Desmanches: como adquirir peças de outros carros sem comprar algo roubado
Em vigor desde 1º de julho de 2014 no Estado de São Paulo, a Lei 15.276, mais conhecida como "Lei do Desmanche", foi implementada para controlar a atividade de depósitos, oficinas e empresas especializadas no comércio de peças retiradas de outros veículos.
A iniciativa, que regulamenta lei federal de mesmo teor, busca reduzir a incidência de furtos e roubos de automóveis e motocicletas para desmontagem e abastecimento do mercado ilegal de componentes veiculares usados.
Dentre outras coisas, a lei determina que as empresas sejam cadastradas anualmente no Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo) e na Secretaria da Fazenda e Planejamento do governo paulista.
Além disso, todas as peças comercializadas têm de trazer um adesivo dotado de QR Code, o código bidimensional que possibilita o respectivo rastreio - ou seja, dá para identificar o tipo, a marca, o modelo e o ano do veículo de onde foi retirada.
O código, que pode ser lido por meio de aplicativos de QR Code, incluindo o programa do próprio Detran-SP, permite identificar a empresa responsável pela desmontagem e comércio da peça. Também dá para ter acesso a fotos do carro ou da motocicleta, quando estão disponíveis.
Todo o processo, incluindo a movimentação do estoque e e emissão de notas fiscais, pode ser monitorado. As empresas flagradas desrespeitando as regras são impedidas de seguir atuando no setor, informa o departamento estadual.
Vale destacar que a legislação não permite o comércio de qualquer tipo de componente: itens de segurança como airbags, ABS e sistema de freios não podem ser vendidos após sua remoção de outro veículo.
Estes devem ser encaminhados para remanufatura ou reciclagem, mesmo que ainda estejam operacionais.
Queda em roubos e furtos
Segundo estatísticas disponibilizadas pela Secretaria da Segurança Pública de São Paulo no seu respectivo site, em 2013, ano imediatamente anterior à implantação da nova lei, o total de roubos e furtos foi de 877,48 unidades a cada 100 mil veículos. Em 2019, com a legislação já em vigor, o montante foi de 457,11 por 100 mil - uma redução de 47,9%.
Esses números não são acompanhados de uma análise sobre as causas dessa diminuição, porém uma seguradora consultada por UOL Carros diz que a Lei do Desmanche contribuiu para a diminuição.
Ao mesmo tempo, o delegado Marcio Martins Mathias, titular da 3ª Divecar, a delegacia responsável pela investigação de desmanches ilegais na capital e na Grande São Paulo, afirma que têm sido realizadas "vistorias sistemáticas e diárias" em estabelecimentos de comércio de peças de segunda mão.
De acordo com ele, são mais de cem inspeções a cada mês.
"Toda a empresa do ramo tem de apresentar CNPJ aberto, alvará de funcionamento e cadastro no Detran-SP. Com o amparo da lei, somente no mês passado, mais de dez comércios do tipo foram fechados por conta da venda de peças provenientes de crime, com prisão em flagrante dos responsáveis por receptação qualificada. Esse crime tem pena de três a oito anos de reclusão".
Por meio de nota, o Detran-SP informa que "realiza fiscalizações periódicas em desmontes credenciados suspeitos de venda clandestina de peças usadas. As ações também ocorrem em conjunto com os órgãos policiais do Estado de São Paulo".
"Atualmente, tramitam processos administrativos sujeitos a sanções e multas instaurados", complementa.
Como funciona um desmanche legalizado
UOL Carros também conversou com a Porto Seguro para mostrar como funciona um desmanche legalizado. A seguradora criou em 2013 a Renova Ecopeças, companhia especializada em desmontar e reciclar veículos provenientes de sinistros.
Com base na cidade de São Paulo, a empresa também comercializa as peças retiradas desses automóveis - seguindo as normas e os procedimentos estabelecidos pela legislação.
David Pereira, gerente de negócios da Renova, informa que até hoje a iniciativa já desmontou e deu a destinação adequada aos componentes de mais de 16 mil carros sinistrados.
"A Lei do Desmanche, de fato, fez as taxas de roubos e furtos diminuírem. Dentro desse contexto, a intenção da Renova, mais do que ser um negócio extremamente rentável, é promover a responsabilidade social e ambiental relativa à destinação correta dos resíduos", diz o executivo.
O outro objetivo destacado por Pereira é, segundo ele, "conscientizar" o consumidor.
"Buscamos criar uma cultura no cliente, pois a escolha é dele. Tentamos passar a ideia de que, ao comprar de desmanches não credenciados, ele está contribuindo com um mercado de roubos e furtos. Mesmo pagando muito menos por determinada peça, ele se torna parte de um mercado alternativo e, futuramente, seu próprio carro poderá ser roubado para abastecer esse mercado".
De acordo com o gerente, a matéria-prima da Renova são os veículos "irrecuperáveis", cuja documentação é baixada no Detran e se tornam um "amontoado de peças".
Essa avaliação é realizada por perito credenciado no Departamento Estadual de Trânsito.
Após a chegada do carro, explica, ele passa por um "estande de descontaminação", onde são removidos todos os fluidos, como óleo, combustível e outros, acondicionados em tanques específicos para cada tipo de produto e adotando procedimentos para evitar a contaminação do solo.
Esses fluidos são encaminhados para empresas especializadas no respectivo descarte - mais de 56 mil litros de óleo já foram retirados e destinados, afirma a Porto Seguro.
Após essa etapa, começa a desmontagem.
"Registramos o veículo e informamos os componentes que serão recuperados ao Detran, que envia o QR Code a ser fixado em cada peça. Trata-se de uma etiqueta que não pode ser removida, pois ela é destruída se houver a tentativa", esclarece.
Itens como bancos, faróis, lanternas, sistema de som, painel e lataria são retirados, registrados e devidamente etiquetados.
Chassi e outras partes metálicas não aproveitáveis têm borrachas e peças plásticas removidas antes de serem compactados para posterior venda como sucata.
As peças reutilizáveis são comercializadas presencialmente no balcão da Renova ou por meio de sites de classificados parceiros, informa Pereira.
Com algumas exceções, como partes da lataria, os componentes são comercializados com garantia de três a seis meses.
"Os veículos que a Renova não consegue processar são leiloados e apenas desmontadoras credenciadas podem participar do pregão".
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