O ativismo de Marsha P. Johnson foi central na luta por direitos trans
Por Diana Carvalho
Em um mês do Orgulho LGBTQI+ marcado por protestos antirracistas, o legado de Marsha P. Johnson (1945-1992) é emblemático para pensar a luta por direitos humanos. Há 50 anos, a ativista norte-americana enfrentava a opressão policial batalhando pelo fim de uma sociedade que não só discriminava gays e lésbicas, como negava a existência de mulheres e homens trans.
"Marsha P. Johnson foi a 'Rosa Parks' do movimento gay", diz a narração, fazendo referência à ativista negra que deflagrou luta contra segregação racial nos ônibus nos EUA. Marsha nasceu Malcolm Michaels Jr e morou com seus pais e seus seis irmãos em Nova Jersey, até concluir o ensino médio.
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15 dólares e uma sacola de roupas
Em 1963, Marsha decidiu ir para Nova York. Partiu com uma sacola de roupas e 15 dólares no bolso. Por lá, trabalhou em um restaurante e depois foi viver em Greenwich Village, onde se identificou como drag queen, adotando o nome de Black Marsha.
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O "P" de Marsha
Apesar do termo drag queen não ter associação com a questão de gênero, Marsha se identificava como mulher e usava elementos femininos durante todo o dia, não só em performances artísticas.
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Naquela época, a falta de liberdade dificultava o debate sobre transgeneridade. Quando perguntavam o significado do "P" em seu sobrenome, Marsha dizia: P de "Pay It No Mind" - "Não se preocupe com isso", em tradução livre.
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A revolta de Stonewall
Em 28 de junho de 1969, quando homossexuais se revoltaram contra uma batida policial no bar Stonewall Inn, localizado na Rua Christopher, em Greenwich Village, Marsha percebeu a importância de lutar contra a repressão que a comunidade sofria.
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Johnson, que trabalhava nas ruas, lidava constantemente com o abuso de autoridades e passou a protestar contra a prisão e perseguição de seus "irmãos e irmãos gays", exigindo a libertação de pessoas trans e homossexuais presas injustamente.
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O T da questão
Os protestos que se seguiram após a revolta de Stonewall impulsionaram a criação de diversos movimentos LGBTQI+, incluindo a realização da primeira parada do orgulho, chamada, à época, de Dia da Libertação Gay da Rua Christopher.
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Apesar do marco, Marsha e sua amiga Sylvia Rivera, também ativista, sentiam a necessidade de fazer algo mais por transgêneros, que continuavam marginalizados da sociedade e discriminados dentro da própria comunidade LGBTQI+, com a luta por seus direitos negligenciada.
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S.T.A.R
Em 1970, Sylvia e Marsha conseguiram alugar uma casa. No local, fundaram a S.T.A.R - Street Transvestite Action Revolutionaries (Ação das Travestis de Rua Revolucionárias, em tradução livre).
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A organização dava abrigo, comida e roupa para jovens trans e drag queens que viviam nas ruas de Greenwich Village.
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Ladies and gentlemen
Alta, estilosa e sempre sorrindo, Marsha foi fotografada diversas vezes por Andy Warhol -- como na série "Ladies and Gentlemen", em que o artista produziu mais de 250 retratos de mulheres trans da cena gay dos anos 1970 em Nova York.
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Ser uma lenda não paga as contas
Apesar de ser considerada ícone, Marsha enfrentou dificuldades durante toda a sua vida. Em artigo para a revista OUT, o escritor e especialista em cultura queer Hugh Ryan conta que a ativista viveu muito tempo nas ruas, e contou com a solidariedade das pessoas e o trabalho sexual para sobreviver.
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Marsha se transforma em um símbolo para 'todas' pessoas queers - mas esse 'todas' quase sempre significa as experiências universalizadas de homossexuais brancos. A dor específica de Marsha, seu sofrimento, fica em segundo plano. É por isso que conhecemos o sorriso da ativista, mas não os pensamentos que passavam por sua cabeça. É por isso que lembramos Johnson como mártir, mas pouco falamos sobre as causas pelas quais ela lutou"
Hugh Ryan para a revista OUT
Justiça para Marsha
Marsha foi encontrada morta no dia 6 de julho de 1992, aos 46 anos. Seu corpo foi retirado do rio Hudson e a polícia de Nova York declarou o caso como suicídio.
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Amigos próximos contestaram a versão e saíram em protesto pelas ruas de Nova York. Para eles, Marsha poderia ter sido vítima de um assassinato.
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Em 2017, o caso foi reaberto após a ativista trans Victoria Cruz começar a investigar, por conta própria, os desdobramentos da morte. O esforço de Cruz rendeu o documentário "A morte e vida de Marsha P Johnson", disponível na Netflix.
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O legado
Com o intuito de perpetuar o legado de Marsha, a ativista Elle Hearns fundou o Marsha P. Johnson Institute. A organização atua para garantir os direitos de mulheres trans negras.
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O sorriso como escudo
Para o escritor Hugh Ryan, o sorriso de Marsha era uma maneira de a ativista se proteger de uma sociedade transfóbica. "Seu sorriso era sua espada e escudo. E para ser quem era, Marsha precisava estar sempre armada e blindada. Foi o sorriso que a manteve viva."
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Graças ao trabalho de artistas negros e ativistas, estamos prontos para reconhecer a mulher por trás do ícone, a dor por trás da alegria, a mente por trás do sorriso. Isso significa mais do que estampar o rosto de Johnson em cartazes na parada do Orgulho LGBTQI+ - significa ouvir mulheres negras trans, dar apoio financeiro e legislativo no enfrentamento aos problemas que as afetam"
Hugh Ryan, escritor
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Publicado em 24 de junho de 2020.
Reportagem: Diana Carvalho | Edição: Adriana Terra