Os dias da Ford como uma das marcas com o maior volume de vendas de carros no Brasil acabaram. O foco passou a ser veículos de maior valor agregado, voltados para um público muito menor do que nos tempos de Ka e Ecosport. Menos clientes, mas uma saúde financeira melhor.
Com a saída do mercado dos seus três carros de maior volume, a queda no posicionamento da marca dentro do setor de automóveis e comerciais leves era inevitável.
Em 2021, a Ford vendeu 17,2% do que emplacou no Brasil dois anos atrás. Neste ano, a marca fechou com 37.778 unidades enquanto em 2019, último ano antes da pandemia, emplacou 218.526 exemplares.
Se comparado a 2020, que teve 139.225 emplacamentos, a marca vendeu em 2021 apenas 27,1% do que comercializou no ano anterior. Os dados são da Fenabrave.
No que diz respeito à participação de mercado, a Ford fechou 2021 na 11ª colocação com 1,91% do mercado. Em 2019 e 2020, ela foi a quinta colocada em market share, com 8,22% e 7,14%, respectivamente. Apenas General Motors, Volkswagen e Fiat, além de Renault (2019) e Hyundai (2020), ficaram à frente no período.
Com o fim da produção nacional da Ford, apenas Peugeot e Citroën não conseguiram supera-la em vendas em 2021, ficando em 12º e 13° lugar, respectivamente, no ranking. As demais montadoras atrás da companhia norte-americana são as marcas premium ou de luxo, que trabalham com um tíquete médio mais elevado.
Flavio Padovan, sócio da consultoria MRD Consulting e ex-executivo da Ford, projeta que, ao longo deste ano, a Ford deverá ver sua participação de mercado ficar ainda menor, descendo para 1% ou percentual ainda mais baixo.
"Vai ficar abaixo das francesas Peugeot e Citroën. O grande desafio da Ford será equilibrar as contas em um mercado de baixo volume. Nessa nova fase apenas como importadora, a empresa fica muito sujeita a fatores externos, como flutuação do câmbio e indisponibilidade de peças e veículos", analisa o especialista.
Segundo Padovan, está claro que o Brasil e a América do Sul há muito tempo deixaram de ser mercados prioritários para a empresa e isso de alguma forma "engessa" a operação local da montadora.
"Para atender o Brasil, a Ford fica atrás na fila. O ciclo do planejamento até a entrega do veículo, passando pela produção, fica muito mais longo na comparação com a época em que havia produção nacional.
Já Cassio Pagliarini, outro ex-executivo da Ford, destaca que a decisão da empresa de concentrar os investimentos na eletrificação a deixa ainda menos competitiva no Brasil.
"O alto custo desse tipo de veículo, cujo volume de vendas é baixíssimo em nosso País, reduz ainda mais o leque de opções viáveis economicamente para o mercado brasileiro", pondera o sócio da consultoria Bright Consulting.
Por fim, Ricardo Bacellar, sócio fundador da Bacellar Advisory Boards e conselheiro da SAE Brasil, salienta a dificuldade proveniente da estratégia de disputar clientes em uma faixa de preço muito mais elevada.
"A Ford decidiu concorrer com marcas premium consagradas, enquanto sua reputação aqui foi consolidada como uma fabricante generalista, com atuação forte no segmento de entrada e em outras categorias que não são consideradas premium".