Duelo: Mercedes-Benz Actros de estrada encara caminhão de corrida; assista
Resumo da notícia
- Caminhões usam mesma cabine, mas tem diferenças em conforto e desempenho
- Actros "de estrada" tem 510 cv; versão de pista tem mais que o dobro da potência
- Versão da Copa Truck pode chegar aos 240 km/h
A física dificilmente aceitaria um caminhão feito para disputar corridas. Felizmente alguém decidiu ignorar isso e assim nasceram os caminhões da extinta Fórmula Truck.
Feitos sobre caminhões originais, eles recebem milhares de equipamentos para pista, como bancos concha e gaiola de proteção homologados pela FIA. Isso sem contar a preparação no motor, capaz de fazê-los chegar aos 240 km/h sem dificuldades.
Desempenho não é a única grande diferença entre eles, como UOL Carros constatou no Autódromo Ayrton Senna, em Londrina (PR). As duas versões do Mercedes-Benz Actros guardam pouquíssimas semelhanças entre si, a começar pelas dimensões: enquanto o gigantesco 2651 tem quase 7 metros de comprimento, o caminhão de competição é bem menor e mais baixo - algo perfeitamente normal quando falamos em um bólido feito para pistas.
Um Mercedes de verdade
Dirigir o Actros 2651 é fácil como conduzir um automóvel - com a óbvia exceção de viajar em uma posição muito mais alta. O motorzão OM 460 LA de 13 litros e seis cilindros em linha entrega 510 cv a apenas 1.800 rpm. Já o torque máximo é de 244 kgfm, disponíveis a 1.400 rpm. Pareceu muito? Então saiba que o Actros da Copa Truck tem mais de 1.200 cv e 560,8 kgfm!
A direção é muito leve considerando que estamos dirigindo um caminhão. A transmissão automatizada de 12 marchas privilegia o torque, e por isso as primeiras sete velocidades têm relações encurtadas. As trocas, porém, são acompanhadas de trancos, como é de praxe nas caixas automatizadas.
Rapidamente chegamos aos 120 km/h limitados eletronicamente. Difícil é pensar como pará-lo em uma situação de emergência. É aí que entra a tecnologia, capaz de fazer o caminhoneiro até ignorar o pedal de freio mesmo diante de uma descida.
Foi isso que fizemos (com um pouco de receio, admito) devidamente supervisionados por João Moita. Se você não conhece este simpático senhor, pense que ele é algo como o Valentino Balboni da Mercedes-Benz Caminhões no Brasil.
Piloto de testes há décadas e caminhoneiro experiente, Moita ensinou todos os macetes do Actros. Aprendi a operar o Retarder, um sistema hidráulico de freio auxiliar integrado à transmissão ativado juntamente com o freio motor e os freios de serviço.
É possível escolher entre cinco estágios progressivos de atuação, agrupados em uma alavanca atrás do volante - e assim o caminhão reduz a velocidade sem qualquer intervenção. Juntamente com o Top Brake (sistema que amplia a eficácia do freio motor aumentando a pressão acumulada no coletor de escape), os recursos ampliam a capacidade de frenagem, diminuem o desgaste das lonas e reduzem as chances de superaquecimento.
Assim como um automóvel de ponta da Mercedes-Benz, o 2651 vem com assistência de frenagem de emergência. Se não houver reação aos alertas de iminência de colisão, o Actros aciona os freios para parar o caminhão - ou ao menos minimizar os danos. Preferi não testar a eficiência deste recurso na prática, mas confio na palavra da Mercedes.
Quase uma casa ambulante
O nível de conforto também está mais para carro do que caminhão. O banco do motorista tem um sistema pneumático que absorve irregularidades do piso e diversos ajustes elétricos de posição. Acoplado ao descansa-braço do lado direito fica a pequena alavanca do câmbio de 12 marchas, cujas trocas podem ser realizadas de forma sequencial se o caminhoneiro preferir.
Sobram porta-objetos de todos os tipos e tamanhos pela enorme cabine - e até fora dela, como o nicho na escada de acesso à cabine (devidamente protegido pela própria porta) feito para o caminhoneiro deixar seus calçados se não quiser sujar o carpete.
Atrás dos bancos fica um colchão e o sistema de refrigeração que permite climatizar a cabine sem a necessidade de deixar o ar-condicionado ligado durante a noite. Existe até uma cortina para dar privacidade a quem vai passar a noite na beira da estrada. Só que tanto conforto tem seu preço - e ele não é baixo: aproximadamente R$ 500 mil.
E na pista?
Do Actros 2651 de rua, o bólido da Copa Truck traz só a estrela de três pontas no "nariz" e mais nada. Sobre um chassi de um modelo Actros 2646 de três eixos, o caminhão é encurtado para ter apenas dois eixos e passa de um legítimo estradeiro 6x4 para um veloz 4x2.
Antes mesmo de os motores ligarem, o estranhamento se dá pela altura da cabine. Ele passa de 3,73 m de altura para 2,80m, o limite do regulamento da Copa Truck.
Nas laterais, em vez dos tanques com mais de 850 litros de capacidade, entram carenagens aerodinâmicas que recobrem até as rodas traseiras. O reservatório de diesel vai parar no meio no chassi, junto com outro tanque, de água, para refrigerar motor e freios, com capacidade para 180 litros. São 30 litros a mais que os líquidos transportados para arrefecer um Actros 2646 convencional.
Bancos concha com cintos de cinco pontos, manômetros de pressão da turbina, dos freios e do óleo são tão importantes quanto o pequeno visor digital que repete essas informações de maneira mais, digamos, didática. Mas nada como confiar nos mostradores analógicos em um conjunto tão "raiz". O volante com revestimento em alcantara, os pedais de alumínio com um emborrachado anti-derrapante e, claro, uma estrutura interna com barras bem espessas - uma espécie de célula de sobrevivência à moda antiga.
E apesar de todo impacto visual das modificações, eles se tornam até plausíveis perto do que ocorre quando o botão de ignição é pressionado. Absolutamente nada, em nenhuma competição, passa perto do tremor que o motor de seis cilindros e 12,8 litros faz ao ser despertado. A marcha lenta soa como uma explosão a cada curso dos pistões. É como se uma britadeira, a cada toque no chão detonasse um punhado de pólvora.
Com modificações específicas em peças, e 0,8 litro a mais de capacidade cúbica no mesmo bloco de motor do Actros, ele recebeu um novo sistema de escape - sem restrições de emissões de poluentes - e uma turbina generosamente maior, com capacidade de entregar até 4 bar de pressão.
Isso eleva a sua potência de 510 cv, a 1.800 rpm, com rotação máxima de 2.200, do Actros para nada menos do que 1.200 cv, a 3.500 rpm, podendo girar a até 4.000 rpm, algo que beira o surreal quando se considera motores diesel. O torque de 560,8 mkgf seria capaz de rebocar o dobro de peso do Actros, mas é usado apenas para você se sentir como se fosse sugado por um buraco negro a cada arrancada.
Na prática os resultados igualam bólidos da Copa Truck (como o branco e rosa de número 7 pilotado pela experiente Débora Rodrigues) aos melhores esportivos que se pode comprar com R$ 350 mil na mão. Acelera de 0 a 100 km/h na casa dos 5 segundos, e chega aos 240 km/h de velocidade final, tornando quase imperceptível o "detalhe" de ter de carregar 3.500 kg de peso.
Velocidade limitada
Na pista a sensação de brutalidade aumenta geometricamente. Com os números da ficha na cabeça, é natural pensar que se trata de um bloco de ferro, quase inguiável e, pior, imparável. Mas não é. Nas mãos de Débora, que há 21 anos se aventura por asfaltos e zebras de todos os autódromos brasileiros na boleia desses supercaminhões, é nítido que ele se parece muito mais com um carro de corrida à moda antiga.
Com pouca eletrônica, tração traseira com diferencial bloqueado, e dono de um bom equilíbrio (com 52% do peso no eixo dianteiro e 48% no traseiro) ele transcende do medo à diversão em poucas curvas.
Saídas de traseira, reduzidas para mergulhar nas curvas e retomadas dignas de um AMG são parte do comportamento esportivo. A falta de eletrônica para a dinâmica e o câmbio manual de 6 marchas - herdadas da linha de ônibus grandes da marca - dão o tom dessa autenticidade que só os caminhões têm. Seus pneus são do mesmo tipo dos de rua, mas são lixados para perderem a parte mais mole do composto e aderirem melhor ao asfalto quando esquentam.
Na hora de parar, há radiadores exclusivos para os freios vencerem a física, tanto pelo atrito de componentes, quanto pelo peso que se tem de frear. Não é à toa que nas provas a velocidade em reta é limitada por radares. Ainda que ele chegue aos 240 km/h, nas corridas há radres que limitam a velocidade em alguns trechos, e que raramente passam dos 180 km/h.
A exemplo do Actros 2651, o preço de um Copa Truck não é dos mais convidativos. Além dos R$ 350 mil pedidos pelo caminhão "básico", cada prova consome de R$ 65 mil a R$ 70 mil por caminhão (ou R$ 200 mil no caso da equipe AM Motorsport, na qual Débora corre), incluindo passagens aéreas, hospedagens, jogos de pneus, combustível, mecânicos e transporte. A diferença é que com o Actros, você faz dinheiro. Com o Copa Truck você vende emoções.
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