'Mulher da Casa Abandonada': pai fez único pedido sobre Voyage que era xodó

O Volkswagen Voyage que apodrece há décadas em Higienópolis, na capital paulista, nos fundos da casa de Margarida Maria Bonetti, a "Mulher da Casa Abandonada", era xodó do pai dela - o médico Geraldo Vicente de Azevedo, morto em outubro de 1998, aos 91 anos.

Isso não impediu o carro de ser desprezado por Margarida e suas duas irmãs, que até hoje disputam na Justiça uma herança milionária que inclui vários imóveis, pratarias, esculturas e uma coleção de joias. Maria de Lourdes Danso Vicente de Azevedo, viúva de Geraldo e mãe das três mulheres, ficou com metade do patrimônio até falecer em 2011, aos 97 anos.

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Acusada de ter escravizado uma funcionária quando morava nos Estados Unidos, Bonetti virou tema de podcast da "Folha de S.Paulo" comandado pelo jornalista Chico Felitti, que viralizou nas redes sociais.

UOL Carros teve acesso aos inventários do casal, que apontam o velho Voyage GL 1988/1989 como o único veículo deixado por Geraldo às suas herdeiras. Segundo o inventário, ao menos entre 1992 e meados de 2007 o sedã ficou parado na deteriorada mansão de Higienópolis, e o desejo do antigo dono era deixá-lo "intocado" - aparentemente, o pedido foi atendido, mas sem evitar a decadência do VW, hoje coberto por sujeira e com os pneus arriados.

Um automóvel para passageiros, nacional, modelo Voyage, marca Volkswagen, ano 1988, placa YG8879, estando desativado desde 1992, quando o falecido parou de dirigir o mesmo, deixando sem movimentar o veículo; o desejo do Dr. Geraldo era deixar o automóvel na garagem intocado, e lá ficou até os dias de hoje".

Assim é descrito o sedã no documento, em trecho de junho de 2007 assinado pela viúva. Alguns meses mais tarde, em janeiro do ano seguinte, a descrição do Voyage é atualizada, afirmando que na ocasião o carro estava "em péssimas condições" e tinha valor de apenas R$ 2.000 - menos de 1/3 do preço médio de R$ 7.365 informado pela Tabela Fipe para o modelo naquela data.

Os inventários não apontam nenhuma disputa das irmãs três pelo Volkswagen, embora petição de junho de 2008, protocolada em nome da primogênita Maria de Lourdes Vicente de Azevedo Tarnoczy, tenha questionado a estimativa de preço e também a alegação de que o automóvel estaria mal conservado.

"Foi apresentado aos autos o documento de transferência do carro, mas não o seu licenciamento atualizado, ou comprovação de seu valor de mercado, bem como não foram apresentadas as razões de estar o bem "em péssimas condições"".

Os documentos aos quais nossa reportagem teve acesso também revelam detalhes do conflito entre as irmãs nas discussões sobre a partilha dos bens, antes e depois de a mãe delas morrer.

"VW não era carro de pessoas ricas'

Trecho do inventário com data de agosto de 2011, pouco depois da morte de Maria de Lourdes Danso Vicente de Azevedo, menciona os carros do médico Geraldo.

Rosa Maria Danso Vicente de Azevedo Mesa Campos, a filha do meio, cita os veículos para sustentar que os pais não eram pessoas ricas e contestar alegação da irmã mais velha, Maria de Lourdes Tarnoczy, que sustentava o contrário.

Na época, as irmãs mais novas estavam em litígio com a primogênita.

"Ele não era rico de forma alguma! (...) Muito pelo contrário ele era o irmão pobre, dos 3 irmãos; (...) Então, 1°) comparando-se com as amigas, as filhas não tinham roupas para variar; 2°) As casas delas eram sempre bem pintadas, bonitas, e a casa das 3 irmãs não era; 3°) Os carros dos pais delas eram novos, mas em geral o carro de Dr. Geraldo não era, a menos quando ele comprava, mas era "o Fusca" Volkswagen, que não era carro de pessoas ricas", alega Rosa Maria.

Segundo um porteiro de prédio vizinho, Geraldo teve modelos como Ford Belina, Volkswagen Brasília e, por fim, o Voyage bege.

Voyage pode estar parado há 30 anos

Por falar no Voyage, o CRV (Certificado de Registro de Veículo) do sedã, com data de 23 de outubro de 1989, informa que Geraldo Vicente de Azevedo adquiriu o veículo da concessionária Samambaia Veículos, indicando que o médico pode ter comprado o VW zero-quilômetro.

Se ele, de fato, deixou de dirigi-lo em 1992, como afirma o inventário, já são 30 anos de inatividade.

Também são grandes as chances de o automóvel ter baixíssima quilometragem, considerando que seu dono já era idoso e, segundo vizinhos, não fazia grandes deslocamentos com o carro.

"A edícula tem o carro que é um Voyage que era do pai dela [Margarida Bonetti]. Até os meninos falavam que ele comprou esse Voyage bem novinho na época e saiu pouquíssimas vezes com esse carro", disse ao podcast "A Mulher da Casa Abandonada" Francisco, que é zelador de um prédio nos arredores.

Antônio Francisco da Silva, porteiro de um condomínio ao lado, também falou ao podcast da "Folha" sobre o sedã.

"Eu acho que eu entrei uma vez [na casa de Higienópolis] só para ajudar o pai dela. Ela não morava aí não. Porque eu ajudava muito o pai dela. Ele não conseguia engatar a ré da Brasília que ele tinha e aí eu tirava para ele, que ele não conseguia mais. Aí ele saía aqui e andava só na primeira, acelerado, acelerado, um fumaceiro. Era um barato. Depois, ele vendeu essa Brasília e comprou um Voyage e esse Voyage está aí até hoje. Um Voyage bege".

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