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Um Nissan que bebe álcool, Livina 1.6 chega para tentar incomodar o Honda Fit

Claudio de Souza

Do UOL, em Curitiba (PR)

18/03/2009 18h11

A Nissan apresentou nesta semana o Livina, primeiro carro de passeio da marca fabricado no Brasil. Mais importante, também é o pioneiro da Nissan no uso de motores flexíveis. É com o Livina que a montadora japonesa começa a contornar sua dependência de gasolina, calcanhar-de-aquiles de modelos como o sedã Sentra e o hatch Tiida (importados do México).

O Livina traz duas opções de propulsor bicombustível: um 1.6 de 16 válvulas, com potência de 104/108 cavalos (gasolina/álcool) e torque de 14,9/15,3 kgfm (g/a), desenvolvido no Brasil; e o 1.8 16V, gerador de 125/126 cv (g/a) e 17,5 kgfm (g/a). Este motor é uma adaptação dos blocos 1.8 já usados na gama da Nissan importada para venda no país, e vem sempre gerenciado por transmissão automática de quatro marchas. Já o bloco 1.6 é associado sempre a um câmbio manual de cinco velocidades.

ÁLBUM DE FOTOS
Divulgação
MAIS IMAGENS DO LIVINA

Fabricado na unidade da Nissan de São José dos Pinhais (PR), o Livina é um carro que já existe em mercados emergentes e da periferia do capitalismo, como China, Indonésia, Filipinas e África do Sul. De acordo com a marca, cerca de 100 mil unidades do monovolume circulam nesses países. Entre nós, a expectativa é de vender 800 carros por mês, fechando 2009 com 7.200 unidades emplacadas (contando a partir de abril). Esse número, se atingido, fará do Livina o modelo mais vendido da Nissan no país.

No mercado brasileiro, o Livina chega como um óbvio concorrente do renovado Fit, até pela semelhança com a geração anterior do aclamado carro da Honda. Como ele, o Livina é difícil de definir. É um monovolume (grosso modo, todas as partes ficam sob o teto), e certamente também é correto chamá-lo de minivan. Seu público-alvo inclui, portanto, famílias pequenas.

Mas, assim como o Fit, que sempre teve atrativos e características de vários segmentos, o Livina parece ter potencial para conquistar eventuais compradores de hatches médios -- no caso, o target são consumidores um pouco mais jovens. Outros concorrentes são as minivans Fiat Idea e Chevrolet Meriva.

OS PREÇOS
Um dos argumentos de venda do Livina é o preço da versão de entrada, denominada apenas Livina 1.6, que parte de R$ 46.690. Por esse valor não é possível levar para casa o Fit 1.4, nem versões mais baratas dos hatches médios.

Por R$ 51.490 surge o Livina 1.6 SL, que oferece muito mais itens de série: sistema keyless, relógio no rádio, travamento automático das portas, faróis de neblina, grade frontal cromada, rodas de liga-leve aro 15, airbag frontal duplo, freios com ABS (antitravamento), EBD (distribuição eletrônica) e assistente de frenagem etc.
 

  • Veja a lista completa de equipamentos

    Boa parte desses itens não está na versão de entrada, ou está "mais ou menos". O airbag da 1.6, por exemplo, é apenas para o motorista; não há ABS, e as rodas são de aço, de aro 14, guarnecidas por calotas. A diferença de R$ 4.800 entre as versões básica e SL se justifica plenamente -- cabe decidir se isso é mérito da mais cara ou demérito da mais barata.

    Fotos: divulgação

    Visto de lado, o Livina nem procura disfarçar sua 'afinidade' com o Fit

    Já as versões 1.8 e 1.8 SL têm o mesmo conteúdo das homólogas de propulsor menor, diferenciando-se delas pela transmissão automática. Seus preços: R$ 50.560 e R$ 56.690. Vale lembrar que todos os valores citados consideram o IPI reduzido. Repetindo estratégia usada com outros modelos, a Nissan tem um convênio para oferecer valores reduzidos no primeiro ano de seguro, a depender do perfil do proprietário e da praça em que roda.

    POR FORA, POR DENTRO
    O design do Livina é curioso. Sua grade frontal parece herdada do crossover de luxo Nissan Murano, como lembrou um executivo da marca, mas o conjunto dela com os faróis acaba lembrando mesmo é o Renault Clio (a montadora francesa é do mesmo grupo). Visto de lado, o Livina corre o risco de ser confundido (pelos mais distraídos) com o Fit descontinuado pela Honda no final do ano passado. A grande porção de carroceria que sobra após a última janela, antes da coluna C, pode desagradar a alguns, mas o formato do vidro a suaviza.

    Já a traseira apresenta traços característicos da Nissan, como vincos que inicialmente parecem desnecessários estilisticamente (no caso, formando um meio-arco sob a janela), mas que depois acabam agradando ao olhar. Do vidro da tampa do porta-malas para baixo, o Livina tem aspecto de hatch. Tudo isso pode soar como a descrição de um monstrengo -- mas o conjunto funciona bem. Ponto negativo apenas para dois calombos no teto, que acomodam as dobradiças da tampa traseira. Coisas de terceiro-mundismo.

    O Livina mede 4,18 metros de comprimento (um Volkswagen Golf tem 4,2 metros, e o Fit vai a 3,9 metros), com boa distância entre-eixos de 2,6 metros (2,5 metros no Fit) e altura de 1,57 metro (contra 1,53 no Fit). O resultado disso é que o espaço é abundante para quatro pessoas, mas cinco adultos não vão se sentir felizes -- e também deve-se dar adeus à pretensão de ficar mais alto do que os outros no trânsito. A sensação do motorista é a de estar a bordo de um hatch comum. Incompreensivelmente, não há regulagem de altura no banco dianteiro nem nas versões SL. O porta-malas, adequado e com bom acesso, comporta 449 litros (769 litros com o banco rebatido).

    ELE É BEM MAIS SIMPLES

    As versões 1.6 e 1.8 do Livina são muito mais despojadas que as SL com os mesmos motores, como se nota pela grade na cor "titanium" em vez de cromada e no arremate para o vazio deixado pelos faróis de neblina; a Nissan prevê que o 1.6 liderará as vendas do modelo -- e foi ele que testamos

    IMPRESSÕES DO LIVINA 1.6
    UOL Carros participou nessa quarta (18) de um rápido test-drive com o Livina 1.6, escolhido por ser a versão que a Nissan espera emplacar mais (35% das vendas). Foram cerca de 40 km, em estrada e cidade, nas redondezas de Curitiba.

    Como os demais carros da Nissan, o Livina "veste" muito bem o motorista e o aconchega numa cabine agradável, de tons amenos e com bom aspecto. Mas no Livina experimentado, depois de alguns minutos a bordo já se notam alguns problemas e ausências. Num carro de R$ 46.690, há plásticos por toda parte, o sistema de iluminação é simplório, o painel não tem nem marcador de temperatura (computador de bordo, então, nem pensar), falta espelho no para-sol do motorista e o do passageiro não tem luz. Os comandos do ar-condicionado ficam afundados no console central, e os difusores de ar frontais não podem ser vedados. As portas dianteiras fecham com um estrondo de dar medo. Mais grave é não possuir travamento automático das portas, nem regulagem de altura do cinto de segurança.

    DADOS TÉCNICOS
    Divulgação
    Motores 1.6 e 1.8 do Livina são os primeiros da Nissan a admitir álcool
    FICHA COMPLETA DO LIVINA
    Mas a rodagem do Livina é interessante e compensa, ao menos em parte, a falta de conteúdo da cabine. Alimentado com álcool, o propulsor 1.6 mostrou-se muito valente, proporcionando boas arrancadas e retomadas confiáveis.

    Segundo a Nissan, 90% do torque máximo já estão disponíveis em 2.400 giros -- um acerto adequado para o anda-para da cidade, e que não força o motor em velocidades mais elevadas. O câmbio manual pareceu muito mais suave e preciso que os de Tiida e Sentra. Na soma de motor e câmbio harmônicos com a diferenciada direção com assistência elétrica da Nissan, o único resultado possível seria mesmo um carro muito prazeroso de guiar. É essa a grande qualidade do Livina.

    Mas é bom sossegar o pé direito. A carroceria do Livina não é exatamente um show de aerodinâmica, e por isso o carro é muito suscetível aos ventos frontal e lateral. A suspensão é macia, calibrada para garantir conforto em situações urbanas, e não foi feita para ser exigida em curvas mais arriscadas. Nem é preciso forçar muito para o Livina cantar pneu.

    Devido à ausência de computador de bordo, não foi possível registrar números de consumo. A Nissan promete o Livina 1.6 entregando 7,7 km/l e 10,5 km/l com álcool (cidade e estrada); com gasolina, 12,8 km/l e 17,5 km/l. A velocidade máxima oficial é de 183 km/h (com álcool; 180 km/h com gasolina).

    Pelo conjunto da obra, o Livina 1.6 pode agradar aos saudosistas do Fit anterior -- há quem tenha achado o atual muito "retangular", há quem sempre o tenha julgado "família" demais. E muitos não gostaram do reajuste de preço para a nova geração. Bem, o Livina é mais barato e mais nervoso que o carro da Honda, e quem realmente gosta de dirigir vai saber apreciá-lo.

    Mas, apesar da indiscutível qualidade da marca Nissan, talvez falte ao Livina o pedigree do seu maior rival, já chancelado por mercados exigentes como o norte-americano e o europeu. E, se por aqui o Livina quer emplacar 7.200 unidades em nove meses nas lojas em 2009, em apenas três o Fit já emplacou 6.700 exemplares.

    O jornalista viajou a convite da Renault-Nissan