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Anielle Franco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Contra o racismo ambiental e em defesa dos povos quilombolas

APP/Bahia
Imagem: APP/Bahia

25/10/2021 06h00

Localizada no município de Salvador, na parte central da Baía de Todos os Santos, a Ilha de Maré é o lar de diversas colônias de pescadores, além de 5 comunidades quilombolas reconhecidas pela Fundação Cultural Palmares. As 400 famílias quilombolas da região lutam há 17 anos pela demarcação de seus territórios tradicionais. As ações e campanhas permanentes das comunidades têm gerado uma série de ataques a defensores e defensoras de direitos humanos.

Hoje, quero usar meu espaço nesta coluna para falar com meus leitores sobre algo grave que tem acontecido em Ilha de Maré e na vida de Eliete Paraguassu, uma importante ativista contra o racismo ambiental e o direito de quilombolas no Brasil. Eliete Paraguassu é uma mulher negra, marisqueira, feminista, quilombola e militante do Movimento dos Pescadores e Pescadoras e da Articulação Nacional de Pescadoras. Em 2020, Eliete foi candidata a vereadora pelo PSOL na cidade, tendo disputado com candidatos ligados ao setor empresarial da região, obtendo votação expressiva em territórios que esses empresários comandam. Desde então, eles passaram a tentar criminalizar Eliete e os movimentos de mulheres negras associados a ela, como uma estratégia de intimidação.

Em março de 2021, quando a Bahia Terminais realizou uma ação onde tirou o equivalente a mais do que dois campos de futebol de manguezal, as mulheres negras de Ilha da Maré organizaram um ato de denúncia em frente ao local. Na ocasião, elas foram ameaçadas com armas de fogo e facão pelos funcionários da empresa. A partir daí, a tentativa de criminalização dos movimentos da região se intensificou.

Em razão de sua atuação política em defesa de seu território e contra o racismo ambiental, materializado pela invasão de terras quilombolas por grandes corporações empresariais com seus mega empreendimentos de alto impacto socioambiental, Eliete Paraguassu vem vivenciando um cenário complexo de ameaças graves (inclusive, com armas de fogo), tentativas de criminalização jurídico-penal, ataques visando o ostracismo da ativista de sua comunidade, divulgação de fakes news nos meios de comunicação locais e outras violências racistas e homofóbicas. Entre os ataques estão um forte discurso de ódio e desinformação que vem recebendo. O empresário, dono de empreendimentos na região, tem forte influência nas mídias locais e conseguiu mobilizar vizinhos e lideranças para ameaçar Eliete. Ela já foi chamada de "ignorante" pelo apresentador do programa Balanço Geral, da TV Record, em canal aberto.

Fake news associando Eliete ao tráfico de drogas e outras ilegalidades, xingamentos racistas e LGBTfóbicos como "sapatona", são alguns dos ataques que ela vem sofrendo. Além disso, essa rede de empresários usa menores de idade para atacar Eliete e suas companheiras. Entre as tentativas de intimidação está, por exemplo, ficarem com uma caixa de som e amplificador em frente da porta de sua casa, causando uma sensação de terror e insegurança.

O Instituto Marielle Franco, junto ao Fórum Nacional Marielles, a Anistia Internacional, a Justiça Global e outras organizações de defesa de Direitos Humanos, enviou um Ofício do Conselho Nacional de Direitos Humanos comunicando sobre a grave situação de risco que está defensora está exposta e que todo seu movimento está enfrentando na região.

A violência política contra Eliete e outras mulheres negras defensoras de direitos humanos é o retrato de como se deu a fundação e formação do Brasil: racismo, misoginia, roubo de terras, dos direitos e da vida das populações tradicionais. Não permitiremos que isso continue acontecendo. Não seremos interrompidas!