Carro elétrico: por que culpa de recarga lenta nem sempre é do carregador

A transição para veículos elétricos é uma realidade cada vez mais presente no cenário automotivo global, e com ela surgem novos desafios e mal-entendidos. Um dos equívocos mais comuns é a percepção de que todos esses carros podem ser recarregados rapidamente, simplesmente utilizando um carregador de alta velocidade.

Muitos usuários acham que é só colocar o carro elétrico em um carregador mais rápido que ele carregará em minutos, mas não é bem assim. A realidade é mais complexa e envolve uma série de fatores técnicos que influenciam a velocidade de recarga.

Motivos para carregamento lento

A capacidade de recarga de um veículo elétrico está intrinsecamente ligada ao seu sistema de bateria. As baterias de íon de lítio, utilizadas na maioria dos veículos elétricos, são compostas por células que armazenam energia elétrica.

A velocidade com que essa energia pode ser reposta depende não só da potência do carregador, mas também da capacidade das células de receberem essa carga. Assim, mesmo que um carregador ofereça uma potência elevada, se a bateria do veículo não for projetada para suportar essa entrada de energia, o processo de recarga não será acelerado.

A arquitetura eletrônica do veículo desempenha um papel crucial. O inversor, um componente que converte a corrente alternada (CA) da rede elétrica em corrente contínua (CC) utilizável pela bateria, precisa ser capaz de processar altas potências para que a recarga rápida seja possível. Em muitos casos, os veículos elétricos possuem inversores com capacidades limitadas, o que restringe a velocidade de recarga, independentemente da potência do carregador externo.

O processo é mesmíssimo igual a um carregador ultra rápido de celular. Estamos ainda no jardim de infância desse assunto, o que faz um carregador de 150 kw não deixar entrar uma carga superior a por exemplo 50 kw/h é porque as baterias de alguns carros não suportam, para não estressar muito. Todo carro tem um BMS (Battery Management System), que gerencia as melhores condições de entrada da carga. Eu diria que estão ficando preparadas para o turbo carregamento, com velocidade e durabilidade Carlos Augusto Roma, diretor-técnico da ABVE

"Em menos de cinco anos, iremos conseguir carregar de 20% a 80% da bateria em até 10 minutos, para todos os carros. Vamos nos aproximar do que é hoje o tempo que se leva para abastecer um carro com combustível. E se tiver fila para recarga, o custo do kw/h será mais caro para carregar acima dos 80% até 100%", segundo Roma.

Outro ponto a considerar, segundo Roma, é o fenômeno conhecido como "balanceamento de células". Durante a recarga, as células da bateria devem atingir níveis de carga semelhantes para manter a eficiência e a longevidade da bateria. Esse processo é mais lento e geralmente ocorre nos estágios finais da recarga, o que explica por que muitos veículos elétricos carregam rapidamente até cerca de 80% de sua capacidade, mas demoram mais para alcançar a carga completa.

Em cada modelo diferente de EV, as limitações de software e bateria controlam a rapidez com que o carro pode carregar. A velocidade de carga também depende da temperatura, do estado de carga e até mesmo da idade da bateria. A classificação em quilowatts (kW) de um carregador rápido controla a velocidade com que um veículo elétrico pode ser carregado nele.

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É importante que os consumidores entendam que a recarga rápida é uma ferramenta útil para viagens longas ou quando se precisa de um "reabastecimento" rápido. No entanto, para o uso diário, a recarga em casa ou no trabalho, utilizando carregadores de menor potência, costuma ser suficiente e mais benéfica para a saúde da bateria a longo prazo, além de ser muito mais eficiente em custo Ayrton Barros, diretor-geral da Neocharge

A temperatura ambiente também afeta a velocidade de recarga. Condições climáticas extremas, seja muito calor ou muito frio, podem reduzir a eficiência da recarga, pois as reações químicas dentro das células da bateria são sensíveis à temperatura. Isso significa que, em dias muito frios ou muito quentes, os usuários podem experimentar tempos de recarga mais longos, quer seja no calor intenso do Rio de Janeiro ou mesmo num frio intenso de Chicago.

Além dos aspectos técnicos, há considerações práticas e econômicas. A infraestrutura de recarga ainda está em desenvolvimento, e muitas regiões carecem de carregadores de alta velocidade. Mesmo onde eles estão disponíveis, o custo da recarga rápida pode ser proibitivo, levando os usuários a optar por soluções mais lentas e econômicas.

Diante desses fatores, é claro que a velocidade de recarga de um veículo elétrico não depende apenas da potência do carregador. A complexidade do sistema de bateria, a eletrônica do veículo, as condições ambientais e a infraestrutura disponível são todos elementos que influenciam o tempo necessário para recarregar completamente um veículo elétrico.

Ana Kira, gerente de estratégia para mobilidade elétrica na Raízen Shell Recharge, afirma que a a principal consideração é a potência disponível para cada tipo de carregador. Os carregadores AC geralmente oferecem até 22 kW, embora a maioria dos veículos carregue apenas até 7.4 kW. Já para os carregadores DC têm potência que varia entre 24 e 350 kW no Brasil - os modelos de veículos no país suportam em sua maioria potência inferior a 150 kW, conforme especificado tecnicamente por cada veículo - o que é fundamental para entendimento da potência de carregamento necessária.

O carregamento por conveniência, encontrado em locais como supermercados, shoppings e academias, muitas vezes se alinha melhor com o tempo de permanecia dos consumidores nesses locais. Por outro lado, o carregamento rápido em DC é importante em viagens longas e quando se tem necessidade de autonomia, por isso sua oferta deve ocorrer em postos de recarga e nas principais rodovias do Brasil Ana Kira

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O que está em teste

Os fabricantes de veículos elétricos estão abordando a questão da recarga lenta com uma série de estratégias inovadoras e melhorias tecnológicas. Um estudo recente da Recurring Auto analisou cerca de 13 mil veículos Tesla e descobriu que a taxa de degradação da bateria é semelhante entre os carros que utilizam predominantemente carregamento rápido e aqueles que não.

Isso sugere que os sistemas de gestão térmica e de bateria dos veículos elétricos estão se tornando cada vez mais eficientes em proteger as baterias contra danos potenciais do carregamento rápido.

Além disso, a Volvo, em parceria com a Breathe, desenvolveu um novo sistema de recarga que promete aumentar a velocidade de recarga em até 30%, compatível até mesmo com modelos atuais. Isso indica um compromisso contínuo com a melhoria da infraestrutura de recarga e a compatibilidade com a tecnologia existente.

Outras abordagens incluem o desenvolvimento de baterias de estado sólido, que prometem ser mais estáveis e capazes de suportar recargas mais rápidas. Pesquisadores também projetaram protótipos de baterias de lítio que podem recarregar mais de 50% de sua capacidade em apenas três minutos em condições de laboratório, um avanço que poderia revolucionar os tempos de recarga se for bem-sucedido em escala comercial.

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