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Fred Di Giacomo

REPORTAGEM

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Herdeiros de Zumbi: conheça o rap quilombola do Realidade Negra

O grupo de rap quilombola Realidade Negra, de Paraty (RJ) - Divulgação
O grupo de rap quilombola Realidade Negra, de Paraty (RJ) Imagem: Divulgação

08/06/2021 06h00

Malcolm X foi demais, mas você tem que se lembrar que foi Zumbi que libertou nossos ancestrais Planet Hemp, "Rappers Reais"

Zumbi dos Palmares está para o rap nacional, assim como Malcolm X está para o rap norte-americano. O guerreiro, que liderou a resistência à escravidão no Quilombo dos Palmares, foi cantado por mcs importantes de todos os cantos do Brasil como Emicida, Mano Brown, Marcelo D2 e Thaíde -- entre muitos. Zumbi inspirou grafites, fanzines, grupos de rap e autores de literatura marginal.

Tenho orgulho e bato no peito, sou descendente de Zumbi, grande líder negro brasileiro/Por nossa liberdade enfrentou exércitos inteiros/Mas acabou perdendo a cabeça e não é a cara dele que eu vejo nas camisetas, nos bottons, toucas ou bombetas/ Nem Ganga Zumba eu vejo nas jaquetas, Thaíde e DJ Hum, "Afro-Brasileiro"

Mas, apesar de existirem muitos grupos de rap que se inspiram nos antigos quilombos ou que procuram praticar o "aquilombamento", é raro ver na mídia um grupo de rap formado por quilombolas. Este é o caso do Realidade Negra, surgido no Quilombo Campinho da Independência, comunidade localidade na cidade de Paraty (RJ).

Gosto de Nelson Mandela, admiro Spike Lee, Zumbi, um grande herói, o maior daqui, Racionais Mc's, "Júri Racional"

Na ativa há quase duas décadas o Realidade Negra faz rap com letras politizadas e contestatórias que reivindicam os direitos dos povos tradicionais. Os cabeças do grupo são a dupla de rappers Nelião e Mano Romero, que rimam sob as bases tocadas por Body Power (baixo e voz); Negro Naldo (guitarra e voz); B2 (guitara) e Fabio Black (bateria). Em 2009, o RN gravou o CD "Realidade Negra - É prus guerreiros a missão", no Quilombo do Campinho, e desse trabalho saiu a música oficial da campanha "O Brasil é Quilombola - Nenhum Quilombo a Menos."

Trago em mim o que fez Zumbi perecer/O que fez Zumbi merecer, o que fez Zumbi aparecer/Pra que nossa disposição Emicida, Nóiz

Ouvir o som do grupo, e suas reivindicações, nos faz lembrar que, ao contrário do que aprendemos na escola, os quilombos não são uma coisa do passado que acabou com a escravidão. Existem, no Brasil todo, pelo menos 3.524 comunidades como o Campinho da Independência, segundo dados da Fundação Palmares. No último país das Américas a abolir a escravidão é bom que relembremos disso. O rap quilombola respeita o passado, mas não está preso a ele. Na verdade, é uma forma de escrever o futuro dessas comunidades afro-brasileiras espalhadas pelo Brasil.