Quem cuida das mulheres negras eleitas?
Assim que saíram os resultados das eleições municipais na última semana, fiquei em um misto de entusiasmo pela eleição de centenas de mulheres negras e mulheres trans em todo o Brasil, mas também preocupação. Sem dúvidas, tivemos uma grande vitória nas urnas. Os candidatos e candidatas da ala direita enxugaram em quase todos os municípios, enquanto as candidaturas de mulheres trans, LGBTs e mulheres negras tiveram um aumento significativo, e por isso hoje, podemos falar em vitória, mais uma vez.
Ainda assim, apenas nos primeiros cinco dias que se passaram após a eleição, vimos diversas manifestações de intolerância, xingamentos e ataques contra mulheres negras. Os casos mais emblemáticos na última semana foram da vereadora eleita em Joinville (SC), Ana Lúcia Martins (PT), que recebeu ameaças de morte em suas redes sociais e imediatamente precisou se mobilizar em defesa da própria vida e do direito a exercer sua vida política em 2021.
Outro caso foi o assassinado brutal e covarde de Leila Arruda, militante do direitos das mulheres e fundadora do Movimento de Mulheres Empreendedoras da Amazônia e que até então estava candidata pelo PT à prefeitura de Curralinho, em Ilha do Marajó no Pará. O covarde assassinato de Leila pelo seu ex-marido, em especial, escancara os diversos níveis de violência ao quais nós, mulheres, podemos estar expostas e que direta ou indiretamente afetam a permanência na vida pública e interrompem o caminho até os espaços de tomada de decisão.
Ao ver esses casos, obviamente não pude deixar de lembrar do assassinato de minha irmã, Marielle Franco. Apesar das condições serem diferentes, a interrupção de uma parlamentar ou candidata, é sem dúvidas, um grande golpe na vida de diversas outras mulheres negras que compartilham do mesmo sonho de poder. Não cair em medo e desespero, é um desafio para aquelas que colocam seus corpos à disposição da luta pelos nossos direitos, em espaços institucionais.
Mas, hoje, a mensagem que quero passar é não apenas de um chamado por justiça, coisa que faço desde o dia 14 de março de 2018, mas também um chamado de esperança. Esperança, porque em algumas capitais o número de mulheres negras eleitas mais que dobrou, esperança porque hoje, diferente de 2016 quando Mari foi eleita, temos absoluta noção dos riscos a que uma mulher negra pode estar exposta ao entrar nessas instituições, ainda mais sozinha.
Esperança também porque temos cada vez mais pessoas cobrando a responsabilidade das instituições, como a justiça eleitoral e os partidos políticos, medidas efetivas de proteção de candidatas e parlamentares negras. Esperança, porque não estamos mais sozinhas. Apesar de por vezes ficarmos desamparadas pelas instituições, o senso de coletivo e a ancestralidade de mulheres negras sempre demonstram que não andamos sós.
Por isso, pelos próximos quatro anos e ainda neste também, visto que se passou apenas uma semana desde a eleição destas mulheres, faço um pedido para que todos nós, mulheres e homens, brancos e negros, cis e trans, possamos olhar e cuidar dessas mulheres, para que nós assumamos a responsabilidade de protegê-las, seja denunciando, seja oferecendo ajuda, seja cobrando de instituições e apoiando ações de grupos, coletivos e organizações que atuam pela vida dessas mulheres eleitas, e pelos sonhos e futuro daquelas que ainda serão.
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