Pedágio free flow: chip na placa Mercosul poderia evitar cascata de multas?
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Os pedágios sem cancela, conhecidos como 'free flow', ainda têm gerado dúvidas e trazido prejuízo aos motoristas. Falta de sinalização, escassez de informações, cobranças indevidas ou modelos problemáticos são algumas das justificativas apontadas pelos motoristas para a cascata de multas.
Uma solução, em teoria, poderia ajudar: o chip na placa. A Identificação por Radiofrequência (RFID), em que dispositivo se comunica com antenas instaladas nas vias, estava inicialmente previsto para ser instalado nas placas veiculares. No entanto, o modelo ficou de lado na composição final do modelo 'Mercosul', adotado no Brasil em 2020.
Previsto inicialmente com um dos mecanismos de segurança para compor a nova identificação veicular, o item eletrônico "permitiria um controle mais preciso, reduziria a incidência de multas indevidas e garantiria uma cobrança mais justa, promovendo segurança viária e eficiência na fiscalização". É o que defende Danilo Oliveira, presidente do IBDTrânsito.
"Caso a Placa Mercosul tivesse mantido o chip de identificação, haveria um sistema mais eficiente de monitoramento eletrônico, integrando-se diretamente ao free flow e reduzindo as falhas na leitura das placas por OCR", afirma Danilo.
A instalação do chip na Placa de Identificação Veicular (PIV), no entanto, foi derrubada em 2019. A Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), antigo Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), fez diversas alegações à época. O objetivo principal do chip, por sua vez, era ligado à segurança. Segundo o órgao, o intuito era permitir que o automóvel fosse identificado remotamente com segurança, sem a necessidade de uma abordagem pelas equipes de fiscalização.
Porém, técnicos do então Denatran entenderam que não seria possível afirmar assertivamente que uma pessoa não retirou a placa de um veículo e a colocou em outro de mesmas características. Seria necessária uma atuação física e presencial para ter a confirmação plena.
Pagamento? Outro problema
José Luís Rigamonti, advogado especialista em Direito de Trânsito, também não acredita que o chip seria a solução, mas aponta a grande complicação de fato. "Entendo que o free flow é um caso que não seria resolvido [com chip]. Acredito que essa obrigação [de pagamento] permaneceria, já que em momento algum há uma comunicação com o proprietário para a cobrança", aponta Rigamonti.
Com chip ou não, o pagamento ainda dependeria de uma movimentação do motorista. "Imagina uma pessoa que está de férias em viagem e utiliza outras rodovias. E pessoas que não tem acesso à internet. E outras, que não tem familiaridade com internet. E tem aqueles que simplesmente esquecem, com tantas atribulações do dia a dia", completa.
A Senatran diz que a lei do modelo de concessões das rodovias implica na transferência da gestão da infraestrutura e das operações da via para as concessionárias, o que inclui a cobrança de tarifas de pedágio, sempre sob supervisão e regulação das mesmas.
Como e onde pagar são outras complicações porque as estradas são administradas por diferentes concessionárias e não há conexão entre elas. Ou seja, você precisa baixar o aplicativo, se cadastrar com dados do automóvel ou ir até o site específico de cada uma das empresas responsáveis pela rodovia e efetuar o pagamento via Pix ou cartão de crédito.
Vale ressaltar que isso só vale para carros sem tags. Veículos com Sem Parar, Veloe, Conect Car, C6 Tag, entre outros, pagam automaticamente a tarifa.
"Se você for até o Rio de Janeiro (utilizando a Rodovia Dutra e a Ayrton Senna), retornar pela Rio-Santos e subir pela Tamoios, por quantos pedágios free flow terá passado? Quantas concessionárias diferentes nessas rodovias? Quantos sites terá que entrar para pagar o pedágio?", questiona o advogado especialista.
Cascata de multas
Mais de 660 mil multas somente relacionadas a evasão do pedágio eletrônico foram aplicadas no Brasil em 2024, segundo dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Atualmente, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul são os únicos estados brasileiros onde há trechos de rodovias que fazem a cobrança de forma automática, sem a utilização de praças de pedágio. Pórticos instalados na estrada usam câmeras e software de Reconhecimento Óptico de Caracteres (OCR), que 'leem' as placas e fazem a identificação do veículo. Esse sistema é amplamente utilizado para reconhecimento facial, por exemplo.
"A comunicação precisa melhorar nas rodovias que já utilizam essa tecnologia, facilitando ao cidadão a percepção, que naquela via, existe o pedágio eletrônico, que aqueles pórticos são referentes aquele pedágio, e que o cidadão, seja comunicado de forma clara e facilitada das passagens no local", pontua Givaldo Vieira, Presidente da Associação Nacional dos Detrans.
Não pagar dentro do prazo estipulado, que agora é de 30 dias, resulta em uma infração grave, multa de R$ 195,23 e ainda gera cinco pontos na CNH. Danilo Oliveira ainda que a falta de infraestrutura dos pedágios free flow e a quantidade superlativa de multas têm outra implicação.
"A evasão do pedágio não representa um risco direto à segurança viária, mas sim uma questão arrecadatória. O uso dessas infrações para pressionar o pagamento das tarifas levanta preocupações sobre a proporcionalidade da penalidade", afirma o presidente do IBDTrânsito. "A suspensão do direito de dirigir devido a infrações de evasão pode colidir com os princípios de dignidade da pessoa e mobilidade como direito social, exigindo uma reflexão mais profunda sobre a finalidade desse tipo de penalização", finaliza.
O presidente dos Detrans vai além. "É preocupante pois o órgão é responsável por licenciar as multas e também pela defesa das autuações de trânsito. Isso pode desencadear judicialização, se não for implantado essa comunicação mais clara e transparente", finaliza Givaldo Vieira.
Rigamonti projeta uma medida que pode, ao menos, facilitar todo o processo. "No mínimo, teria que ficar unificado em um único site, onde seria possível consultar todos os pedágios e débitos uma única vez. E não em sites esparsos que nem sabemos ao certo qual é", explica. "Precisam implementar uma forma de comunicação com o proprietário. Uma notificação, por exemplo, mesmo que digital", completa Rigamonti.
E é justamente aí que entra a Resolução 1.013/2024 do Contran. Desde outubro do ano passado, novas diretrizes e práticas relativas ao sistema free flow foram designadas para melhorar a experiência do usuário. De acordo com a Senatran, a resolução prevê diversos meios digitais para a visualização das passagens no pedágio free flow e verificação da situação de pagamento.
Uma delas será a Carteira Digital de Trânsito (CDT), usada por mais de 60 milhões de motoristas. A Resolução ainda prevê a possibilidade de disponibilização de pontos físicos para pagamento.
1 comentário
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Zig Luiz Varejão Velloso
Não entendo a razão de tanto problema, já tenho problemas parecidos, com reclamação até na ANTT, e nada. Se tem multa e não é pouca, tem problema. Primeiro colocar cancela manual, chip, o que for, mas deixar a critério do consumidor que sempre tem razão, e não adotar um modelo que só é bom para um lado. Se tem cliente procurando o manual para pagar, com dinheiro ou debito, ok, deixa até que outros sistemas passam a ser adotados por todos. Com o tempo o cheque sumiu, o orelhão sumiu, e outros que não impostos na marra. O povo se aperfeiçoa e todos resolvem, agora é coisa atual a culpa é sempre do outro que é burro ou velho, porque? Uma pergunta que não entendo, eu preciso do recibo para comprovar a passagem no pedágio, ou é também meu direito? Sempre que passo em todos os pedágios no manual, já viram que no recibo tem a placa do veículo? Ou seja sempre sabem a placa de quem passou, já viram o recibo?