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Criador da Honda Biz agora customiza motos de R$ 200 mil na Europa

Luiz Mingione no projeto da Honda Biz, em 1995 - Arquivo pessoal
Luiz Mingione no projeto da Honda Biz, em 1995
Imagem: Arquivo pessoal

Aldo Tizzani

Colaboração para o UOL, em São Paulo (SP)

18/06/2019 07h00

Resumo da notícia

  • Luiz Mingione ajudou a criar Honda Biz
  • Projeto concebido no Brasil foi reconhecido até no Japão
  • Hoje, é conhecido pelo apelido "Careca" e por customizações de luxo

Aos 60 anos, Luiz Eduardo Fonseca Mingione carrega um currículo com experiências vitoriosas. Customizador de motos na Europa, venceu também o Rali Dakar, em 2002 (na categoria "Super Production", até 250 cc). No esporte, ficou conhecido como Luiz Careca, mas antes veio o principal ponto de sua carreira: ter criado a Honda Biz, em 1997. Agora é o momento de relembrar essa história.

Diferentemente da antecessora Honda Dream, a Biz trouxe roda traseira de 14 polegadas e espaço sob o assento para guardar pequenos objetos e até um capacete. Revolucionário, o produto da Honda do Brasil foi apresentado no final de 1997, já como modelo 1998. Com mais de 20 anos de história, a CUB é a quarta moto mais vendida do país.

Biz: como nasceu o protótipo

Em 1993, Luiz Mingione chegou à HRB (Honda Research Brasil), com experiência curiosa: fazia gabinetes de caixa eletrônico para a Itautec e praticava motociclismo off-road. Mas essas qualidades seriam fundamentais para o nascimento da Honda Biz.

Naquela época, o pequeno HRB, que contava com um time de 10 pessoas, enviava para o Japão informações relativas ao mercado brasileiro — tendências de cores e grafismos das motos vendidas no país. Mas a partir de 1994, a história mudaria.

Com o apoio do gerente Seizo Yano, começaram a desenvolver uma moto com as características adequadas ao piso e ao biótipo do brasileiro. Entre 1994 e 1995, o departamento de desenvolvimento enviou vários relatórios sobre o "novo" modelo ao Japão.

A partir daí Mingione cruzou o país para realizar uma completa pesquisa de campo. O conceito de utilizar roda traseira menor veio dos modelos off-road, que usam aros de 21 polegadas na dianteira e 18 polegadas na traseira. O Brasil não tinha as mínimas condições de asfalto para receber os scooters da marca, com rodas aro 10. Ter roda maior era prioridade, mas sem perder a praticidade dos scooters. O outro lado da moeda foi a Dream, CUB de linhas já cansadas para a época.

"Cortei uma Dream ao meio, mas só usei a parte do canote. Usei o porta-capacete que fica sob o assento de um scooter e a roda de 14 polegadas de uma Mini Enduro 50. Comprei canos de ferro de uma e meia polegada em uma casa de material de construção e comecei a juntar as partes. Modelei a frente com clay e acoplei o pequeno motor da Dream, de 100 cc. Trabalhei mais de 12 horas por dia, mesmo sabendo que não poderia dar em nada", relembrou.

A matriz questionava o material de pesquisa. O chefão da HRB na época, Shigeaki Hayashi, comunicou a Mingione: "Precisamos fazer um protótipo para mostrar o conceito para o Japão e você é o único com expertise para fazer este trabalho".

Luiz Mingione Honda Biz - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Experiência prévia veio da fabricação de caixas eletrônicos
Imagem: Arquivo pessoal

Momento decisivo

Nesse meio tempo, em 1995, aconteceu um fato que levaria a epopeia brasileira ao sucesso. Um gerente de estratégia global de produto da Honda Japão visitaria a subsidiária brasileira e o HRB, em São Paulo (SP). No dia e na hora marcada, o representante da matriz foi recebido por Mingione e seus chefes, Shigeaki Hayashi e Seizo Yano.

Em uma grande sala com as paredes bem pintadas, ao fundo, um objeto coberto com um pano branco. Foi o próprio Mingione quem descortinou o protótipo. Mas tomou bronca do executivo japonês por gastar dinheiro em um projeto que não estava autorizado. Tudo arruinado?

Após o susto, o executivo mudou o discurso e fez questão de dar os parabéns à equipe brasileira: "Quero este produto logo no mercado, já que não existe nada similar no exterior. Esta moto tem grande potencial para o consumidor brasileiro". Foi o sinal verde para Biz.

Reconhecimento

Após o lançamento da Biz 100, Luiz Mingione foi ao Japão fazer curso de modelagem, entre 1998 e 1999. Foi o primeiro ano em que a matriz abriu suas portas a estrangeiros. Na turma do brasileiro mais um francês e um tailandês. Até então, os japoneses viajavam às subsidiárias para transferir conhecimento.

No Japão, uma honraria: Mingione, Shigeaki Hayashi e Seizo Yano foram reconhecidos pelo então presidente mundial da Honda, Takeo Fukui, com placa de reconhecimento pelo projeto da Biz 100.

"Poucos profissionais na Honda global receberam tal honraria. Me sinto privilegiado por fazer parte deste time que não recuou um centímetro para criar um produto tão revolucionário", afirmou Mingione.

Em 22 anos, a Biz ganhou motor com injeção eletrônica de combustível, depois motorização flex e vários tipos de roupagem, sem deixar de ser prática, robusta, fácil de pilotar e econômica.

"A Biz foi o primeiro produto com tempero brasileiro. Depois vieram a Tornado 250, a Falcon 400, a CG Titan, a CG Cargo e a NXR 125 e 150 Bros", relembrou Mingione.

Luiz Mingione customização - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Agora atendendo por Luiz Careca, faz projetos como este de R$ 110 mil sobre moto de R$ 200 mil
Imagem: Arquivo pessoal

Da popular ao luxo das customizadas

Depois do sucesso industrial e esportivo, Mingione deixou a marca líder do segmento de duas rodas e ganhou o mundo. Nômade, trabalhou na China, trouxe motos asiáticas para o Brasil (pela Iros) e, recentemente, atuou na Turquia para a Ford. Atualmente, o paulistano vive na Itália para ficar mais próximo da família da esposa Isabel — filha de japoneses e que tinha restaurante em Milão — e oferecer uma educação de melhor qualidade para o filho Enzo, de 13 anos.

Com conhecimento técnico de sobra, Mingione ganhou nova oportunidade, agora na Given Motodesign Italy, estúdio que customiza motos na "capital mundial da moda". Lá, ficou de lado o lado mais engenheiro de Luiz Mingione. Ganhou espaço a faceta de "Luiz Careca", campeão de criatividade e que transforma sonhos em peças funcionais.

Para quem ajudou a conceber um modelo popular, com preços entre R$ 4 mil e R$ 9 mil, agora é o momento de deixar modelos exclusivíssimos, como a DUU CR&S, ainda mais únicos. Com apenas 150 unidades feitas, a Duu foi lançada em 2009 por 47.628 euros — equivalente a R$ 200 mil. Com motor V2 a 56° de 1916 cm³ de capacidade, 100 cv, e câmbio de seis marchas, a Duu CR&S chega aos 200 km/h.

Luiz Careca ajudou a redesenhar partes traseira, frontal e lateral em CAD. Após o projeto de quase um ano, as peças foram feitas artesanalmente em alumínio, fibra de vidro e ABS, entre outros materiais. Pintura e acabamento finalizaram o pedido feito pelo cliente.

A customização feita na Given Motodesign consumiu 25 mil euros extras — outros R$ 110 mil.

"Já trabalhei com designers da Honda, no Brasil e no Japão. Chineses da United Motorcycle e Zongshen, na China. Com designers turcos na Ford, em Istambul. Agora na Given Motodesign, na Itália. É um grande prazer e aprendizado trabalhar com alguém com a experiencia de Donato Cannatello [responsável pela Given]. Ele é experiente, criativo e rápido em buscar soluções para o desenvolvimento e fabricação de peças especiais, diferente de todos os outros com quem já trabalhei na vida. E em nossas reuniões de final do dia sobre o projeto sempre rola uma cerveja para descontrair".