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Aquecimento global: índice prevê aumento de 25% de chuvas extremas no RS

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O Rio Grande do Sul, que ainda sofre com os efeitos das enchentes do fim de abril e início de maio, teve novas tempestades no fim de semana, que causaram mais enchentes.

Esse tipo de tragédia tem acontecido mais cedo do que se previa devido ao aumento mais rápido da temperatura média global nos últimos dez anos e ao acúmulo de gases de efeito estufa (GEE).

Usando um índice climático extremo, o RX5day, vemos o que nos espera caso o planeta tenha médias de temperatura 1,5 ºC, 2 ºC ou 3 ºC acima dos níveis pré-industriais. O índice leva em consideração a precipitação máxima anual em 5 dias consecutivos, uma chuva persistente que expressa enchentes e pode causar deslizamentos em encostas. Ele reflete o ocorrido na tragédia que abalou o Rio Grande do Sul.

As simulações foram obtidas a partir de dados de uma média de 32 modelos climáticos do projeto CMIP6 (Projeto de Intercomparação de Modelos Acoplados Fase 6) do WRCP (Programa Mundial de Pesquisa Climática).

Para um aquecimento global de 1,5 ºC - limite estabelecido no Acordo de Paris que pode ser ultrapassado na década de 2030 - o aumento projetado para eventos extremos no RS é de 10% na maior porção do estado e 15% no norte, região onde as enchentes ocorridas em maio de 2024 foram mais agudas.

Para 2 ºC de alta na temperatura média global, o aumento de eventos extremos projetado é de 10% na região oeste e 15% na maior porção do estado. No cenário de 3 ºC acima dos limites pré-industriais, o aumento projetado pelas simulações é de 20% na região oeste do RS e 25% em uma faixa que vai do norte até o sul do estado, incluindo a região mais atingida pela catástrofe climática recente, um grande impacto que pode ocorrer em meados desse século.

Resumindo: as simulações do índice climático extremo RX5day são significativas e mostram tendências positivas na intensidade de chuvas persistentes com enchentes e maior possibilidade de deslizamentos para maiores incrementos de aquecimento global sobre todo estado a partir de 2030.

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Atribuição das chuvas extremas do Rio Grande do Sul

O estudo publicado em 3 de junho pelo WWA (World Weather Attribution), uma rede de cientistas que investiga a atribuição das mudanças climáticas nos eventos de clima extremo ocorridos no planeta, indica que mudanças climáticas induzidas pela ação do homem tiveram uma grande contribuição nas chuvas extremas no Rio Grande do Sul.

Foram analisados dois períodos de chuvas: um acumulado de quatro dias (20 de abril a 2 de maio), e outro de dez dias (26 de abril a 5 de maio). Sendo o último o evento único mais severo em que as chuvas persistentes recordes caíram por vários dias consecutivos.

As mudanças climáticas transformaram um acontecimento extremamente raro, que era esperado apenas uma vez a cada 100 a 250 anos, na pior catástrofe natural já registrada no Rio Grande do Sul. O aumento da temperatura global dobrou as chances de a catástrofe acontecer, aponta o estudo. Os resultados do estudo do WWA reforçam as projeções do índice extremo RX5day sobre o Rio Grande do Sul num planeta até 3 °C mais quente.

A forte chuva que atingiu o estado no final de abril e início de maio de 2024 deixou um rastro de destruição, mortes e prejuízos. O Cemaden (Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) já havia lançado alertas de desastres como inundações, enxurradas e deslizamentos de encostas dias antes do início das devastadoras chuvas.

Tudo isso mostra o tamanho da tragédia no estado e do desafio que temos que enfrentar. A menos que consigamos zerar as emissões líquidas de GEE, atingindo o chamado net zero, e remover dióxido de carbono da atmosfera, o aquecimento global causará um clima muito mais extremo. Não só o Rio Grande do Sul, mas todo o Brasil e o planeta estão em risco de extremos de chuva, secas e ondas de calor, entre outros eventos extremos. Enormes desafios requerem iniciativas integradas e as metas dos acordos internacionais devem ser atingidas para a resiliência global e o desenvolvimento sustentável do planeta.

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* Wagner Soares é meteorologista e doutor em meteorologia pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e pós-doutorado na área de mudanças climáticas pela UFES (Universidade Federal do Espírito Santo)

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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