Raio-X das rodovias

Recebendo menos investimentos a cada ano, estradas brasileiras elevam cada vez mais o custo do transporte

Paula Gama Colaboração para o UOL Fabian Ribeiro/ Agência Free Lancer/ Estadão Conteúdo

2021 ficou marcado como o ano de menor investimento em infraestrutura para transportes rodoviários nas últimas duas décadas.

Um levantamento que avaliou 109.103 quilômetros de estradas pavimentadas federais e estaduais constatou que o estado geral de 61,8% da malha rodoviária brasileira é classificado como regular, ruim ou péssimo.

Os resultados fazem parte da 24ª edição da Pesquisa CNT de Rodovias, realizada pela Confederação Nacional do Transporte e compartilhada pela entidade com o UOL Carros.

Retrocesso de sete anos

Para a avaliação do estado geral das rodovias, são analisadas três características: Pavimento, Sinalização e Geometria da Via. Elas levam em conta, respectivamente, variáveis como condições do pavimento, placas e alguns elementos da via, como as curvas.

Tais aspectos recebem classificações que vão desde ótimo e bom a regular, ruim e péssimo. Nesta edição da pesquisa, todas as cinco regiões do Brasil foram percorridas, durante 30 dias, por 21 equipes de pesquisadores.

De acordo com a pesquisa da CNT, as rodovias federais públicas apresentam queda de qualidade. Para a Confederação, após anos de investimentos bem-sucedidos feitos pelo governo federal por meio do programa BR-Legal - lançado em 2014 pelo governo Dilma Rousseff (PT) para melhorar as condições de sinalização das vias e mantido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) - sua efetividade parece ter chegado ao fim.

Os dados mostram que a qualidade da sinalização das rodovias mantidas pela União em 2021 (64,7% da extensão com problemas) voltou ao mesmo nível de 2014 (63,1% com problemas), quando deu-se início ao programa.

Para o presidente da CNT, Vander Costa, os resultados mostram que a situação precisa ser enfrentada com grande rapidez e assertividade. "A forte retomada de investimentos é urgente e necessária para prover ao país uma malha rodoviária mais moderna e eficiente, condição indispensável para a promoção do desenvolvimento."

10 piores rodovias do Brasil, segundo CNT

  • 1

    PE-096

    Palmares a Barreiras, Pernambuco

  • 2

    MA-006

    Buriticipu a Alto Parnaíba, Maranhão

  • 3

    PE-545

    Rodovia Asa Branca, de Exu a Ouricuri, em Pernambuco

  • 4

    PE-177

    Quipapá a Guaranhuns, em Pernambuco

  • 5

    BA-122

    Morro do Chapéu a Seabra, Bahia

  • 6

    AM-010

    Rodovia Torquato Tapajós, de Manaus a Itacoatiara, Amazonas

  • 7

    AC-010

    Porto Acre a Rio Branco, Acre

  • 8

    AC-405

    Mancio Lima a Rodrigues Alves, Acre

  • 9

    RS-153

    Barros Cassal a Vera Cruz, Rio Grande do Sul

  • 10

    BR-163

    Trecho entre Dionísio Cerqueira e São Miguel do Oeste, em Santa Catarina

Jarbas Oliveira/Folhapress

Custo operacional do transporte aumenta 30,9%

As condições das vias impactam, direta ou indiretamente, toda a economia. Segundo o estudo, os pavimentos deficientes implicam mais gastos com despesas de manutenção do veículo, maior demanda do motor e de consumo de combustíveis por quilômetro rodado, entre outras despesas. O custo usual sofre um acréscimo médio de 30,9% por conta das rodovias em regular, ruim e péssimo estado de conservação.

Entre as rodovias sob gestão privada, 44,3% apresentaram algum tipo de irregularidade, o que ocasiona um aumento de 16% nos custos operacionais do transporte rodoviário de cargas para seus usuários.

Já 73% das rodovias sob administração pública mostraram irregularidades, o que acarreta um acréscimo estimado de 35,2% nos custos operacionais.

A região Norte do país é a mais impactada, com um aumento de 40,5% do custo operacional do transporte, seguida por Centro-Oeste (31,3%), Nordeste (30,3%), Sul (30%) e Sudeste (27,7%), que têm melhores condições.

Brasil desperdiçou 956 milhões de litros de diesel

Os dados da CNT também revelam que o consumo a mais de combustível devido a problemas de qualidade das rodovias brasileiras representou um prejuízo financeiro de, aproximadamente, R$ 4,21 bilhões para os transportadores de cargas e de passageiros no Brasil.

Isso porque dificuldades como reduzir e aumentar a velocidade ao desviar de buracos, geometrias da via mal programada, entre outros, faz com que aumente o consumo de combustível.

Considerando apenas o diesel, é possível estimar que 956 milhões de litros foram consumidos de forma desnecessária, o que ocasionou uma descarga de aproximadamente 2,53 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) equivalentes na atmosfera.

Foto: Geraldo Bubniak | Agência de Notícias do Paraná

Um quarto das rodovias concedidas têm problemas

Em 2021, a pesquisa avaliou 23.636 quilômetros de rodovias sob controle da iniciativa privada. O estado geral de 25,8% dessa extensão foi classificado como regular, ruim ou péssimo. Esse percentual representa pouco mais de um quarto (6.087 quilômetros) da extensão das estradas sob concessão.

Em relação à qualidade do pavimento, 26,2% da extensão apresentam problemas. Já a sinalização teve um percentual menor, com 24,1% da extensão classificadas como regular, ruim ou péssimo.

Em pior situação está a geometria da via, que teve 33,6% da extensão classificada como regular, ruim ou péssimo

Patricia Stavis/Folha Imagem

Investimento em queda livre

Desde 2016, quando foram investidos R$ 10,8 bilhões na infraestrutura das rodovias públicas federais, o valor destinado a melhorias das condições de rodagem só tem caído. Em 2019, primeiro ano do atual governo, passou para R$ 7,56 bilhões e, em 2021, para R$ 5,8 bilhões.

Entre 2016 e 2020, a média de investimento por quilômetro das rodovias concedidas foi de R$ 381,04 mil, contra cerca de R$ 162,92 mil nas rodovias federais sob gestão pública. Em 2021, foi registrado um gasto médio de apenas R$ 108,97 mil por quilômetro nas estradas federais. O investimento do setor privado não foi divulgado.

Outro dado é alarmante: o gasto com acidentes supera o investimento em rodovias. De acordo com a CNT, é histórico no Brasil o custo dos acidentes superarem o valor investido em infraestrutura, "realidade que poderia ser evitada com a melhora da pavimentação, sinalização e geometria das rodovias", diz a entidade.

Este ano, até setembro, estima-se que os custos dos acidentes tenham sido de R$ 8,85 bilhões, enquanto o total pago em investimentos em rodovias federais foi de R$ 4,16 bilhões, resultando em uma diferença de R$ 4,69 bilhões.

Para resolver a situação das rodovias em toda a extensão analisada pela CNT, seriam necessários R$ 62,9 bilhões para a reconstrução de 554 quilômetros que estão com a superfície destruída e para a restauração de 41.039 quilômetros nos quais se identificam trincas, buracos, ondulações, remendos e afundamentos.

Para os trechos desgastados (51.118 quilômetros), o custo estimado para manutenção é de R$ 19,6 bilhões.

Agência Brasil

Governo aposta em investimento privado

Questionado pela reportagem sobre a pesquisa, o Ministério da Infraestrutura afirmou que, desde 2019, o Governo Federal já revitalizou, construiu e duplicou 4,1 mil quilômetros de rodovias federais pelo país.

De acordo com o Ministério, a redução orçamentária se deu devido à situação econômica do país e, por isso, o Governo Federal investe na parceria com a iniciativa privada.

"Somente no modal rodoviário foram seis rodovias, que terão R$ 37,3 bilhões em investimentos privados. Este valor é equivalente a aproximadamente seis vezes o orçamento do Ministério para realizar obras em todos os setores de transporte."

Para os próximos meses, ainda estão previstos mais três leilões rodoviários, que juntos representam R$ 60,6 bilhões em investimentos durante a duração dos contratos. São das rodovias BR-381/262/MG/ES, BR-116/493 (Rio-Valadares) e integradas do Paraná (seis lotes).

Em dezembro, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, tratou do assunto durante entrevista coletiva virtual para apresentar o balanço 2021 do Ministério da Infraestrutura. Para ele, o resultado de sua política será colhido a longo prazo.

"Com o orçamento de R$ 6,5 bilhões, nós estamos gerando R$ 350 bilhões de contratos. Então, vamos ver uma melhoria grande com o que está sendo contratado neste momento, porque é o maior esforço de transferência de ativos para iniciativa privada da nossa história. A gente vai ver a infraestrutura mudando muito e não vai ser obra do acaso, vai ser com o que está sendo plantado agora. Porque estamos olhando infraestrutura como questão de Estado, não estamos olhando o resultado desse ano, estamos olhando o resultado de 10 e 15 anos, os resultados lá na frente".

10 melhores rodovias do Brasil, segundo CNT

  • 1

    SP-320

    Rodovia Euclides da Cunha, entre Rubinéia e Mirassol, São Paulo

  • 2

    SP-348

    Rodovia dos Bandeirantes, entre Cordeirópolis e São Paulo

  • 3

    SP-225

    Rodovia Comandante João Ribeiro de Barros, entre Itirapina e Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo

  • 4

    SP-334

    Rodovia Cândido Portinari, entre Cristais Paulista e Ribeirão Preto, São Paulo

  • 5

    SP-280

    Rodovia Castello Branco, entre Santa Cruz do Rio Pardo e São Paulo

  • 6

    SP-075

    Rodovia Santos Dumont, entre Campinas e Sorocaba, São Paulo

  • 7

    SP-300

    Rodovia Marechal Rondon, entre Castilho e Jundiaí, São Paulo

  • 8

    SP-308

    Rodovia do Açúcar, de Charqueada a Salto, São Paulo

  • 9

    SP-330

    Rodovia Anhanguera, de Igarapava a São Paulo

  • 10

    SP-147

    Itapira a Piracicaba, São Paulo

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