Rifa de carros: influencers usam redes para lucrar com sorteios ilegais
Eduardo Razuk, do canal Backstage, não é o único a lucrar e ganhar audiência com sorteios de carros - a prática é ilegal, de acordo com o Ministério da Economia, responsável por regrar e fiscalizar loterias e jogos de azar no País.
Basta uma rápida pesquisa no Youtube, no Instagram e no Facebook para constatar que outros influenciadores digitais têm lançado mão desse expediente.
Além deles, colecionadores de carros antigos e vendedores profissionais de veículos têm recorrido à prática, utilizando as redes sociais como ferramenta para viabilizar as rifas - efetuadas mediante a venda de cotas com preço fixo.
Alguns desses "influencers", com milhares de seguidores, anunciam os sorteios nas redes e direcionam o anúncio a sites especializados nos sorteios - nos quais, em geral, o pagamento dos números a serem sorteados é feito mediante transferência bancária, diretamente para a conta pessoa física dos vendedores.
Outros realizam o sorteio nas próprias plataformas sociais onde postam seus vídeos.
O canal do Youtube "PetrolHead" é um exemplo semelhante ao de Razuk: Luan, o dono da publicação, faz preparação de veículos, dentre eles um VW Up TSI que pretende rifar para, segundo ele, custear outros projetos que gerem conteúdo e atraiam mais seguidores.
De acordo com Luan, o sorteio, que ainda não foi realizado, vai contemplar o ganhador com o carro, enquanto o segundo colocado levará R$ 30 mil e o terceiro, um iPhone.
Procurado pela reportagem por e-mail, Luan ainda não respondeu. Seu canal tem cerca de 140 mil inscritos.
Alto faturamento
A prática de rifas também é adotada pelo canal "Vendedor Sincero", cuja conta no Facebook somava ontem mais de 480 mil "curtidas".
Em postagem realizada no último dia 11, com mais de 1,5 mil interações, o vendedor de carros Alessandro Moura anuncia o sorteio de um "kit completo de ostentação", composto por um BMW 316i 2014 e uma moto aquática Yamaha FZS do mesmo ano.
O carro custa cerca de R$ 69 mil na Tabela Fipe, enquanto um exemplar da moto aquática de mesmo ano e modelo tem anúncios por aproximadamente R$ 50 mil em sites de classificados. Somados, os preços chegam a R$ 119 mil.
A rifa do referido "kit" está disponível no site "Rifandos", onde são oferecidas mil cotas de R$ 150 cada. Quando todos os números forem comercializados, o sorteio terá arrecadado R$ 150 mil. Ou seja, pouco mais de R$ 30 mil acima do valor de mercado dos veículos.
Procurado pela reportagem, Moura diz que as rifas que promove "não têm nada a ver com superfaturamento" e que o lucro é direcionado para custear despesas e também para doações. Também conhecido como Alle Moura, ele trabalha em uma loja de automóveis de Araranguá (SC).
"Meu forte é venda de veículos, essa 'ação entre amigos' foi a pedido dos meus clientes. Surgiu com o intuito de poder vender algumas mercadorias que não estavam vendendo na loja", afirma.
Moura, no entanto, diz ter lido a reportagem sobre as rifas ilegais de Razuk publicada por UOL Carros e relatou que não irá mais realizar nem divulgá-las.
"Até então, não sabia que não era permitido esse tipo de ação. Certamente não iremos mais promover". Ontem à noite, o vídeo anunciando o sorteio do sedã e da moto aquática continuava no ar em sua página no Facebook.
Já o Youtuber Rodrigo Platinum, do Espírito Santo, também é vendedor profissional.
Aproximadamente a cada mês, sorteia um carro no seu canal, que tem mais de 440 mil inscritos. A mais recente rifa foi de um Nissan Sentra CVT 2009, com cotas de R$ 25 cada. No vídeo em que ele anuncia o sorteio, não informa a quantidade de cotas e afirma que ele mesmo coloca os nomes dos participantes em uma urna para então determinar o ganhador. Um Sentra do mesmo ano pode ser adquirido por cerca de R$ 25 mil.
"Quero que participem aqueles que gostam do meu trabalho e confiam em mim. Caso contrário, nem precisa assistir ao vídeo", diz na postagem. Escrevemos para o e-mail informado no canal, porém não recebemos retorno até o momento.
Existem outros exemplos, como a Autosorte, cuja página no Instagram foi retirada do ar ontem, após contato de UOL Carros, quando acumulava pouco mais de 900 inscritos. O site da empresa continuava ontem ativo, trazendo rifas de carros antigos como um Volkswagen Gol GTI 1989 por mil cotas de R$ 50 - ou R$ 50 mil.
Um GTI pode ser encontrado em classificados por preços entre pouco mais de R$ 30 mil e cerca de R$ 60 mil - porém, esse modelo específico, dependendo do estado de conservação e da originalidade, tem exemplares que já passaram de R$ 100 mil no mercado brasileiro. Também tentamos contato no número de WhatsApp informado pela empresa, que não respondeu.
Sorteio, só para filantropia ou sem venda de cotas
Segundo o Ministério da Economia, ainda que o dinheiro da rifa sirva para bancar projetos de veículos ou seja total ou parcialmente direcionado para caridade, a prática é considerada clandestina e irregular. A legislação permite sorteios e rifas com venda de cotas apenas para instituições filantrópicas e mediante autorização especial - nesse caso, os sorteios devem ser realizados necessariamente via Loteria Federal.
De acordo com o órgão, "a exploração de bingos, loterias e sorteios é atividade ilegal e constitui contravenção penal", além de ser um "serviço público exclusivo da União".
Por meio de nota enviada à reportagem, o ministério diz que, se houver comprovação de prejuízos a qualquer participante, poderá ser configurado ilícito penal ou, "no mínimo", lesão ao consumidor. "A atividade ilegal não contempla quaisquer garantias ao público participante de maneira a prevenir as mais variadas formas de manipulação ou fraudes de resultados", complementa o órgão.
Por sua vez, o advogado Acácio Miranda, mestre em direito penal internacional pela Universidade de Granada (Espanha), vai na mesma linha e diz que rifa, loteria e bingo são considerados jogos de azar - cuja realização é uma exclusividade do governo federal.
"Rifa envolve a venda de números para os participantes concorrerem a um prêmio. Promoção de shopping, por exemplo, é diferente. Trata-se de um incentivo à venda de produtos, no qual não há arrecadação de dinheiro decorrente do sorteio", avalia.
Redes não dizem se conteúdo será removido
Entramos em contato com o Google, dono do Youtube, com o qual compartilhamos os links de postagens de rifas automotivas e questionamos se elas infringem os termos de uso da plataforma.
"Qualquer usuário que acredite ter encontrado uma violação de nossas políticas pode fazer uma denúncia e nossa equipe fará a análise do vídeo", diz a empresa.
"Quando não há violação à política de uso do produto, a decisão final sobre a necessidade de remoção do conteúdo cabe ao Poder Judiciário, de acordo com o que estabelece o Marco Civil da Internet", complementa.
Também fizemos os mesmos questionamentos ao Facebook e ao Instagram e ambas empresas preferiram não se manifestar.
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