Eduardo Carvalho

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Opinião

Cidade de Deus: a crise da segurança e a busca por alternativas

Na Cidade de Deus, eis que, no terceiro dia, o Senhor não formou ''grandes oceanos e terra seca'', como no livro sagrado, a Bíblia. Sob os céus de um ano que nem mesmo conseguiu mostrar sua carta de apresentação, os moradores estão imersos em uma operação. Mas não uma qualquer, e sim aquela que durará 24 horas - de quarta-feira, momento em que escrevo, até quinta, quando estas palavras ganharão a sua companhia.

A justificativa? Os recordes de números na seara da segurança pública, que fizeram da zona oeste do Rio de Janeiro um estado à parte em relação à temática. Ao todo, só em novembro de 2023, 76 tiroteios ocorreram na região, o equivalente a 37% de todos os tiroteios na região metropolitana do Rio de Janeiro ao longo do mês, segundo aponta o Fogo Cruzado, instituto que contabiliza e afere a situação de cada local da capital.

Na amostragem feita pela organização, é como se em média tivessem ocorrido mais de dois tiroteios por dia na zona oeste, que também acumulou, antes do ano acabar, o maior número de baleados. Ainda como prerrogativa para a ação, pesam os fatos de prender criminosos, além de retirar barricadas e recuperar veículos roubados e/ou clonados por civis armados.

Da minha cabeça, só tristeza. Não deveria nos ser 'normal' o fato de uma incursão ser feita desta maneira, atravessando a vida de milhares de pessoas e impedindo os serviços mais básicos de serem realizados. Sobretudo, o serviço fundamental: o direito de viver. Por causa da ocupação, o Centro Municipal de Saúde Hamilton Land e a Clínica da Família Lourival Francisco de Oliveira tiveram que fechar.

Na visão de quem é, para sempre, cria de favela, pensar os períodos de festividades e a entrada da polícia dentro dos becos e vielas, impedindo o mínimo de lazer, é viver em alerta. Sempre. É justamente onde há maior concentração de moradores e abarrotam-se aos montes crianças e jovens, em férias, que se revezam entre cuidar de si e dos parentes e vizinhos enquanto os responsáveis trabalham. O coração vai à boca só de imaginar que eu já fui essa criança.

Mas onde há lamento, há cobrança. O governo estadual do Rio, mesmo com a chegada de um secretário e a pasta de Segurança Pública recriada, não mostra planos. Sobre a operação, nenhum comentário do governador, que exaltou os agentes de segurança durante o Réveillon.

Assim é na esfera nacional. Passado o primeiro ano do governo (que nos tirou da pior), é preciso agir ao invés de falar. E nesse caso, apresentar alternativas.

Na terra com nome santo, espero que até o sétimo dia - do ano e por todo ele - o saldo da criação não seja o da morte.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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