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Fred Di Giacomo

REPORTAGEM

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Novo colunista de Ecoa garimpa empresas que geram impacto social e lucro

O escritor e colunista do UOL Tomas Rosenfeld - Flávia Borger/Acervo Pessoal
O escritor e colunista do UOL Tomas Rosenfeld Imagem: Flávia Borger/Acervo Pessoal

05/04/2021 15h41

A vida do escritor e consultor em inovação social Tomas Rosenfeld, 34, mudou quando ele era um jovem de 14 anos e passou a fazer trabalho voluntário. "Depois disso, sempre tive alguma relação com a área social", diz Tomas.

Autor de dois romances - "Para não dizer que não falei de Flora (Editora 7Letras, 2015)", finalista do Prêmio São Paulo de Literatura, e "Vão Livre" (Editora Reformatório, 2019) - Tomas ganhou uma bolsa para passar na Alemanha "18 meses conversando com dezenas de empreendedores que criaram organizações buscando conciliar dois aspectos nem sempre fáceis de serem equilibrados: lucro e impacto social positivo".

Rosenfeld, que agora inicia um doutorado focado na Amazônia, descobriu nesses 18 meses de pesquisa histórias como a da empresa "Discovering Hands, fundada por um ginecologista que emprega mulheres cegas para detectar o câncer de mama. Com o tato mais aguçado, elas conseguem identificar pequenos nódulos em um processo que é mais barato do que os exames de laboratório e ainda emprega deficientes visuais".

E para falar sobre essas empresas que buscam dar lucro gerando impacto social que Tomas Rosenfeld estreia, quarta-feira (7), sua nova coluna aqui em Ecoa.

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Ecoa - Como você se envolveu com o terceiro setor?

Tomas Rosenfeld - Minha primeira experiência no setor foi como voluntário - na época, eu devia ter uns 14 anos. Resolvi que queria voluntariar e passei a frequentar semanalmente um lar de idosos na Vila Mariana. Aprendi muito nesse período. Lembro que a Folha de S. Paulo na época fez um caderno especial sobre voluntariado e me chamaram como um jovem voluntário. Eu e um pequeno grupo fomos lá na sede deles no centro de São Paulo e tiraram fotos nossas no heliporto do prédio, na cobertura. Acho que a experiência como um todo de ter sido voluntário foi bem definidora - ficou para mim essa sensação do aprendizado, das dificuldades, mas também da liberdade, do horizonte, e da possibilidade de mudança.

Depois disso, sempre tive alguma relação com a área social. Tive ainda algumas outras experiências como voluntário e depois passei dez anos trabalhando em uma empresa social, chamada Reos Partners. Lá, participei em projetos dos mais diversos, com temas que iam da democracia na América Latina, ao futuro do setor têxtil no Brasil, passando pela elaboração do orçamento participativo de um pequeno município. Sempre, em todos esses projetos, participavam pessoas dos três setores: empresas, representantes do setor público e de entidades do terceiro setor. Com isso, minha percepção do que é transformação social ganhou uma nova forma. Nos últimos anos, essa curiosidade com relação a essas transformações foi crescendo e resolvi dedicar-me mais à atividade de pesquisa.


Qual foi seu projeto de pesquisa em Berlim?

Esse projeto foi o resultado de uma oportunidade muito legal que recebi da Fundação Alexander von Humboldt. Todos os anos, um grupo de pessoas de cinco países (além do Brasil, Rússia, Índia, China e Estados Unidos) passa um período de pelos menos um ano realizando uma pesquisa, como parte de um programa de "fellowship" financiado pela chancelaria do governo alemão.

Para a minha pesquisa, eu tive também o apoio do escritório de Berlim do Impact Hub, uma das maiores redes de empreendedores sociais do mundo. Lá, eu passei 18 meses, conversando com dezenas de empreendedores que criaram organizações buscando conciliar dois aspectos nem sempre fáceis de serem equilibrados: lucro e impacto social positivo. Foi muito interessante ter essa visão de empresas sociais trabalhando em um contexto que é tão diferente do nosso.

Que histórias inspiradoras você descobriu nessa pesquisa?

Descobri várias histórias muito legais. Algumas das mais interessantes são as de empresas que oferecem serviços que conseguem de uma só vez resolver mais de um problema. Um exemplo é a Discovering Hands, fundada por um ginecologista que emprega mulheres cegas para detectar o câncer de mama. Com o tato mais aguçado, elas conseguem identificar pequenos nódulos em um processo que é mais barato do que os exames de laboratório e ainda emprega deficientes visuais, que geralmente têm mais dificuldade para entrar no mercado de trabalho.

Outro caso é a Auticon, que emprega pessoas no espectro autista para atividades de consultoria na área de TI. Como as pessoas dentro de espectro de autismo são geralmente muito boas em perceber padrões e se concentrar em algumas atividades, acabam tendo um ótimo desempenho na área de tecnologia.

Conversei também com empreendedores que fundaram uma agência de empregos para incluir refugiados ao mercado de trabalho, uma empresa que fabrica rações para cachorros a partir de insetos ou ainda outra que usa a tecnologia de blockchain para rastrear a cadeia de valor de metais preciosos.

Enfim, foram muitas histórias de empresas que conseguem gerar um impacto social positivo e ainda dar lucro.

O que podemos esperar da sua coluna em Ecoa?

Minha ideia é aproveitar esse espaço para falar de empresas e iniciativas que buscam oferecer soluções para os desafios sociais e ambientais que enfrentamos hoje. Com certeza vou trazer muitos exemplos e reflexões desse último período vivendo na Alemanha, mas também trarei diversas iniciativas que estão acontecendo hoje no Brasil.

Neste momento, estou também iniciando um doutorado, com foco na Amazônia. Então certamente casos da bioeconomia estarão presentes. A ideia é trazer experiências diversas, tanto em termos geográficos como temáticos.

Acredita que é possível um futuro em que todas empresas abracem de fato responsabilidade social, uma produção sustentável?

Para alguns setores será bastante desafiador, mas acredito que muitas empresas estão nesse caminho e, no futuro, será muito difícil evitar o caminho da sustentabilidade.


Você também é escritor de ficção com dois livros publicados, né? Como essa experiência na literatura vai aparecer na sua coluna?

Capa - Reprodução - Reprodução
Capa do livro "Vão Livre" (Editora Reformatório) de Tomas Rosenfeld
Imagem: Reprodução

Sim, a experiência com a escrita e a literatura são bem importantes para mim. Eu acredito que a ficção nos ajuda a imaginar realidades e situações diferentes e, nesse sentido, conversa bastante com esse universo das questões socioambientais. Temos muitos desafios nessa área e, se não conseguirmos imaginar alternativas, estaremos perdidos. Para a coluna, vou tentar trazer esse lado da ficção que nos transporta para diferentes lugares e situações.