Chery apela a orgulho chinês, mas importa designer para fazer carro bonito
A montadora chinesa Chery deu alguns tropeços em sua incursão brasileira, iniciada em 2009. Teve de fazer o suicídio assistido de um modelo lançado como grande coisa (o Cielo, hatch e sedã, fracasso de vendas); estreou um produto de futuro promissor (o subcompacto QQ) quando ainda era ruim; e bancou horrenda campanha publicitária para seu principal carro no segmento compacto (o Celer).
Ao mesmo tempo, jamais abandonou os planos de erguer fábrica no Brasil -- serão duas, uma delas de motores; a de carros será inaugurada até agosto em Jacareí (SP). E sonha com 3% de participação no mercado (dez vezes mais que hoje) por volta de 2017/18.
Parte dos obstáculos pode ser atribuída à inconfiabilidade dos carros chineses, real ou imaginária, mas assim percebida pelo grosso dos consumidores. E o curioso é que a matriz da Chery (empresa estatal pertencente ao governo da província de Anhuí) passou recibo disso durante o Salão de Pequim, em sua apresentação à mídia na semana passada.
"Éramos o centro do mundo, mas hoje somos questionados por nossa pomposidade (sic) e imitações", disse um texto projetado em telão durante o evento. Não seria a última vez em que veríamos, na China, esse mix de "orgulho nacional" com "qualidade dos carros".
Adotando o slogan "Faithful to your trust", que se traduz como "Fiel à sua confiança", a Chery lembrou que, nos seus meros 17 anos de existência, vem lutando para elevar o nível de seus carros. Num aceno ao mercado externo, disse que nos últimos dez anos já superou a marca de 1 milhão de unidades exportadas para mais de 80 países.
Mas orgulho nacional não é o mesmo que xenofobia. Tanto que a Chery, que se gaba de não ter parceria com montadoras ocidentais, hoje conta com um forasteiro para, como disse, elevar o nível de seus carros e se transformar numa empresa competitiva globalmente. É o designer James Hope, um canadense com passagem pela Opel (subsidiária alemã da General Motors) que chegou à China com a missão de "ouvir o consumidor", segundo suas próprias palavras, e de ajudar a "deixar para trás a má imagem do carro chinês".
DE OLHO NA KIA
Duas criações de Hope foram mostradas em Pequim: os conceitos Alpha (sedã compacto-médio, com 4,52 m de comprimento e 2,65 m de entre-eixos) e Beta (SUV compacto). Belos exercícios de estilo que, particularmente no caso do três-volumes, parecem prontos para ganhar a linha de produção.
A influência da Kia é evidente, e Hope não disfarça: "A Kia está avançando muito na área do design, e posso garantir que já faz um bom tempo que até fabricantes europeias estão de olho nela", disse. A marca sul-coreana é hoje presidida pelo alemão Peter Schreyer, justamente o designer que mudou sua cara ao longo dos últimos cinco anos. Hope deu risada quando UOL Carros sugeriu que ele poderia seguir o mesmo caminho dentro da Chery: "Já tenho muita coisa para fazer no meu cargo atual".
Além dos dois conceitos, os destaques da fabricante chinesa no Salão de Pequim foram o sedã Arrizo 7 e o SUV Tiggo 5, ambos de médio porte, apresentados como protótipos no Salão de Xangai em 2013. Também estavam na mostra o Tiggo 3, de geração seguinte à do vendido atualmente no Brasil (e que só chega em 2015) e o novo Celer, primeiro carro a ser fabricado pela Chery no Brasil.
A nova geração do QQ, experimentada na China por UOL Carros em 2013 e novamente agora, muito mais decente que a atual, só deve ser feita no Brasil em 2015. Até 2017, um hatch e um sedã compactos, inéditos e mantidos sob sigilo, também serão produzidos no interior paulista.
DANDO UMA VOLTINHA
A Chery ofereceu a jornalistas uma experimentação ligeira do Arrizo 7 e do Tiggo 5 numa pista de testes em Wuhu, cidade-sede da empresa e endereço de seu impressionante -- mas de linha um tanto vagarosa -- complexo fabril, o qual abastece o mundo tudo e pode fazer 900 mil carros e 900 mil motores por ano.
Os dois modelos se mostraram interessantes; o Arrizo, particularmente: é um sedã "espalhado" (comprido, baixo e largo) com posição de dirigir elevada e suspensão tunada para o conforto. A dianteira é bonita, a traseira peca ao resolver mal a conversa entre as lanternas e o nicho da placa (que deveria ficar no parachoque). O modesto motor 1.6 a gasolina, acoplado a um câmbio CVT (continuamente variável), até dá conta do recado, mas o modelo seria mais instigante com um propulsor maior.
Luís Curi, diretor da Chery no Brasil, disse que planeja usar a cota de importação de cerca de 4.900 carros/ano, garantida pelo Inovar-Auto, para levar o sedã ao nosso mercado, onde concorreria com Honda Civic e Toyota Corolla, entre outros. O preço, em pacote único e com câmbio automático, poderia ficar na casa dos R$ 60 mil.
Já o Tiggo 5, que estreia em maio no mercado da China, é o que poderíamos chamar de "Tiggão". Lembra muito o Toyota SW4 quando visto de frente, mas pelo menos ninguém vai confundi-lo com um Hyundai ix35 (como acontecerá com o JAC T6).
Apesar de não ser turbo nem V6 ou V8, muito pelo contrário (o motor é um 2 litros de 139 cavalos, com câmbio manual na unidade testada), esse SUV chinês tem duas saídas de escape, colaborando para gerar ruído de modelo esportivo (aparentemente é de propósito, mas nenhum funcionário chinês da Chery conseguiu entender a pergunta sobre isso). É um jipão muito gostoso de guiar e, assim como o Arrizo, impressionou pelo tuning da suspensão. Não há previsão de vendê-lo no Brasil, ao menos por ora.
Viagem a convite da Chery Automobile
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