Mineração no mar: disputa por terras raras chega aos oceanos
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Terras raras são um grupo de 17 elementos químicos que não são minérios em si, mas que podem ser encontrados em diversos minerais e minérios. Os minerais de terras raras, como cobalto, níquel e manganês, contêm concentrações significativas desses elementos e podem ser extraídos e processados para uso industrial. Hoje, a maior parte das reservas desses metais está em terra firme, em países como China, Brasil e Índia, mas ainda existe uma vasta fonte a ser explorada: os oceanos.
As terras raras são essenciais para o futuro, sendo fundamentais na produção de equipamentos para a transição energética, como motores de veículos elétricos e turbinas eólicas, além de estarem presentes em diversos dispositivos eletrônicos.
Estes mesmos minerais estiveram no centro da conversa entre Trump e Zelensky recentemente, em negociação de um acordo que previa a exploração americana de minerais raros na Ucrânia, visando assegurar o acesso dos EUA a esses recursos estratégicos.
No ambiente marinho, a situação é ainda mais complicada: esses minerais são encontrados na forma de nódulos polimetálicos — 'pedrinhas' compostas por camadas de minerais que se formam ao longo de milhões de anos no fundo oceânico. Esses nódulos contêm altas concentrações de metais raros, e o interesse em extraí-los vem crescendo, mesmo estando a centenas de metros de profundidade. Além disso, surgem várias dúvidas, como: quem é o proprietário dessas reservas? Quem tem o direito de explorá-las? Quem é o dono do mar? Felizmente, ninguém - ao menos por ora.
Na década de 80, quando se começou a entender que o oceano estava cheio de riquezas, buscou-se evitar um vale-tudo e foi criada a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, (UNCLOS), sendo que a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (International Seabed Authority - ISA) ficou responsável pelo controle da mineração em oceano profundo.
Desde 2017, a ISA tem conduzido intensas negociações para estabelecer um Código de Mineração que regulamenta a exploração mineral em áreas além das jurisdições nacionais.
O código deve incluir regras ambientais, processos de aprovação de contratos, monitoramento da conformidade e mecanismos de participação pública. Embora a necessidade de regulamentações ambientais rigorosas seja amplamente reconhecida, a mineração em mar profundo inevitavelmente resultará em perda de biodiversidade e impactos nos ecossistemas marinhos, incluindo perturbações na regulação climática. Nos últimos dois anos, as delegações governamentais têm se reunido em ritmo acelerado, mas para alguns defensores da mineração, o progresso ainda é lento.
Agora, em 2025, a oceanógrafa brasileira Letícia Reis de Carvalho fez história ao ser nomeada Secretária-Geral da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA). Letícia é a primeira mulher, a primeira latino-americana e a primeira cientista com formação em oceanografia a ocupar o cargo, em um momento decisivo para a regulamentação da mineração no fundo do mar.
Já tendo passado pelo Ministério do Meio Ambiente, Letícia tem um desafio enorme à frente, em que se cobra um posicionamento da ISA para esse ano. O dilema não é apenas técnico, mas também político e ético. A pressão por acesso a minerais essenciais cresce, enquanto a ciência alerta para os danos irreversíveis da mineração em águas profundas.
Nesse cenário, sua liderança terá que equilibrar desenvolvimento e preservação, construindo pontes entre interesses conflitantes e assegurando que as decisões da ISA sejam pautadas por conhecimento científico, cooperação internacional e governança responsável. Como ela mesma afirmou, o leito marinho não é apenas um recurso — é um legado que nos foi confiado, e a maneira como o gerenciamos hoje definirá o que deixaremos para as futuras gerações.