Passat - o 'mutante'

Carro que revolucionou Volkswagen mudou radicalmente e foi de 'classe média' a preferido dos mais abastados

Rodrigo Mora Do UOL, em São Paulo Divulgação

Um carro revolucionário

Desde 23 de março de 1953, quando a Volkswagen estreou no Brasil, sua identidade ficou marcada por modelos de tração traseira e motor idem, refrigerado a ar. Parecia que aquela seria uma eterna característica da marca. Como um restaurante que só faz massas, ou outro especialista em carnes nobres. A Volkswagen era a marca dos carros a ar.

Mas tudo mudou em 1974. Chegou a causar estranheza aquele modelos onde o motor não estava mais no lugar onde habitualmente estava instalado. E a refrigeração dele era a água.

De quebra, era um carro mais sofisticado no desenho, no acabamento interno e na dirigibilidade. Assim como na Alemanha, sua chegada fora um marca na história da marca - ofuscado apenas pelo lançamento do Gol, anos mais tarde.

O impacto foi ainda maior pelo fato de a VW já ser a principal fabricante por aqui. Um carro de concepção moderna apresentado pela maior empresa brasileira não mexeria pouco com o mercado - virando objeto de desejo da classe média e até mesmo dos mais abastados, sempre acostumados com modelos mais luxuosos.

Tim Hoppe / GARP

União que deu liga

A Volkswagen já era dona da Auto Union (conglomerado que reunia Audi, DKW, Horch e Wanderer) quando, em 1969, a também alemã NSU foi incorporada ao grupo.

Criada em 1892, estava à frente da própria dona. Tanto que o K70 foi um modelo concebido pela fabricante de Neckarsulm e sequestrado pela Volkswagen, que o lançou em 1970 com seu logotipo.

Enquanto a VW se apropriou do K70 para ter seu primeiro modelo com tração dianteira e motor dianteiro arrefecido a água, a Audi ao menos deu outra personalidade àquela base para lançar, em 1972, a segunda geração do Audi 80. E dele nasceu o Passat, em maio de 1973.

Seu desenho leva a assinatura do italiano Giorgetto Giugiaro, que captou como ninguém o espírito da Volkswagen naquele início dos anos 1970 - é dele também os traços das primeiras gerações de Golf, Jetta e Scirocco.

Modernidade chega ao Brasil

Assim como na Europa, era urgente para a Volkswagen do Brasil ter um carro mais moderno. Então, em sincronismo incomum na dinâmica da indústria nacional, o Passat estreou por aqui pouco mais de um ano após o lançamento na Alemanha, em setembro de 1974.

A estreia ocorreu apenas na versão duas portas, nas configurações L e LS, ambas equipadas com motor 1.5 de 65 cv. Havia freios a disco nas rodas dianteiras, suspensão McPherson na frente e de eixo semirrígido na traseira. Tratava-se de uma revolução para o consumidor habituado com os Volkswagens da época.

Em 1975 o Passat aproveitou o sucesso para emplacar a versão quatro portas, tipo de carroceria não muito cobiçada naqueles tempos. No ano seguinte veio o modelo de três portas - a tampa do porta-malas era substituída por uma maior, ampliando o acesso ao compartimento e também sua capacidade de carga.

No XI Salão do Automóvel, a Volkswagen apresentou a primeira reestilização do Passat, que passava a contar com faróis retangulares e luzes direcionais nas extremidades. As novidades estéticas eram acompanhadas por retoques no interior, como bancos redesenhados e painéis de porta idem, agora com um descansa-braço.

Mudanças e visual renovado

A segunda e mais profunda atualização aconteceu em 1983. Quatro faróis retangulares tentavam dar um ar mais sofisticado à frente do Passat, que tinha também nova grade e um discreto spoiler no para-choque. Nas laterais, frisos de borracha, retrovisor redesenhado e rodas de liga leve, já vistas no Gol Copa um ano antes, cumpriam a função de renovar o visual do modelo.

Na cabine, o habitual dessas atualizações mais discretas: acabamento em alumínio escovado cruzando o painel, novo volante, novo grafismo para velocímetro e marcadores e bancos e laterais de portas com forração diferente.

No ano seguinte, uma reconfiguração nas versões - Special, Pointer, Village e Paddock - tinham a missão de mostrar que o Passat continuava vivo, apesar do lançamento do mais luxuoso e mais potente Santana.

Mas por pouco tempo os dois conviveram: no dia 2 de dezembro de 1988 o último Passat saiu da linha produção.

Os esportivos

Não demorou para que o Passat ganhasse uma versão esportiva. Lançado em 1976, o TS se diferenciava pelos faróis duplos, faixas laterais, volante de três raios e bancos com apoio para cabeça.

Sob o capô, a cilindrada saltava de 1.471 cm3 para 1.588 cm3, o que resultou em 80 cv de potência.

Já o GTS Pointer era equipado com um 1.8, de 99 cv, volante esportivo e bancos REcaro. É um dos carros mais cobiçados pelos colecionadores: recentemente, um desses com 56 quilômetros rodados foi anunciado, em Goiânia, por R$ 200 mil.

Os especiais

Surf, 4M, Flash...o Passat teve séries especiais, mas talvez nenhuma tão curiosa quanto a 'Iraque'. Um acordo entre o país do Oriente Médio, a Volkswagen e a Petrobrás determinava que modelos LSE com quatro portas seriam exportados para o país, em troca de petróleo.

Quando as reservas nacionais aumentaram, em decorrência da maior produção interna e do aumento do consumo de etanol, o LSE se voltou para o mercado brasileiro.

Curioso é que aquele Passat havia sido configurado exclusivamente para outro mercado, com outros gostos e exigências - como o interior vermelho (quando a carroceria era prata, branca ou vermelha) ou a exótica cor externa azul.

Divulgação

Carrão de luxo

No mesmo ano em que o Passat saía de linha no Brasil, a terceira geração estreava na Europa. Momento marcante na história do modelo, que a partir dali migrava para o andar superior do segmento de sedãs e peruas. A base não era mais a do Audi 80, e sim a da segunda geração do Golf, alargada e esticada (e mais moderna). O motor também adotava uma concepção mais atual, instalado na transversal.

E foi com a terceira geração reestilizada (batizada de B4) que o Passat voltou ao Brasil, em 1994. Agora equipado com motores 2.0 (116 cv) e 2.8 V6 (174 cv), o modelo passava a ser um automóvel destinado à classe A. E, pela primeira vez, o sedã era acompanhado de uma versão perua.

Como um carro de luxo mais acessível que Audi, BMW e Mercedes, o Passat seguiu, tanto na Europa quanto aqui, pelas próximas gerações. Hoje em seu oitavo ciclo, o Passat é o modelo topo de linha da VW no Brasil. Porém, ficaram pelo caminho os motores V6 - o atual 2.0 turbo de 220 cv entrega mais desempenho com menos consumo de combustível - e a versão perua, que se despediu do Brasil na geração anterior.

Números do Passat

Quanto cresceu

Primeira geração

Comprimento: 4,18 m
Entre-eixos: 2,47 m
Porta-malas: 362 litros
Potência: 65 cv

Oitava geração

Comprimento: 4,77 m
Entre-eixos: 2,79 m
Porta-malas: 586 litros
Potência: 220 cv

Passat e suas gerações

Os amantes do Passat

Arquivo Pessoal

"Dei sorte em uma rifa"

Marcelo Palma: "Tive meu primeiro Passat em 2015, um 1979 turbinado na rara cor Amarelo Vila Rica, ganhei em uma rifa. Comprei três números por R$ 100. Quando estava para acabar a rifa, comprei mais três. Foi aí que ganhei o carro. Já tive mais de 20 carros antigos. Mas depois que peguei o Passat, adorei. Comecei a ir aos encontros, fiz amizade muito legal com os meninos do clube. Desde então digo que não vendo, não empresto e não troco. Vai ficar comigo para a vida toda".

Arquivo Pessoal

"Carro de cinema"

Danilo Oliveira: "Em 1996 meu tio deu uma Brasília de entrada e pegou o Passat numa loja de carros usados. Cinco anos depois, meu pai o comprou. Cresci nesse carro e aprendi a dirigir nele. Até que em 2012 eu o comprei. Decidi partir para uma restauração, que ficou pronta em 2017. E valeu a pena: meu Passat já fez pequenas participações em filmes, como o da Hebe Camargo, e até séries, como ?A irmandade?, da Netflix. É o xodó da família e passará de geração para geração".

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