Stellantis: como Fiat deve 'absorver' carros de Peugeot e Citröen no Brasil
Em geral, os fortes subjugam os fracos, seja em uma luta ou no mercado. E o panorama para a fusão da Stellantis, apesar do clima amistoso no discurso inicial do novo CEO, Carlos Tavares, deve ser este. Falamos com consultores, fontes de mercado e concessionários para entender o que deverá acontecer com as marcas da Stellantis no Brasil.
Com uma parcela considerável do mercado brasileiro, capilaridade da rede de concessionários e marca já solidificada, a Fiat é quem deve comandar as atividades por aqui, diz um executivo do setor. "Diferentemente do que irá ocorrer em outros mercados onde as marcas da PSA são mais bem posicionadas, aqui a Fiat é quem dará as cartas".
Para reforçar a informação basta buscar os dados da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores). Em 2020, que foi um ano atípico por causa da pandemia, a Fiat fechou em 3º lugar com 16,5% do mercado. Peugeot e Citroën ficaram respectivamente com as 13ª e 14ª posições, com 0,69%. Se contabilizarmos a Jeep na queda de braços para o "time FCA", ela fechou em 8º 5,6% do mercado.
PSA virará "divisão" da FCA no Brasil
Os concessionários Fiat adotarão com as marcas Peugeot e Citroën a mesma estratégia que alguns tiveram com a Jeep, especialmente em cidades do interior. Eles criarão um "espaço" dentro da própria concessionária para aumentar os pontos de venda e tentar alavancar a penetração das marcas francesas. "Concessionários vão receber um reembolso pelos investimentos que precisarão ser realizados", diz um executivo que aceitou falar na condição de anonimato.
Questionado se as marcas francesas serão descontinuadas no Brasil, ele discorda. "A Ford acabou de mostrar que abandonar a operação é custoso demais. A Stellantis terá que descobrir o que fazer com tanta fábrica, mas não pode fechar a planta de Porto Real (RJ) porque ela surgiu com incentivos tributários". Além de Porto Real (RJ), que vem da PSA, há as fábricas de Betim (MG), Goiana (PE) e Campo Largo (PR).
Em condição de anonimato, uma fonte interna diz que as mudanças já estão acontecendo. Uma delas é que os altos executivos já estão de malas prontas para retornarem ou serem expatriados à França. As equipes administrativas da PSA serão integradas no prédio corporativo da FCA em São Paulo e o pós-venda também será englobado pelas equipes da marca italiana.
"Rebadge" não deve acontecer, mas comerciais são exceção
Tanto pessoas do setor quanto consultores dizem que a Stellantis não deve apostar em rebadge (trocar o logotipo da marca sem alterar o carro), nem de produtos FCA para PSA ou vice-versa. A Fiat já teve uma experiência pouco frutífera com isso quando vendeu o Dodge Journey como Fiat Freemont. Além de valor fora do padrão dos carros da marca, trocou o motor V6 por um quatro cilindros que deixou o desempenho aquém do esperado.
A Stellantis revisitará uma antiga parceria. PSA e Fiat já trabalharam com uma joint-venture no Brasil até 2016. Aqui, na fábrica da Iveco em Sete Lagoas (MG), os furgões Jumper e Boxer de Citroën e Peugeot, eram na verdade o Fiat Ducato com um novo símbolo. Agora a lógica deve se inverter.
A linha de comerciais da PSA é mais completa que a da Fiat. Tem, além dos furgões supracitados, importados da Itália, modelos menores, como o Jumpy e o Expert, que são produzidos no Uruguai. E, dessa vez, a Fiat é quem deve ofertar a linha de vans franceses com seu logo, aproveitando sua rede maior e o mailing do consumidor comprador de Fiorino e Doblò Cargo.
FCA pode recriar confiança do cliente PSA
Por mais que tudo pareça fazer com que a parte FCA engolirá a PSA no Brasil dentro da Stellantis, o consultor da ADK Automotive, Paulo Roberto Garbossa, vê boas possibilidades também. "A confiança que o brasileiro em geral tem na Fiat e agora também na Jeep pode fazer com que veja com bons olhos Peugeot e Citroën", diz.
Garbossa complementa que o pós-venda melhor estruturado que a Fiat tem e com expertise do consumidor brasileiro em pontos que a PSA às vezes não chega pode servir como impulso. "O cliente vai pensar: se eu comprar um Peugeot posso fazer a revisão ou procurar o que preciso em uma concessionária Fiat. Dá mais segurança ao cliente", complementa.
A observação do consultor faz ligação com a informação dada por outra fonte de que as concessionárias Fiat devem ter um "puxadinho" para modelos da PSA, especialmente em áreas onde não há revendas das marcas francesas. Essa forma de sinergia pode facilitar tanto a venda, o pós-venda e também o giro do modelo quando usado no mercado.
Garbossa sacramenta com um exemplo recente do mercado nacional: "É só olhar o que aconteceu com a Chery quando passou a ser vendida como Caoa Chery. Os mesmos produtos, caso viessem só com a marca chinesa, não teriam a mesma confiabilidade e receptividade no mercado que ganharam nessa segunda fase".
Segundo dados da Fenabrave, a Caoa Chery fechou o ano de 2020, mesmo com a pandemia, com participação de 1% do mercado. Isso representa 20.089 exemplares emplacados. Isso a deixou duas posições à frente da Peugeot e três da Citroën.
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