Beatriz Mattiuzzo

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Opinião

Crise climática e financiamento: o que fica da última conferência do clima

Nos últimos dias, dois eventos globais chamaram a atenção daqueles que acompanham as negociações climáticas: o encontro do G20 no Rio de Janeiro e a COP29 (29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima) no Azerbaijão. Muitas vezes, porém, é difícil acreditar que algo realmente significativo saia desses encontros. Se você compartilha dessa sensação, estamos juntos. Mas, como se trata de manter a aventura humana na Terra, aqui vai uma tentativa de resumão das últimas negociações, com alguns toques de acidez.

Primeiro, a frustração é compreensível. As negociações parecem andar a passos lentos enquanto os efeitos da crise climática se tornam impossíveis de ignorar. A ciência alerta há décadas sobre os perigos do aquecimento global, e, ainda assim, falhamos em agir preventivamente. Não importa se você mora num vilarejo esquecido ou num condomínio de luxo com vista para o mar: o caos climático já te encontrou. Às vezes, ele vem na necessidade de mais um ar condicionado; em outras, arrasta a sua casa pela correnteza.

Escolha sua catástrofe: incêndios, enchentes, furacões, secas. Nenhuma parte do mundo está poupada. Não importa se estamos falando daquele lugar onde ninguém quer passar férias ou do sonho de consumo de muitos: todos estão sentindo os impactos. E, mesmo assim, as respostas globais ainda deixam muito a desejar.

A COP29 já começou em um cenário no mínimo complicado: realizada em um país petroleiro, em um ambiente marcado pela repressão a protestos e pela presença massiva de lobistas do setor de petróleo e gás — em número suficiente para formar a "quarta maior delegação" da conferência. Se falta dinheiro para as petroleiras investirem na transição energética, talvez o RH precise rever os gastos com coffee breaks.

O grande desafio deste ano foi decidir quem paga a conta da crise climática. Os países em desenvolvimento precisam urgentemente de pelo menos US$ 1 trilhão (R$ 5,79 trilhões) por ano para lidar com a crise. Esse valor é essencial tanto para compensar perdas e danos já causados quanto para investir em soluções de adaptação, como energia solar, sistemas de irrigação e a proteção de cidades contra inundações.

O problema, claro, é que essa quantia não aparece do nada. A proposta na mesa, chamada de Nova Meta Global Quantificada de Financiamento Climático (NCQG, na sigla em inglês), exige que os países historicamente responsáveis pelas emissões — e que mais lucraram com elas — assumam essa dívida climática. A lógica é clara: quem mais contribuiu para o problema deve arcar com os custos de sua solução. Parece simples, certo? Quem mais poluiu, paga. Mas a lógica esbarra na máxima do capitalismo: lucro é particular, mas os prejuízos…

Além disso, a história nos mostra que mobilizar somas trilionárias em conjunto entre nações só aconteceu em contextos um tanto menos amigáveis: guerras. Não é à toa que o problema vem se arrastando por algumas edições da conferência.

Até tivemos momentos de esperança, quando o tema ganhou destaque no G20 no Brasil e cobrou-se que essa resolução fosse definida na COP 29. Mas, na última sexta-feira (22), último dia oficial da conferência, o resultado foi frustrante: a primeira versão do texto final era fraca e ambígua, falando em apoio de bilhões quando são necessários trilhões. Além do valor baixo de recursos públicos previstos para o momento, o tom foi de mudança nas responsabilidades dos países. O que parecia promissor saiu mais como um wishful thinking da salvação climática.

Ainda estou aqui

Após o texto ter sido fortemente criticado por participantes da sociedade civil e líderes de países em desenvolvimento, as negociações atrasaram e seguiram até a noite deste sábado, no horário do Brasil (madrugada de domingo em Baku). O evento se esvaziou aos poucos, com vários negociadores das delegações tendo que ir embora — é lógico que os países mais pobres são sempre os primeiros a terem que sair.

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O cenário não é novidade assim: o recorde de reunião mais longa de uma COP foi de quase 44 horas, na COP25, em Madri (desta vez, foram quase 31 horas). A liderança do Azerbaijão também deixou bastante a desejar, além de acusações aos países do Oriente Médio e aos Estados Unidos de travarem as negociações. Mas, no geral, a pressão popular pareceu ter ao menos algum efeito: no fim, foi estabelecida a nova meta de ao menos US$ 300 bilhões ao ano até 2035, com protagonismo dos países desenvolvidos.

A meta ainda deve ser revista em 2030 e, a partir do fim da conferência, haverá uma equipe para encaminhar as discussões para a COP30, em território brasileiro. No ano que vem, em Belém, podemos esperar, além de questões complexas, uma onda de protestos barulhentos, fruto das repressões das edições anteriores, em países mais rígidos.

Historicamente, o Brasil teve destaque em negociações globais, como na construção da Agenda 2030. Com a Amazônia como palco, o país tem a oportunidade de liderar discussões sobre justiça climática e financiamento robusto. Afinal, se tem algo de que nos orgulhamos de saber fazer é improvisar soluções em cenários complicados. Quem sabe essa não seja a chance de transformar toda essa frustração climática em um plano de ação real? Seguimos fazendo planos caso o mundo não acabe.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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