Beatriz Mattiuzzo

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Opinião

Mar cristalino cheio de tubarões e baleias em SP mascara situação ruim

No dia 20 de junho, mergulhadores registraram mais de 100 tubarões no arquipélago de Alcatrazes, no litoral norte de São Paulo. Em março, um grande número de tubarões-martelo também tinha sido avistado no local. Em Ilhabela, nos últimos 40 dias, já são mais de 12 registros de tubarão-baleia, o maior peixe do mundo. Baleias-jubarte, golfinhos e baleias-franca são vistas pelo litoral, sendo registradas até por moradores de prédios na orla carioca. Será que o mar "está para peixe"?

São registros incomuns no nosso litoral, resultado de uma combinação de fatores. As águas do litoral Norte de São Paulo até o Rio estão cristalinas, em tons azuis que chamam a atenção. O fenômeno deve-se às poucas chuvas, padrão de ventos e ondas - combinados com momentos de migração de agregação de algumas espécies de animais.

Quando chove, os rios e córregos levam para o mar sedimentos, além de lixo e esgoto, deixando a água mais turva e suja. Este ano, o outono também teve poucos episódios de ressacas e frentes-frias, que normalmente deixam o mar mais agitado e levantam suspensão. Por fim, o regime de ventos também desempenha um papel fundamental: sem frentes frias, predominaram os ventos de sul e sudoeste, que vêm trazendo a água do oceano em direção à costa.

As águas oceânicas são tipicamente mais cristalinas por terem menos sedimento - e sua chegada parece favorecer a aproximação de animais que também são pouco vistos próximos à costa, como tubarões-baleia e raias manta. Isso somado às condições de um outono atipicamente mais quente e de mar calmo, convidativo a pesquisadores, mergulhadores e amadores a se aventurarem por suas águas.

Tecnologias como drones também auxiliam o encontro dos animais, facilitando tanto o direcionamento das embarcações quanto o registro de arraias a baleias.

As águas claras e a grande quantidade de avistamentos renovam a esperança de admiradores da natureza, mas acabam mascarando a situação do oceano, que não está nada boa.

O mês de maio bateu novamente o recorde de maiores temperaturas registradas, sendo o 12° mês consecutivo de temperaturas recordes considerando as temperaturas terrestres, e o 14° mês consecutivo das maiores temperaturas oceânicas, segundo a NOAA (Agência Americana de Monitoramento Global do Clima). Para os mares, isso significa uma onda global de branqueamento de recifes de corais, que são um dos ecossistemas base para a vida na costa.

Ao mesmo tempo, continuamos matando milhões de tubarões e raias - 83% das espécies de raias e tubarões comercializadas no Brasil estão ameaçadas, segundo pesquisa publicada neste ano. O Brasil é o maior importador da carne de tubarão do mundo, comercializada no país como carne de cação, apesar de muitas pessoas não saberem se tratar do mesmo animal, essencial para o ecossistema marinho.

A poluição plástica nos oceanos continua visível e piorando - e se há tempos sabemos como o plástico está se infiltrando na cadeia alimentar marinha e até no corpo humano, só agora estamos tendo os primeiros resultados da ciência sobre como o plástico está afetando nossa saúde. Quem tem microplástico nos vasos sanguíneos do coração chega a ter 4 vezes mais chance de AVC (acidente vascular cerebral), ataque cardíaco e morte precoce, segundo pesquisadores italianos. Trombose e microplásticos também estão associados, com maior gravidade da doença em pessoas com altas concentrações.

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Por outro lado, esforços de conservação também devem ser reconhecidos: o Arquipélago de Alcatrazes, onde muitos animais marinhos têm sido observados, foi uma base de tiros da Marinha por muitos anos. A região virou uma unidade de conservação em 2016 após longos esforços de ambientalistas e hoje conta com Plano de Manejo e visitação guiada por condutores credenciados, o que tem permitido as observações.

As baleias-jubarte são outro exemplo de conservação que está dando certo. Estamos na época de vê-las, durante a migração desses mamíferos, que no inverno saem da Antártida em direção às águas tropicais mais quentes. Mas após longos períodos das populações diminuindo, ligadas a caça das baleias que só foi proibida em 1986, o número de baleias não para de crescer. Em 2022, foram estimados 25 mil animais, e 2024 deve ser um novo recorde - fruto de um esforço de décadas que vai desde mobilizações internacionais até educação ambiental.

Que a proximidade com animais marinhos possa inspirar cada vez mais pessoas na defesa do maior ecossistema do planeta e que possamos aprender com as iniciativas de conservação de sucesso.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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