Eduardo Carvalho

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Opinião

Reflito sobre celebrar a vida em vida depois da partida de MC Marcinho

Foi bater o olho na coluna de Tony Marlon em Ecoa, publicada na semana passada, e cair uma ficha: por que não celebramos as pessoas quando em vida? Quais são os motivos que nos levam apenas a prestar reverências por seus feitos quando numa situação, por vezes, trágica? E pronto, confesso que até mesmo eu assumi um rés de culpa nessa dinâmica cruel que nos leva a aplaudir, apenas quando se parte, não podendo os indivíduos nem mesmo ouvirem os gritos e ?salvas? a eles próprios. E o bagulho não se restringe apenas às personalidades com trabalhos públicos, ou se você preferir, ?os famosos?.

É uma situação diferente da que acontece na série produzida aqui mesmo, neste lugar que posso, há dois anos, chamar de ?casa?. Em ?Oeste?, somos convidados a potencializar histórias e seus protagonistas, numa ação até mesmo mais ?difícil? do que apenas aplaudir: é preciso reconhecê-los. Sim, aqui abrimos espaço para que o nome, o trabalho e suas contribuições possam ganhar ainda mais relevância ao passo que chega em domínio público. ?Como assim essa pessoa é um herói e não conheço?? E dali em diante perceber que há milhões deles espalhados em cada esquina. Mas é preciso treinar o olhar para, justamente, enxergar possibilidade no outro.

De empresários e caubóis que se unem para salvar ?colmeias?, passando por quem cria casas para araras azuis, o valor de quem esteve à frente de uma duvidosa recriação de um safári ?tupiniquim?. A riqueza das trajetórias desbravadas pelo repórter Marcos Candido, a produtora Nathalia Mafort e os cinegrafistas Daniel Lupo e Eduardo Lima são de extremo valor para também carimbar a importância do ?nós?, num contexto esquecido depois de tanta polarização por conta da politização das relações. Uma ideia criativa sensível Fred Di Giacomo, que me honra a edição deste texto.

Não por coincidência, reflito sobre celebrar a vida em vida quatro dias depois da partida de MC Marcinho, a quem havia citado na coluna da semana anterior, ao tratar de um tema que me afeta. E que, só por conta da enfermidade dele e de Faustão, ganharam as linhas dos veículos de comunicação de todo o país, além do debate público, irrestrito e aberto que se fez obrigatório sobre a doação de órgãos no Brasil.

Queria eu, enquanto fã e jornalista, ter tido a chance de aplaudir, frente aos palcos e fora deles, a existência de Marcinho. Exaltar suas letras, canções, vida. Aprender com seus erros, acertos, expectativas projetadas para um futuro rompido muito cedo. Queria ter tido a honra de falar sobre o amor com aquele que se colocava à serviço dele. Aliás, precisamos falar, cada vez mais, de amor. Amor e a potência divina que é amar (não só quando casais como Bella Campos e MC Cabelinho ou Anitta e Susinna separam; ou mesmo quando eu, você, e a torcida do Flamengo junto).

Amor que nem Maria Ribeiro, minha fiel amiga e parceira, tem dedicado à escrita semanal no Universa, ao tornar, também nossa, sua mãe, uma linda mulher. E que deu vida a outro ser, bonito e generoso, que é Maria. Há prazer maior do que aplaudir que nos colocou aqui? Nessa toada de reconhecimento e celebração, até mesmo atravessar duros momentos se tornam belos quando refazemos a rota e saudamos a quem se deve.

Me coloco nessa a partir de hoje (um dia antes de setembro chegar com a primavera), e não só por me sentir querido frente à um tratamento e o peso que este reconhecimento tem no processo de cura. Faço isso porque é justo, bom e necessário. Para que nenhum sentimento falte e nenhuma palavra deixe de ser dita e escrita. Que sigamos atentos, perseverantes e vigilantes na celebração em vida, enquanto se pode, do outro. Tenho certeza de que não vamos nos arrepender.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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