Tudo decorria como sempre numa segunda-feira: leve mau humor ao despertar, o planejamento da semana e aquela mistura de falta de coragem com má vontade de pegar no tranco, porque afinal é segunda-feira, o dia mundial da velocidade baixa. Jamais imaginaria o convite que chegou ao fim do dia: pilotar um carro da Mitsubishi Cup.
Pois no sábado seguinte, como combinado, fui até Mogi Guaçu, onde fica o Autódromo Velocitta e a Mitsubishi, a alguns metros da pista, montou acampamento para a segunda etapa do evento.
"A Mitsubishi Cup é o maior e mais tradicional rally monomarca cross country de velocidade da America Latina Brasil. Muito mais que uma competição, a Mitsubishi Cup é um estilo de vida. A confraternização e a troca de experiências entre amantes de velocidade e do off road, formam o espírito da competição", me explica Letícia Mesquita, diretora de marketing da Mitsubishi.
Realizada desde 2000, a Mit Cup amarra o etos aventureiro aos regulamentos estabelecidos pela Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) e os veículos são produzidos pela montadora exclusivamente para a copa - somam-se 580 exemplares até hoje, segundo a marca.
Esta 22ª temporada contará com sete etapas e 21 provas nas cidades de Ribeirão Preto, Jaguariúna, Iracemápolis e Cordeirópolis, além de Mogi Guaçu. Os participantes serão divididos em sete categorias de acordo com o veículo e o nível de experiência em competições do gênero: Outlander Sport R, Outlander Sport R Pró, L200 Triton ER, L200 Triton ER Pró, L200 Triton Sport R, L200 Triton Sport R Pró e L200 Triton Sport RS.
Não é preciso ter experiência com carros de rali. Mas, como sugestão, recomenda-se aos virgens no assunto o MitCupExperience. "Os participantes passarão por uma experiência completa que contempla um treino exclusivo com o piloto pentacampeão Guiga Spinelli, cujo time providencia para uso na etapa, além de um Outlander Sport R, também capacete, sapatilhas, macacão e um navegador profissional para acompanhar o piloto. É o que chamamos de esquema "sit and drive", detalha Letícia.
Perambulando pelo circo da Mit Cup, percebe-se um clima de comunidade. Equipes e pilotos se enfrentam diante do cronômetro, mas por que não emprestar para o time vizinho aquele martelo que se perdeu ou o remendo de pneu que foi esquecido?
Há quem se junte ao entourage com toda a família. No bagageiro do SUV ou na caçamba da picape, bicicletas para as crianças se divertirem enquanto papai brinca com algo muito maior, mais rápido, e mais caro.
"O MitCupExperience custa aproximadamente R$ 17 mil por participante. Para a temporada toda, os custos podem variar bastante e dependem de alguns fatores como se o competidor usa um carro próprio ou alugado, categoria, quantidade de peças de reposição à disposição, etc. Mas, geralmente a compra do carro de competição sai por volta de R$ 250 mil e a contratação de uma equipe, em torno de R$ 12 a 15 mil por etapa", detalha Letícia.
Rodar, sim. Capotar, nunca
Vesti toda a indumentária e me contorcionei para driblar o santantônio e entrar na L200 Triton Sport RS que até meu nome na lateral tinha. Lá dentro, chamam atenção o equipamento do navegador, pelo tamanho, e o ar-condicionado digital, pela presença. Painel também é o mesmo da picape. Mas bancos e volantes são de competição. No lugar dos vidros, uma pequena janela em acrílico que pode ter uma pequena fresta aberta.
Lá dentro, pressionado entre o cinto de segurança de quatro pontos e ao banco, quase sem movimento da cintura pra cima, confesso que me questionei: "o que estou fazendo aqui? Posso perder o controle num salto, escorregar demais numa curva e capotar, não perceber o quão rápido estou na reta e passar reto em algum desvio. Além do vexame, terei de lidar com o prejuízo de quebrar o brinquedo dos caras. A Mitsubishi numa mais vai me chamar pra nada".
Contudo, no deslocamento até a pista percebi que a L200 era até que dócil. O câmbio tem engates macios, parecido com o do modelo de rua. A aceleração é rápida, mas pode ser dosada sem sustos. O motor 2.4 turbodiesel gera 225 cavalos de potência e 51,2 kgfm de torque.
A hora da verdade, enfim, chegou. Alinhado no ponto de partida, aguardo ansiosamente os 60 segundos que separam a mobilidade da arrancada. Lembro, então, do que me dissera meu copiloto horas antes: "cada coisa que eu te digo é uma decisão que eu tomei. Então, é uma sequência de decisões a cada instante, o que te demanda bastante e te carrega de adrenalina", avisa Humberto Ribeiro
Além de 10 temporadas da Mit Cup, Ribeiro tem no currículo 16 participações no Rally dos Sertões, uma no Mint 400, nos EUA, e uma no Marrocos Desert Challenge, além de vários títulos. Navegador não me faltava.
Na hora não saquei tão bem, mas depois da primeira curva comecei a entender: ao mesmo tempo em que processa que em 300 metros haverá uma curva de 90 graus à esquerda, o piloto ainda tem que lidar com as reações do carro, que parece flutuar a 100 km/h sobre areia e pedregulhos numa reta levemente inclinada. Corrige a traseira daqui, dali, e já não são mais 300 metros, e sim 200, logo menos 100 e 50.
O câmbio aceita bem os castigos. Em cerca de trinta minutos de trocas incessantes, que não passam da terceira, jamais rejeitou mesmo as reduções mais bruscas.
Quanto aos freios, foram capazes de segurar as duas toneladas da picape. Mas, mesmo assim, em um dos trechos, reduzindo de uns 80 km/h (não há muita chance de tirar os olhos da pista e dar atenção ao velocímetro) para entrar na curva à direita, abusei do pedal do meio, a traseira levantou e, na tentativa e aproveitar o embalo de uma saída de traseira e já pegar a curva no ângulo certo, rodei. Foi um susto, mas também foi divertido.
Depois de sacolejar, virar, acelerar, frear, saltar e suar, devolvi o carro inteiro. E saí dele esperando o próximo convite para pilotar um bicho desse de novo.
Mesmo que o convite venha numa segunda-feira modorrenta.
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