de que, se precisarem, terão robustez à disposição. E este não é o caso da BYD Shark. O modelo tem tração 4x4 por demanda, suspensão traseira independente e capacidade de carga de 790 quilos (embora esse aspecto seja controverso pois, com 65 kgfm de torque, a picape é sim capaz de levar mais). Além disso, o motor a combustão do sistema, 1.5 turbo, é a gasolina.

Há um outro problema

Mas não é só isso. O consumidor do agronegócio é conservador, e costuma ter alto índice de fidelização à marca. Talvez aqueles que compram as versões topo de linha, presumidamente pessoas com maior poder aquisitivo, tenham mais coragem de ousar.

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Mas ousadia tem limites, pois quem atua no agro quer robustez e, mais do que tudo, confiabilidade. Não é à toa que a Hilux lidera o segmento com tranquilidade: a fama da Toyota de baixos índices de problemas e manutenção fácil abrange todos os segmentos.

A S10 é segunda colocada no quesito fidelização, com muito consumidores que são proprietários desse modelo há anos. O capítulo ousadia é protagonizado, atualmente, pela Ranger, picape que sempre atraiu muitos clientes do agro, mas sem fidelidade - a história do modelo da Ford no Brasil é de altos e baixos.

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Imagem: Rafaela Borges/UOL

A nova geração é tão superior à concorrência que venceu a resistência de clientes do agro, especialmente nas versões topo de linha. Muitos decidiram trocar Hilux SRX e S10 High Country pela Ranger Limited Pack. E isso é o máximo de ousadia que podemos esperar no conservador consumidor do universo rural.

A Ranger é a diesel, com suspensão traseira por eixo de torção e sistema 4x4 temporário com reduzida. Além disso, a tradição em picapes da Ford não apenas no Brasil, mas no mundo, se confunde com a própria história da marca.

Assim, uma coisa é "ousar" com a nova Ranger. Outra é trocar um produto conhecido e consagrado por um modelo híbrido a gasolina com tração 4x4 por demanda. Ainda por cima, de uma marca que, embora esteja fazendo muito barulho no Brasil, é nova e sem tradição. A BYD só começou a vender carros de passeio (e agora picapes) no País em 2022.

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Mas a BYD teria sim uma chance no agro se a Shark custasse menos que a concorrência, o que acabou não ocorrendo. Custando mais? Missão complicada. Difícil imaginar o público do agronegócio investindo esse valor extra em algo absolutamente desconhecido.

Agro sem batente

Nem só de picapes robustas vivem os empresários do agronegócio. Afinal, trata-se de um consumidor com alto poder aquisitivo, que é também tradicional cliente de marcas premium (BMW, Mercedes-Benz, Audi, Volvo, Porsche e Land Rover, entre outras). E talvez a BYD tenha escolhido esse público de olho no dinheiro do agro. Afinal, não é qualquer um que vai pagar quase R$ 400 mil em uma picape.

Modelos como RAM 1500, Ford F-150 e Chevrolet Silverado, muito valorizados no mundo rural, até podem ser usados no trabalho. Mas, custando mais de R$ 500 mil no Brasil, não são. O empresário do agro adquire esses picapes por desejo, e por imagem.

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Imagem: Rafaela Borges/UOL

A JLR (Jaguar Land Rover) vem trabalhando bastante a imagem do Defender no mundo rural. É um modelo robusto, que sabe lidar com a terra e desafios, mas também com conforto e luxo para o dia a dia e as viagens entre uma fazenda e outra, por estradas nem sempre em boas condições, que são comuns nesse meio.

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E é este o nicho do agro em que a Shark, com seus 840 km de autonomia declarada pela marca, poderia investir. O problema é que BYD ainda não desperta o mesmo desejo das picapes grandes ou de um Defender no consumidor. E sua nova caminhonete também não assegura o status desses modelos.

O público certo

A chinesa, que afinal de contas ainda é uma novata no Brasil, está começando a conhecer o consumidor do agro. No entanto, em dois anos, já conseguiu conquistar muitos fãs em um outro ambiente: o urbano. Principalmente nas grandes cidades.

Quem vive em Goiás, Mato Grosso, Bahia, Minas Gerais e até no interior de São Paulo não vai valorizar um veículo capaz de rodar apenas no modo elétrico por até 57 km. Afinal, muitas cidades são pequenas, e as curtas distâncias percorridas não são tão relevantes a ponto de despertar grande interesse em uma experiência eletrificada.

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Imagem: Rafaela Borges/UOL

Na hora de pegar estrada, 57 km no modo elétrico fazem pouca diferença, e a rede de recarga no interior do Brasil é ainda mais embrionária que em Estados como São Paulo e Rio de Janeiro. Já em grandes centros urbanos, ter experiência elétrica é um desejo de cada vez mais consumidores, por economia, consciência ambiental ou simplesmente pelo desejo de experimentar o novo.

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E o mais legal do híbrido plug-in é oferecer uma experiência 100% elétrica na cidade sem depender de rede de recarga na estrada. Por isso, em meu ponto de vista, o verdadeiro cliente da Shark é urbano. Mais precisamente, quem vive em cidades grandes.

Uma picape na cidade? Existem inúmeros picapeiros urbanos. Tanto que a Ford acaba de lançar a Ranger Black, que é 4x2, focada justamente nesse público. São pessoas aventureiras, ou que querem passar uma imagem de aventura. Ou ainda aquelas com casas de fim de semana no interior ou na praia, que levam na caçamba suas motos, jet-skis, bikes...

Focada no público da cidade, a Shark tem grandes chances de conquistar alguns clientes de Hilux, Ranger e S10. Esse consumidor sabe vai valorizar o que um híbrido plug-in conectado e semiautônomo oferece, e talvez esteja disposto até mesmo a pagar mais por isso.

Principalmente em São Paulo, local em que carros híbridos estão isentos de rodízio, entre outros benefícios. Assim, em minha opinião, a BYD deveria focar seus esforços no cliente que vai valorizar os atributos que a Shark oferece. Esse consumidor não é o do agronegócio.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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