Taxista, Uber e motoboy poderão ter até 78 pontos em multas sem perder CNH
O Projeto de Lei 3.267/2019, entregue há cerca de um ano pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso, passou com alterações pela Câmara dos Deputados na semana retrasada e aguarda envio ao Senado para votação.
A proposta prevê flexibilizações no CTB (Código de Trânsito Brasileiro), incluindo alteração no Artigo 261 que eleva de 20 para 40 pontos, a cada 12 meses, o limite para que a CNH (Carteira Nacional de Habilitação) seja suspensa.
O texto aprovado pelos deputados estabeleceu uma escala: 40 pontos para quem não tiver infração gravíssima; 30 para condutores com uma infração gravíssima; e 20 para motoristas que tiverem duas ou mais multas com essa graduação.
No caso de motoristas profissionais, o limite ficou em 40 pontos, independentemente da gravidade das multas.
Essa não é a única vantagem prevista para condutores remunerados.
Hoje, cidadãos que utilizam o veículo para trabalhar têm o direito de zerar o prontuário ao atingirem 14 pontos e não ultrapassarem 19. A condição é participar de curso de reciclagem preventiva, válido por um ano. Além disso, atualmente a vantagem só vale para motoristas de categoria C, D ou E, cuja CNH traga a observação EAR (exerce atividade remunerada).
Com o PL, o benefício é ampliado para condutores EAR de todas as categorias. Além disso, a pontuação para fazer o curso sobe de 14 para 30 pontos. Caso siga a lógica atual, motoristas remunerados terão a chance de zerar a habilitação com até 39 pontos.
A ampliação contempla profissionais habilitados na categoria A, como motoboys, além de taxistas e motoristas de aplicativo com CNH da categoria B - hoje nenhum deles tem direito a requerer o curso de reciclagem.
Na prática, a nova regra abre a possibilidade de que o condutor profissional atinja 39 pontos, faça o curso, zere o prontuário e posteriormente acumule mais 39 nos 12 meses seguintes - sem que a respectiva habilitação seja suspensa.
Ou seja: na somatória, o PL dá a chance de chegar a 78 pontos no mesmo ano, mantendo-se o direito de dirigir.
'PL evita demissão de motorista com CNH suspensa'
Segundo Marco Fabrício Vieira, conselheiro do Cetran-SP (Conselho Estadual de Trânsito de São Paulo) e autor do livro "Gestão Municipal de Trânsito", mesmo que o novo texto do Artigo 261 passe como está pelo Senado, ainda será necessário modificar a Resolução 723 do Contran (Conselho Nacional de Trânsito).
Isso porque a resolução ainda traz o limite atual de 14 a 19 pontos para solicitar o curso de reciclagem.
Na avaliação de Vieira, as novidades são positivas.
"O PL beneficiará milhares de motoristas profissionais, que estão mais suscetíveis a cometer infrações de trânsito. Trabalhadores cujo direito de dirigir é suspenso ou cassado podem ser demitidos por justa causa, uma vez que a condição essencial do respectivo contrato de trabalho desaparece", pontua o especialista.
Vieira lembra que "as empresas são obrigadas a indicar o condutor infrator para não sofrerem multa por não indicação do condutor, a chamada multa NIC".
Julyver Modesto, mestre em Direito do Estado pela PUC-SP, que atua como consultor e professor de legislação de trânsito, faz avaliação diferente.
'Não adianta punição se ela não é aplicada'
"As mudanças propostas são péssimas para a segurança viária. De nada vale existir a punição se ela nunca ou quase nunca for aplicada", opina Modesto, que também é conselheiro do Cetran-SP.
De acordo com ele, muitos Detrans (Departamentos Estaduais de Trânsito) simplesmente não instauram o processo de suspensão do direito de dirigir.
"Há que se considerar que a própria suspensão do direito de dirigir só faz sentido se os Detrans instaurarem o processo e as pessoas, efetivamente, cumprirem a suspensão e isso for fiscalizado. Existe toda uma engrenagem que, muitas vezes, é incompleta. Há Estados nos quais simplesmente não há instauração de processo. Nestes, pouco importa se o condutor tem 20, 40 ou cem pontos no prontuário", critica.
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