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Riscos e oportunidades do REDD+ para proteger a floresta amazônica

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Desmatamento e degradação florestal, incêndios e outras atividades humanas estão levando a floresta amazônica à beira do abismo. Terras indígenas (TIs) da Amazônia armazenam de 10% a 20% dos estoques globais de carbono florestal e são um componente crítico dos esforços nacionais e internacionais de mitigação do clima. Por outro lado, a destruição em Áreas Protegidas (APs) e TIs se intensificou nos últimos anos, aumentando as taxas de desmatamento em 195% entre 2019 e 2020 e quase dobrando as emissões de CO2.

O REDD+ é um mecanismo global estabelecido pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) para compensar aqueles que protegem as florestas. Sete dos oito países da região amazônica, Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru e Suriname, desenvolveram estratégias nacionais para REDD+. No Brasil, essas estratégias tomam a forma de programas e políticas, como o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) e o ENREDD+.

O governo nacional, apoiado por fundos internacionais, estabelece sistemas de pagamento para proprietários de terras (indivíduos ou comunidades) que cumpram metas claras de redução do desmatamento e da degradação. Mecanismos privados de REDD+, como os mercados voluntários de carbono (VCM), tendem a atuar localmente, ser focados em áreas florestais ou comunidades específicas e gerenciados por empresas ou ONGs.

Estratégias privadas de REDD+ têm potencial de beneficiar as populações locais da Amazônia, fortalecendo a governança e as cadeias de suprimentos locais, enquanto produzem créditos de carbono para serem vendidos a mercados voluntários ou comprados diretamente por empresas.

Os riscos e oportunidades de iniciativas REDD+ têm sido amplamente debatidos. No Brasil, o Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), atrai investimentos internacionais e investe centenas de milhões de dólares em programas e projetos que beneficiaram 101 terras indígenas na Amazônia desde 2009 e comunidades locais dentro de áreas protegidas.

O Fundo Amazônia e o Projeto Floresta+ Amazônia têm apoiado o fortalecimento das cadeias de valor, a restauração florestal, a gestão territorial e a proteção etnoambiental. Estratégias nacionais de REDD+, embora ofereçam o potencial para benefícios significativos, vêm com uma série de riscos, como o custo de oportunidade extremamente alto associado à conservação florestal, que pode criar pressões econômicas significativas sobre as comunidades e governos locais.

Erros técnicos no estabelecimento de uma linha de base de opções alternativas também podem levar a estratégias falhas que não atingem os objetivos pretendidos. O fraco apoio político pode limitar a alocação de recursos, e a corrupção pode levar ao uso indevido de fundos de REDD+. Além disso, o processo burocrático para receber recursos favorece organizações maiores que investem em comunidades sem discussão suficiente, o que pode levar a mais desigualdades.

Apesar de alguns resultados positivos poderem ser alcançados em projetos de REDD+, a questão da repartição de benefícios e garantia de direitos para os povos indígenas e comunidades locais tem suscitado intensos debates, destacando a necessidade de sistemas de governança mais inclusivos e equitativos que priorizem a redução de emissões concomitantemente a salvaguardas adequadas.

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Tais mercados emergentes para compensações de carbono às vezes são chamados de enganosos, com algumas empresas não entregando os benefícios ambientais prometidos. Conflitos fundiários e socioambientais também foram atribuídos a empresas de REDD+ que "apreenderam" carbono de áreas pertencentes a povos indígenas e comunidades locais. Disputas entre atores podem criar mais obstáculos para o sucesso, como no caso emblemático do projeto de REDD+ Suruí na Terra Indígena Sete de Setembro.

Embora os projetos de REDD+ apresentem riscos e desafios, eles não devem ser totalmente descartados. Em vez disso, podem ser vistos como complementares às políticas nacionais e regionais destinadas a eliminar o desmatamento e a degradação florestal, incluindo a implementação de áreas protegidas, o combate às ilegalidades e o reforço da cooperação.

Iniciativas de REDD+ focadas na restauração por meio de sistemas agroflorestais diversificados ou regeneração natural em TIs e APs, por exemplo, são promissoras na redução da degradação ao mesmo tempo em que apoiam os meios de subsistência locais, fomentando uma nova sociobioeconomia para a Amazônia centrada na preservação das florestas em pé e na força dos Povos Indígenas e comunidades locais.

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O aquecimento global recente é sem precedentes desde o último período interglacial há 125 mil anos atrás. A última década foi a mais quente já registrada. Além disso, o mais preocupante é que, além de ficar 1,5 °C acima da média pré-industrial (1850-1900), junho de 2024 torna-se o décimo terceiro mês consecutivo a ultrapassar o limite de 1,5 °C do Acordo de Paris.

Se não forem tomadas ações climáticas de mitigação imediatas e em grande escala para diminuir as emissões de gases de efeito estufa, e outras para remover anualmente bilhões de toneladas de dióxido de carbono da atmosfera, esses recordes serão recorrentes e os limites do Acordo de Paris se tornarão impossíveis.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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