Por que carros 'populares' nos EUA viram modelos de luxo no Brasil
Apesar da crescente preferência dos brasileiros por SUVs, a lista dos automóveis mais vendidos do País ainda é dominada por modelos pequenos e mais baratos.
Já nos Estados Unidos o cenário é bem diferente: a relação dos "campeões" traz veículos de maior porte, muitos dos quais são comercializados aqui com preço e em quantidades compatíveis com carros de luxo.
Tomemos como exemplo o Honda CR-V, quinto automóvel em volume de vendas nos EUA ao longo do ano passado. Em 2020, o SUV acumulou mais de 333 mil unidades vendidas naquele mercado, onde hoje tem preço inicial de US$ 25.350 (cerca de R$ 125.890 na conversão direta).
A título de comparação, no mesmo período o CR-V somou apenas 382 vendas no Brasil - aqui, ele atualmente está disponível apenas na versão Touring, com preço sugerido de R$ 264,9 mil.
Vale ressaltar que em nosso País só é oferecida a configuração mais completa e o dólar ainda está nas alturas - fatores que não favorecem uma comparação equilibrada. Mesmo assim, é fato que veículos maiores, mais caros e sofisticados, são os "populares" dos norte-americanos - enquanto aqui o predomínio ainda é de hatches pequenos e mais simples.
Automóveis novos que no Brasil conferem ao dono uma boa dose de status, como o Toyota Corolla, são carros "de entrada" nos Estados Unidos. Em 2020, a sedã médio ocupou o 11º lugar do ranking norte-americano, somando 237.178 unidades vendidas. Aqui, ficou na 15ª posição, com pouco mais de 41 mil vendas.
Mas o que explica tamanha discrepância? Para esclarecer a questão, UOL Carros conversou com Flavio Padovan, ex-executivo de montadoras como Ford, Jaguar Land Rover e Volkswagen, atualmente sócio da consultoria MRD Consulting.
Padovan aponta que as causas são econômicas e também culturais. Confira as quatro mais relevantes.
1 - Mercado norte-americano é muito maior
"O tamanho e a segmentação do mercado automotivo dos EUA são muito diferentes na comparação com o brasileiro. Apenas mais recentemente, os norte-americanos passaram a aceitar modelos de menor porte e mais econômicos", destaca o especialista.
De fato, são realidades muito distintas: no ano passado, os Estados Unidos venderam 14,5 milhões de carros de passeio e comerciais leves, ante pouco mais de 2 milhões de unidades no Brasil.
Trata-se de um mercado sete vezes maior do que o nosso. Com mais escala, a tendência natural é de queda nos custos - e, consequentemente, nos preços ao consumidor.
Padovan destaca, ainda, o maior poder aquisitivo do norte-americano médio, remunerado em dólares.
2 - EUA preferem leasing
Outro fator que torna veículos mais acessíveis em uma das maiores economias do planeta, diz o consultor, é a preferência pelo leasing - sistema semelhante a um aluguel, no qual o cliente paga pela depreciação do automóvel durante o tempo de uso - e troca o carro após determinado período, sem nunca, de fato, ser proprietário.
"Enquanto no Brasil o consumidor ainda faz questão da posse do automóvel, nos EUA o sistema de leasing é muito mais comum do que a compra. Por um baixo custo mensal, você usufrui do carro e pode incluir custos relacionados à manutenção".
Flavio Padovan admite que aqui o leasing nunca decolou e aponta uma das principais razões, além da cultural: a taxa de juros cobrada no Brasil é muito mais alta, o que inviabiliza financeiramente a modalidade.
Por outro lado, aponta o consultor, vagarosamente o sistema de assinatura de carros começa a dar os primeiros passos no Brasil, especialmente na categoria de luxo.
3 - Custo Brasil
Fatores como elevada e complexa carga tributária e custos maiores relacionados à logística, na comparação com os Estados Unidos, ajudam a explicar o alto preço de veículos praticado em nosso País - afirma a Anfavea, a associação das montadoras.
Especificamente no que se refere a impostos, a entidade cita estudo da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), mostrando que 1,2% do faturamento industrial (R$ 37 bilhões por ano) é gasto apenas para se calcular e processar tributos.
O mesmo levantamento indica que no setor automotivo o gasto é de R$ 2,3 bilhões por ano.
A falta de competitividade também é verificada ante mercados como o mexicano, país com o qual o Brasil tem acordo de livre comércio automotivo e que produz uma parcela considerável de veículos comercializados nos EUA.
A associação cita comparativo da competitividade Brasil x México produzido pela consultoria PwC, segundo o qual a diferença final de custo pode chegar a 44%, aplicando-se os impostos de cada país.
4 - Dependência maior de peças importadas
Embora as fabricantes de carros não divulguem percentuais referentes à nacionalização de carros produzidos no Brasil, o índice ainda é baixo se for comparado com o dos Estados Unidos, diz Padovan.
Com isso, além de ficar mais sujeito à flutuação do dólar para importar peças e insumos como aço, nosso país ainda encarece esses itens devido à elevada tributação ao trazê-los de fora.
"Falta uma política governamental no Brasil para incentivar a industrialização do País e manter as fábricas operando aqui", avalia.
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