Eduardo Carvalho

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Opinião

Danos à saúde mental: assistir a guerras gera sofrimento e nos adoece

Semanas atrás, escrevi aqui em Ecoa sobre aquilo que eu, humildemente, poderia falar em meio ao conflito que põe Israel e Palestina sob bombas.

Na verdade, confessei sobre minha impossibilidade em tratar de um fato tão profundo (que demanda estudo, tempo, calma e precisão) sem correr o risco de fazer qualquer tipo de comentário em que falte a palavra e, além dela, o mínimo de empatia.

Eu tratava sobre as tensões que mobilizam as favelas cariocas, territórios que cresci e que forjaram minha infância vivida sobre os tiros, as bombas, os 'caveirões voadores' a observar quem nos vive e, quando esse movimento de tensão descortina, o que acontece por lá.

Só que não detalhei ao certo o quanto isso impacta nossas vidas para além de viver esses episódios in loco.

O mais recente foi nesta semana, onde acompanhamos, fluminenses e tantos outros espalhados pelo Brasil, a crescente de um Rio de Janeiro dominado pela milícia, além do amontoado de pessoas tendo que refazer suas rotas, trajetos e corres, tomadas pelo medo de não saberem se iriam chegar vivas em casa. Tudo isso pela tela da TV, no meio desse povo, sem nenhum pingo de prazer, tampouco sentimento de estar 'entretido' com aquelas cenas, que mais causavam pânico em todo o resto do que apenas a sensação de estarmos informados.

Confesso aqui minhas impotências e também minhas lágrimas: é difícil tirar da cabeça os ônibus queimados, postes de luz explodindo no meio das vias, o salto de BRTs em movimento para salvar as próprias vidas. Assim como não se é possível esquecer as crianças tremendo, cheias de feridas, em Gaza. Não tem como não adoecer ao assistir a tudo isso e, sem forças, só emudecer. É foda.

Inertes, tentamos buscar solução àquilo que nos apavora. Mas, sem saber lidar com nossas incapacidades, nos frustramos.

A vontade que bate é de furar a tela e tirar quem vive sob milícia e tráfico de seus poderios; assim como nos toma o corpo o querer de colocar o próprio peito à mostra e pedir um cessar-fogo em tantos conflitos que vemos pelas imagens

Mas, no fim, lembramos a impossibilidade do corpo, que como cita Freud, é uma das principais na dinâmica do viver.

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Há que se blindar, de todas as formas, mesmo à distância ou muito próximo, para não ser acometido por nenhuma dor. E reconhecer que é preciso tratar. Nos grupos, vejo empilhar mensagens sobre danos à saúde mental por conta das guerras que nos deprimem, nos impactam, paralisam e nos impedem, sobretudo, de uma vida digna.

Fica cada vez mais distante pensar num futuro bom com o que temos. Ainda assim, tentamos pelos nossos, pelos que vieram e, emanando boas energias, por aqueles que estão por vir, na busca por algo que dê algum sentido.

No meio disso, caminhamos para o dia em que as notícias, em vez de nos manterem atualizados sobre as guerras que nos deixam doentes, sejam só de um verdadeiramente mais humano.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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