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Como são definidas as cores do seu carro e quais delas fazem mais sucesso

Hyundai aproveitou a reestilização da família HB20 para reformular a gama de cores  - Hyundai/Divulgação
Hyundai aproveitou a reestilização da família HB20 para reformular a gama de cores Imagem: Hyundai/Divulgação

Thiago Lasco

Colaboração para o UOL

06/03/2020 04h00

A definição das cores de um modelo é um processo mais complexo e demorado do que se imagina. Cada nova cor que chega ao mercado é o resultado de escolhas que foram feitas com dois ou três anos de antecedência dentro da montadora.

Em fabricantes como a Volkswagen, a área de Design recebe uma espécie de briefing do projeto do carro, que explica qual será a proposta daquele modelo. A partir daí, pesquisa tendências internacionais e referências de birôs de estilo e propõe alguns tons que se encaixariam naquilo que o produto demanda.

"As cores que nós sugerimos variam conforme a mensagem que a marca quer passar com aquele modelo: de esportividade ou de luxo, por exemplo", explica a designer Milene Kazama, do departamento de Color & Trim (responsável por cores e acabamento) da VW.

No caso da Hyundai, o Centro de Design da marca na Coreia do Sul cria uma paleta com várias opções de cor e a subsidiária brasileira escolhe aquelas que entende mais adequadas ao consumidor daqui. "A gente coloca para eles as necessidades do mercado brasileiro, que é mais conservador em relação a cores", explica o gerente de produto da Hyundai Motor Brasil, Rodolfo Stopa.

É comum, aliás, que carros globais tenham cores diferentes em cada mercado. É o que ocorre com o Volkswagen T-Cross, que tem um posicionamento diverso no Brasil, na Europa e na China - e uma cartela de cores diferente em cada uma dessas regiões.

Na Alemanha, o modelo é a opção de entrada de uma gama de utilitários que também tem o T-Roc (não vendido no Brasil) e o Tiguan. Por ser direcionado a compradores mais jovens, abaixo dos 30 anos, ele vem em cores como as vibrantes Turquesa Makena e Laranja Energetic. Já no Brasil, ele tem um público diferente, que pede uma cartela mais sóbria e sofisticada.

Nos exemplares de HB20S exportados para o Paraguai e o Uruguai, a Hyundai brasileira oferece a cor Vermelho Magic, atendendo ao gosto do público desses países. No Brasil, o tom só está disponível na configuração hatch do modelo: é impossível comprar um sedã vermelho por aqui.

T-Cross Bronze Namíbia - Volkswagen/Divulgação - Volkswagen/Divulgação
A cor Bronze Namíbia caiu no gosto dos consumidores do T-Cross no Brasil e vende quase tanto quanto a tradicional prata
Imagem: Volkswagen/Divulgação

Nome de cor é questão de marketing

Os preços das cores seguem critérios mercadológicos. Em tese, as sólidas têm custo menor para a montadora que as metálicas e isso se reflete no valor cobrado do consumidor. Mas pode ser que a marca queira impulsionar as vendas de um determinado tom metálico e o ofereça sem custo extra (caso do vermelho cereja dos primeiros Peugeot 2008), enquanto cores sólidas podem ter cobrança adicional.

O marketing também entra em cena na hora de dar nomes aos tons. Se a ideia de levar para casa um carro roxo ou marrom soa incômoda para alguns consumidores, batizá-la como uma cor mais "digerível" pode ajudar na assimilação. A Fiat vendeu por longos anos um indisfarçável marrom como "Cinza Tellurium", enquanto o roxo do Chevrolet Cruze atual é chamado de "Vermelho Edible Berries", por exemplo.

Como o desenvolvimento e a implantação de uma cor levam muito tempo, acrescentar novas opções na linha não é nada trivial, nem barato. É preciso fazer inúmeros testes - de durabilidade e até ambientais - e também preparar os concessionários, pois suas oficinas terão de estar prontas para fazer reparos de funilaria e pintura nos novos tons. É por isso que os carros em geral passam vários anos com mudanças mínimas na cartela de cores.

"Não vale a pena trocar a paleta o tempo todo. As marcas deixam para fazer isso ao lançarem um facelift ou nova geração", diz Stopa, da Hyundai, que em 2020 reformulou completamente a gama de cores do HB20 - apenas o Preto Onix e o Prata Sand foram herdados do modelo anterior.

Branco é o novo prata

O enorme contingente de carros pretos, prata e cinza rodando pelas nossas cidades não mente: o brasileiro é um povo avesso a novidades quando o assunto é cor. Isso porque existe por aqui uma crença de que cores mais chamativas são difíceis de emplacar na hora da revenda.

"Muitas vezes a pessoa até gosta (de uma cor mais diferente), mas fica com medo de comprar: é bonita para mim, mas não é bonita para os outros", conta Stopa.

Esse fantasma da desvalorização não assusta tanto em alguns segmentos. "Esportivos podem ter tons mais chamativos, como o azul do BMW M2, por exemplo", explica Paulo Garbossa, consultor da ADK Automotive. "Já no modelo de entrada, ousar na cor é mais complicado, porque o proprietário não quer perder dinheiro. Receber R$ 3 mil a menos na revenda tem peso muito maior em um carro de R$ 50 mil que em outro de R$ 250 mil."

Em meio a uma frota dominada por mais de 50 tons de cinza, chama a atenção a ascensão silenciosa do branco. Em uma década, a participação dessa cor quase quadruplicou: foi de 12% em 2010 para 43% em 2019.

Já o bolo formado por preto, prata e cinza, que respondia por 73% do mercado há dez anos, fechou 2019 com 47%. O prata sozinho hoje responde por 22% das vendas, metade do que vende o branco. Os dados são da Anfavea, a associação que representa as montadoras.

Considerando apenas as vendas do mês de fevereiro de 2020, os números da consultoria Jato Dynamics comprovam a liderança da cor branca, com 34,03%. Mais que o dobro do que venderam a preta e a prata, quase empatadas, com 16,93% e 16,85%, respectivamente. Depois vêm cinza (12,31%), vermelha (12,24%), azul (5,33%), laranja (0,72%), verde (0,47%), marrom (0,45%) e amarela (0,38%).

Renault Captur laranja bicolor - Renault/Divulgação - Renault/Divulgação
Teto na cor preta é recurso que ajuda na aceitação de tons mais vibrantes para a pintura da carroceria
Imagem: Renault/Divulgação

Brasileiro começa a se abrir para cores novas

Ainda que variações de branco, cinza e preto predominem, há uma luz no túnel para os fãs de tons mais alegres. As montadoras têm notado uma abertura maior do brasileiro para outras cores.

"Tivemos uma experiência muito positiva com o Prata Sand (espécie de bege metálico, que foi lançada com a primeira atualização do HB20, na linha 2016). Ele se tornou tão relevante que hoje responde por 20% das vendas. Por isso, foi mantida no novo modelo 2020", comemora Stopa, da Hyundai. "Se tivéssemos puxado o tom um pouco mais para o bege, provavelmente ele não teria tido um resultado tão bom."

A Volkswagen também se surpreendeu com os números do T-Cross em seu primeiro ano de vida. "O Azul Norway está vendendo muito bem. E o Bronze Namíbia (um tom de marrom meio acobreado) está encostando no tradicional prata em números de venda", revela Milene Kazama, designer da marca.

Ela acredita que o sucesso dessas cores pode ter sido favorecido pela combinação com o teto pintado na cor preta. "Esse recurso quebra um pouco o grande volume da carroceria em uma mesma cor e ajuda na aceitação de tons como bronze, vermelho e laranja", ela explica.