Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
André Carvalhal: 'O discurso 'somos todos iguais' é bonito, mas não somos'
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Após a sequência de acontecimentos que provocaram tantas mudanças no Brasil e no mundo, a reflexão urgente é: como fazer da vida e nossas experiências algo diferente? Como imaginar o redesenho das atitudes e ações em um período de escassez, marcados pelo racismo, a fome, o desmatamento e incertezas de uma vida ainda em colapso?
Reposicionando o olhar para o que importa, o escritor André Carvalhal acaba de reunir em um livro essas interrogações, vislumbrando não pontos finais, mas reticências. Carvalhal lança seu "Como libertar o presente - Cocriação de novas narrativas" (Editora Vozes), que, de forma propositiva, faz um chamado para a escrita de novos amanhãs.
E em cada um deles, há espaço para repensar temas centrais do momento, como sustentabilidade, saúde mental, autoconhecimento, redes sociais, propósito e trabalho.
Direto, André expõe que nenhuma dessas esferas pretende ser analisada ou vista de forma única, excluindo em vez de somar.
"Ao mesmo tempo que olhamos para as particularidades é preciso buscar conexões entre as pessoas, grupos minorizados, pessoas que irão sofrer primeiro as consequências das crises emergentes para estimular a mobilização coletiva. A saída não é individual, e cada pessoa tem um papel importante", reflete o autor.
Abaixo, uma conversa feita especialmente para a coluna em Ecoa.
Edu: Como mobilizar e engajar para que as pessoas se atentem ao hoje e as questões que importam?
André: As narrativas de sustentabilidade sempre foram muito distantes da vida das pessoas. Não só por nos levarem sempre a uma visão de futuro, tipo "preservar para as gerações futuras", "olhar para o amanhã", "cuidar do futuro", sem senso de urgência. E de forma desconectada de nós, orientada para "salvar a natureza", "proteger os animais", "preservar árvores"...O primeiro passo para mobilizar é mudar essas narrativas.
Quando entendemos que existe uma urgência e que fazemos parte do que chamamos de natureza, mudamos de olhar: estamos preservando não somente as árvores, estamos preservando a nossa sobrevivência. Assim, tudo muda.
Poucas pessoas têm noção de que o que comem ou o que vestem tem impacto no ciclo das chuvas, por exemplo, e impacta diretamente o valor da conta de luz, de água… Poucas pessoas têm noção dos impactos da produção em massa e da exploração da natureza e demais seres. Por isso tenho falado bastante sobre a importância de olhar para o presente, para a nossa vida hoje e buscar essas conexões.
Edu: Quais foram os principais desafios encontrados por você nessa jornada de descobertas que libertam o presente?
André: Desde cedo somos levados a embarcar em uma história de desconexão com a natureza - o meio ambiente e demais seres. O sistema nos transforma em consumidores, e passamos a ver recursos naturais como algo a ser explorado e as outras pessoas como concorrentes ou alguém que deve nos servir. O nosso modo de viver é insustentável. Desconstruir isso tem a ver com desconstruir culturas e valores profundamente enraizados.
Como se não bastasse, surgem cada vez mais distrações e formas de nos manter nessa desconexão - da gente com a gente, com o mundo natural e demais seres. Por isso é urgente conectar o tema a autoconhecimento, saúde mental e propósito.
Depois de tanto tempo escrevendo e pesquisando sobre sustentabilidade, passei a reparar mais nos buracos internos das pessoas (os meus inclusive), que parecem maiores que os da camada de ozônio. E estão totalmente conectados. O consumo excessivo, por exemplo, como forma de satisfazer "necessidades" que não são nossas, e são potencializadas pelas redes sociais, pela moda, pela propaganda, está acabando com o planeta.
Edu: De que forma essas estratégias podem ser apreendidas por todos, entendendo os diferentes níveis e realidades?
André: Primeiramente compreendendo que temos diferentes experiências e realidades. O discurso "somos todos iguais", é bonito, mas não somos. Cada pessoa é um ser humano único e age da forma que age de acordo com as estruturas formadoras. É preciso buscar narrativas diferentes que ressoem em cada pessoa, em cada público.
Ao mesmo tempo que olhamos para as particularidades, é preciso buscar conexões entre as pessoas, grupos minorizados, pessoas que irão sofrer primeiro as consequências das crises emergentes para estimular a mobilização coletiva. A saída não é individual, e cada pessoa tem um papel importante.
Edu: Por onde começarmos na busca pelo presente e sua liberdade? É possível?
André: Somente a partir do entendimento sobre as estruturas que nos aprisionam em um modo de vida insustentável, poderemos de fato começar a pensar em novos presentes, mais livres, e ainda assim sustentáveis.
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