Basta uma pesquisa rápida na internet para ver que o mito do carro movido a água continua firme e forte. Poderia ser uma solução mágica, se fosse possível. Há vários combustíveis alternativos sendo pesquisados pelo mundo, da gasolina sintética ao hidrogênio. Porém, a água é apontada pelos especialistas consultados pelo UOL Carros como ineficaz. "É uma lenda urbana, a água não gera energia e é impossível de ser queimada dentro do cilindro, pois você precisa de uma explosão para mover os pistões e outros componentes", adianta Marcus Vinícius Aguiar, vice-presidente da AEA (Associação Brasileira de Engenharia Automotiva). Seria maravilhoso poder abastecer o seu carro com água da torneira e, com isso, economizar milhares de reais ao longo do ciclo de vida do seu veículo. Seria, uma vez que o processo é encarado como impossível de ser realizado. "Eu gostaria muito de responder que é possível um carro movido a água, mas não temos uma tecnologia capaz de fazer um modelo se mover com água pura. O mais parecido é o eletrólito, que é água com sais, mas os elétrons estão dissolvidos na água, que não é pura", explica Silvio Shizuo Sumioshi, docente do departamento de Engenharia Mecânica da FEI. A própria FEI tem um projeto que pode atiçar a curiosidade dos interessados em algo parecido. O estudo está em fase de pesquisas e propõe colocar um tanque extra de água no carro, mas não da maneira que as pessoas falam na internet. O projeto prevê aumentar a eficiência energética dos motores flex (podem também ser a gasolina) por meio de enriquecimento do hidrogênio obtido por reforma catalítica embarcada, mas por uma mistura de etanol e hidrogênio, o que permite obter maior rendimento e menor emissão de poluentes. O aumento da eficiência e consumo em um motor recalibrado pode ficar entre 10 e 30%. É o sonho se realizando? Não, mas é o que chega mais perto. Além do oxigênio, a água é composta por hidrogênio, que é um ótimo combustível. Contudo, separar o oxigênio do hidrogênio não é tão simples, é necessária uma energia elétrica ou catalisador. A maior parte do hidrogênio é produzida por catálise, de acordo com Silvio. "Podemos usar energia elétrica do alternador, mas vamos usar o calor de escape para alimentar o catalisador, o responsável para fazer uma reação intermediária e extrair o hidrogênio da água. Ela tem que ser misturada ao etanol para conseguirmos esse processo, mas adianto que a maioria do líquido usado será água. É usado um tanque extra para esse processo", explica Silvio. O processo precisa da mistura de água com algum hidrocarboneto. É no catalisador que aquele oxigênio vai se combinar com o hidrocarboneto para liberar o hidrogênio puro que fará a função de aditivo. É uma quantidade pequena, cerca de 3 a 5% do volume. Hidrogênio é explosivo, então a FEI preferiu evitar usar um reservatório desse elemento. "Por enquanto, esse segundo catalisador tem um custo elevado. Temos que pesquisar materiais que façam a mesma coisa e sejam mais baratos. Estamos usando materiais nobres, o que faz com que esse catalisador tenha um preço de um catalisador normal. Na verdade, ele seria menor do que o componente que já vem nos carros normais. Não estamos preocupados com custos nessa fase, queremos o ideal do ideal. Mas, na fase de produto, vamos colocar os pés no chão e buscar alternativas mais econômicas", conta Silvio. O professor diz que mesmo uma pequena quantidade de hidrogênio já serve como um ótimo aditivo, pois ele tem uma quantidade muito grande de energia (quatro vezes mais que o etanol e duas vezes mais do que a gasolina). Ele permite obter uma pressão mais alta do motor e o gás consegue empurrar o pistão com mais força. Nada de perda de potência, algo que aflige outros métodos, pois o projeto usa o calor do escape, sem gerar energia por meio do alternador. Vale lembrar que a água costuma ser usada por dragsters e até por carros da BMW para reduzir a temperatura do motor e fazer com que componentes trabalhem melhor para extrair cada gota de desempenho. Porém, é algo bem diferente do que o simples ato de abastecer com a água, que é injetada no coletor de ar, não vai direto para o motor e permite resfriar a mistura de ar e combustível, ampliando consideravelmente o desempenho. Ambas tecnologias são bem diferentes daqueles kits vendidos na internet, que prometem gerar hidrogênio e ajudar a reduzir o consumo em até 80%. No caso dessas geringonças, não caia nessa. Acreditar em mitos é o primeiro passo em falso na espera por milagres. MAIS SOBRE CARROS E AUTOMOBILISMO: NEWSLETTER DE FLAVIO GOMES Todo domingo, Flavio Gomes escreve sobre a F1 e outras competições do automobilismo e relata bastidores de sua longa carreira como jornalista. Para se cadastrar e receber a newsletter semanal, clique aqui. PUBLICIDADE | | |