Donos têm relação de amor e ódio com câmbio PowerShift da Ford
UOL Carros conversa com pessoas proprietárias da transmissão de dupla embreagem e relata sentimentos de decepção e satisfação
O câmbio Powershift causou empolgação quando estreou no New Fiesta, em 2013. Ouvia-se tão bem das caixas de transmissão de dupla embreagem -- normalmente restritas a modelos mais caros e/ou esportivos -- que ver a opção entre carros compactos era uma evolução.
Porém, relatos de problemas são constantes até hoje. Donos de modelos falam de suas experiências com a caixa, enquanto a Ford a tira de cena: o Ka 2019 foi lançado com transmissão automática convencional, com conversor de torque, mesmo caminho do renovado EcoSport e, futuramente, do Fiesta.
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O câmbio automatizado de dupla embreagem e seis marchas causou problemas já nas linhas 2013 e 2014 -- o Procon-SP teve de dar uma prensa na Ford para tomar providências. Ruídos, trepidações, superaquecimento, perda de força do motor e até travamento das marchas eram queixas comuns dos clientes.
O fabricante não fez um recall formal, mas efetuou reparos nos carros com problemas mesmo que fora da garantia. Na época, alegou que a causa era a contaminação de uma das embreagens (que funciona a seco) pelo fluido da transmissão. O reparo incluiria a adoção de nova vedação, inclusive para os modelos que ainda seriam produzidos. Além disso, a garantia para a caixa foi estendida de três para cinco anos, ou 160 mil km.
Problemas nos modelos mais novos
Mesmo exemplares mais recentes, contudo, apresentam problemas parecidos. O petroleiro Thiago Verdan Prudencio Barbosa, 32, comprou seu Focus Titanium Plus 2015 com 20 mil km rodados. Com um ano de uso e 55 mil km no hodômetro, diz que o câmbio começou a ficar vacilante nas trocas e a apresentar pequenos trancos nas reduzidas.
"Até um dia que acendeu a luz da injeção e a transmissão parou de engatar marchas pares. O giro subia que era um absurdo", recorda. O Focus de Barbosa ficou parado 40 dias na concessionária à espera de peças -- segundo o petroleiro, a revenda trocou o conjunto de embreagem e de solenóides e o carro não apresentou mais problemas.
Já o engenheiro Carlos Felipe Sá Baioneta, 33, também teve problemas com o câmbio do seu Fiesta Titanium Plus 2016/2017. Ele conta que em duas situações distintas o Powershift travou e não engatou a marcha. "Ficou como se estivesse em ponto morto. Como eu estava acelerando, o giro subiu e deu tranco forte", explica.
Baioneta, que também se queixa da falta de agilidade da transmissão -- mesmo na versão com motor turbo EcoBoost --, diz que vai relatar o incidente na próxima revisão, de 30 mil km. Enquanto isso, se previne. "Na estrada, em uma redução, eu mudo as marchas manualmente no modo sequencial. Antes de acelerar na ultrapassagem, já deixo a marcha forte engatada, algo que sempre fiz em todos os meus automáticos", garante.
Adaptação
Dicas de como lidar com a caixa automatizada de dupla embreagem não faltam. Para o professor universitário e engenheiro de pesca, Fabricio de Lima Freitas, 37, é preciso ter em mente que o câmbio PowerShift é diferente de um automático convencional.
"Acredito que o câmbio se comporta bem, mas é preciso uma adaptação do motorista no seu modo de dirigir. Por exemplo, ao passar numa lombada e sair rápido o carro vai patinar, principalmente se estiver pesado. Melhor sair devagar e deixar o motor retornar aos poucos", sugere Freitas, dono de um Fiesta Titanium 2015/2016. Ele garante estar satisfeito com o carro.
A bancária Daniele Xavier, 38, também se intitula "feliz proprietária" de um Ecosport Freestyle 2015, comprado seminovo. Ela roda mais de 200 km com o SUV por semana e acha a performance da transmissão bem melhor que a do Renault Duster automático que teve anteriormente -- e de outros modelos que testou antes de fechar negócio.
"Pesquisei muito e vi vários relatos de reclamações. Para minha alegria, não tive nenhum problema. Tanto no Duster quanto nos outros que testei, achei as trocas de marcha muito duras, com solavancos e, às vezes, muito longas", compara.
Thiago Barbosa, por sua vez, prefere outros tipos de automáticos. Sua família também é dona de um Volkswagen Jetta com a cultuada caixa automatizada de dupla embreagem DSG, banhada a óleo e de um Hyundai Creta automático. "O funcionamento da transmissão com conversor de torque é mais suave, então eu diria que, para o dia a dia, é melhor. Porém, a dupla embreagem traz mais esportividade, só que o PowerShift é muito mais poroso do que o DSG com embreagem banhada”, pondera.
Desvalorização
Os problemas no câmbio da Ford se refletem na liquidez dos carros equipados com a transmissão Powershift. Na tabela Fipe, por exemplo, um EcoSport Titanium 2.0 2015 com a transmissão é cotado mais barato que a versão manual (R$ 59.627 ante R$ 59.896). Em revendas e lojas de usados consultadas, o Fiesta automatizado também pode ser R$ 1 mil mais barato que o mesmo carro de ano/modelo igual e com caixa manual.
"O carro ficou com má fama, infelizmente. Quando pegamos um o dono fica chateado, pois o preço vai lá para baixo. E ainda demoramos a vender. Já fiquei com um Fiesta Powershift aqui por quase quatro meses, enquanto vendi, em menos de trinta dias, outros carros da Ford com câmbio manual", diz um vendedor de uma loja em São Paulo que pediu para não se identificar.
Carlos Baioneta é um dos que não sabe se apostaria em um Powershift (enquanto ainda existem). "Lembro dos elogios à dupla embreagem no lançamento, que prometia trocas ágeis. Mas fiquei um pouco decepcionado e hoje prefiro um câmbio com conversor de torque ou CVT, como do antigo Honda Civic", avisa.
"Eu teria outro Ford automático, porém, pelo lado de revenda, tendo uma desvalorização grande e rejeição do mercado, não seria minha primeira opção. O PowerShift ficou com péssima reputação", acredita o petroleiro Thiago Barbosa.
Para outros, contudo, o câmbio automatizado pode ser até razão de compra. "A Ford assumiu os problemas do passado, acertou os erros e ainda oferece garantia estendida. Então, pode se jogar sem medo", defende Daniele Xavier. "Eu continuaria utilizando esse sistema sem medo algum. Minha experiência foi muito positiva", faz coro Fabrício Freitas.
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