Limite de velocidade menor nas ruas pode ser bom para corridas de carro
Resumo da notícia
- Tendência automotiva é de restrição de velocidade em prol da segurança nas ruas
- Para quem gosta de carro como máquina veloz, pode parecer um "futuro sombrio"
- Medidas de segurança nas ruas podem beneficiar esporte a motor de alto nível
O milésimo Grande Prêmio de Fórmula 1, disputado recentemente na China e vencido pelo pentacampeão Lewis Hamilton, levantou muitas questões sobre o futuro da categoria e do automobilismo como um todo. E para muitas pessoas, esse futuro não parece muito encorajador. Muito disso pode ser atribuído ao segmento automotivo em rápida evolução, que representa um grande desafio para o esporte a motor continuar relevante.
A Volvo anunciou, recentemente, que não produzirá carros semi-autômos e autônomos que ultrapassem o limite de velocidade das vias públicas ou a velocidade máxima de 180 km/h. Até mesmo a Alemanha está falando em colocar um limite de velocidade de 200 km/h nas rodovias.
Se pensarmos sobre isso, há uma lógica direta: se você não pode ir além de 25 km/h em uma bicicleta elétrica, porque é perigoso para os pedestres, então por que vender um carro que vai a 300 km/h em um país onde a velocidade máxima é de 120 km/h em uma via pública?
À medida que as regulamentações governamentais se tornam mais rígidas em termos de segurança, tenho certeza de que em 10 anos você não poderá comprar um carro novo sem algum tipo de sistema autônomo para torná-lo mais seguro, como sistema anticolisão ou controles de velocidade por localização.
Isso não é necessariamente ruim, mas à medida que se torna cada vez mais restritivo, terá sérias implicações para o automobilismo.
Montadoras podem investir menos em velocidade
Em circunstâncias em que a potência e a velocidade são constantemente monitoradas, por que um fabricante investiria em um programa de corrida para desenvolver tecnologia que faria com que seu último supercarro fosse dois segundos mais rápido em uma pista do que o modelo anterior?
As marcas de performance verão que não precisam investir no automobilismo para ter sucesso.
Bugatti, por exemplo, não faz nenhum veículo de corrida, assim como Koenigsegg e Pagani -- mas todos são muito bem-sucedidos, apesar de 99,9% de seus clientes não saberem como extrair o verdadeiro desempenho deles. E mesmo que o façam, nunca o usarão durante a vida útil do carro, porque, na maioria das vezes, são comprados para ser um símbolo de status.
Tesla não está na Fórmula E, mas tem o carro elétrico mais vendido atualmente, o Model 3. Ainda na categoria de corrida com elétricos, as pessoas não têm a percepção de que a Jaguar tem um sistema de transmissão melhor porque eles ganharam na etapa de Roma. Mas eles vão comprar um Jaguar I-Pace (utilitário esportivo elétrico da marca inglesa) em vez de um Tesla Model 3.
Vários exemplos mostram que o modelo "Ganhe no domingo, venda na segunda-feira", muito forte nos anos 1950, 1960 e 1970, está diminuindo.
Claro, ainda há relevância: Ferrari e Porsche construíram o prestígio em torno de suas marcas através da história no automobilismo; e a Audi transformou sua imagem com o sucesso em Le Mans -- mas terá um efeito muito menor ao longo do tempo, como já estamos vendo com Tesla, quando os carros serão cada vez mais autônomos.
À medida que a curva de relevância entre o automobilismo e a indústria automotiva diminui, o esporte a motor precisa se adaptar para reduzir essa curva. Um caminho é integrar os sistemas autônomos ao automobilismo, como estamos fazendo com a Roborace. Mas o futuro do automobilismo ainda pode ser brilhante, dependendo da velocidade com que se adapta a essas novas realidades. E, na minha opinião, poderia haver um impacto positivo de uma forma inesperada.
Lugar de pisar é na pista e isso reforça esporte
À medida que a regulamentação nas estradas fica mais rígida, espero que as pessoas que realmente gostem de dirigir seus carros com velocidade procurem mais as pistas de corrida, participem de mais track-days e corridas amadoras.
Assim, enquanto a quantidade de dinheiro que os fabricantes iriam gastar no automobilismo diminuiria em média -- porque haveria menos mercado e menos potencial para essas tecnologias no automobilismo profissional--, o automobilismo amador poderia realmente ganhar força, à medida que mais pessoas tivessem acesso a carros melhores. Isso, por exemplo, é algo muito viável na Índia e na China, onde o PIB está aumentando a cada ano.
Como a Fórmula 1 responderá a isso é a grande questão. Terá de ser proativa para manter os fabricantes interessados e continuar gerando engenheiros profissionais, pilotos e mídia, que manterão a chama viva para os próximos mil Grandes Prêmios.
Mas o automobilismo, como conhecemos, não vai diminuir como esporte. Ainda haverá muitas pessoas dirigindo seus carros e querendo ter essa adrenalina, mas será diferente.
* Lucas Di Grassi é piloto do Campeonato Mundial de Fórmula E e acumula um título mundial, dois vices campeonatos e um terceiro lugar em quatro temporadas. Já competiu em categorias como o Mundial de Endurance e a Fórmula 1. O brasileiro é embaixador da ONU para o meio ambiente e atua ainda como CEO da Roborace, empresa inglesa que está desenvolvendo carros de corridas autônomos e elétricos.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL
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