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IPT quer ser farol da economia circular no país
Em 1899, uma publicação com avaliações de características de matérias-primas da construção civil marcava a criação do Gabinete de Resistência de Materiais, por Antônio Francisco de Paula Souza, em São Paulo, que viria a se tornar o atual IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas).
Passados 122 anos, o mais antigo centro de pesquisas de tecnologia do Brasil quer liderar e se tornar referência em projetos e empreendimentos de transição da economia linear para a economia circular unindo empresas, cidades e campo usando pesquisa e inovação.
No início de junho, o instituto anunciou a criação do Centro Brasileiro de Inovação em Economia Circular, que pretende articular governos estaduais, municipais e instâncias federais, instituições científicas e de inovação, organizações da sociedade civil, iniciativa privada e agências de fomento para a aplicação de soluções circulares em produtos, serviços, processos e modelos de negócios.
O objetivo do novo centro é ser um influenciador, facilitar acesso a recursos tecnológicos e atrair investimentos para implementar projetos nas cadeias produtivas nacionais e em colaborações internacionais. Nessa área, já foram firmados dois acordos. Em parceria com a empresa E4CB, o novo centro já assinou cooperação com o Laboratório Colaborativo para a Economia Circular (Cecolab), de Portugal, e a Rede Africana de Economia Circular, que reúne 31 países incluindo África do Sul, Angola, Egito e Nigéria.
Em fevereiro de 2021, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industria lançaram a Aliança Global sobre Economia Circular e Eficiência de Recursos (GACERE), para dar impulso global a iniciativas relacionadas com a transição da economia circular, eficiência de recursos, padrões de consumo e produção sustentáveis e industrialização inclusiva e sustentável.
A Aliança visa reduzir a dependência global de matérias-primas virgens e analisa possibilidades de utilização da política comercial para a promoção do comércio na economia circular e já tem adesão de Canadá, Chile, Colômbia, Japão, Quênia, Nova Zelândia, Nigéria, Noruega, Peru, Ruanda e África do Sul. O Brasil não está na lista.
Em entrevista à coluna, a diretora de Inovação e Negócios do IPT, Cláudia Echevenguá Teixeira, conta que um dos projetos do novo Centro Brasileiro de Inovação em Economia Circular é a construção de uma carta da economia circular brasileira, com parâmetros locais e metas para a transição e para auxiliar a construção de políticas públicas. A seguir, trechos da entrevista.
Como será o trabalho do novo centro e o que muda no IPT?
Em novembro de 2020, fizemos uma revisão no IPT e passamos de 11 unidades para sete, para trabalhar de forma cada vez mais transversal. Nessa reformulação, decidimos apostar em quatro áreas estratégicas: materiais avançados, inteligência artificial, biomanufatura e economia circular. A economia circular é um transversal no nosso conceito de ecossistema de inovação, em que o objetivo é conectar todos os agentes. Parte da missão do IPT é auxiliar pequenas empresas. Temos desenvolvido programas de desenvolvimento econômico para cidades em que avaliamos também o papel dos cidadãos e trabalhamos com os conceitos de cidades inteligentes, sustentáveis, resilientes e circulares, e ai entra toda a questão da logística reversa da indústria. O centro pretende criar o ambiente para mais parcerias, ajudar a construir a mentalidade da economia circular e ser um influenciador de boas práticas para tecnologias de baixo carbono, ajudar na construção de políticas públicas de temas de relevância para o país. Nossa posição dentro da política de inovação nos permite atuar nesse meio. O IPT está com sua bandeira.
Pode dar exemplos de projetos?
Já vínhamos desenvolvendo projetos de transformação de resíduo em matéria-prima, de ajudar o desempenho de cooperativas de reciclagem e de logística reversa. Queremos construir novos modelos de negócios nas intersecções entre indústrias, por exemplo, juntando a indústria de alimentos com a indústria de cosméticos, criando novos mercados no conceito de economia industrial. Segundo esse conceito, precisamos compartilhar insumos como água, energia, podemos usar o que há em comum e que não concorre nos produtos finais. Não é simplesmente reciclagem, é conseguir extrair novos materiais que podem gerar novos produtos. Para isso, estamos criando uma plataforma para criar os matchs. Um exemplo é a transformação de escoras de aciaria fundida para a fabricação de cimento. Outro exemplo dessa pauta tecnológica é um projeto de um equipamento de desmontagem de lâmpadas LED, em parceria com uma empresa. Agora estamos em avaliação do mecanismo para conseguir recursos e ter escala e colocar em prática. Outro exemplo é um projeto de aproveitamento de casca de salsicha para fazer um polímero. Queremos colocar junto empresas diferentes para que possam construir algo novo.
O IPT fez planos de resíduos para o litoral de São Paulo e um plano de desenvolvimento para o Vale do Ribeira. Nesses projetos se aplicam os conceitos da economia circular?
Para o litoral de São Paulo, fizemos um sistema de metas para os municípios com o objetivo de aumentar a logística reversa e melhorar a infraestrutura para as cooperativas de catadores. Em Bertioga tivemos bons resultados atuando também na ergonomia dos equipamentos em estrutura de pequena escala. Nos projetos de desenvolvimento de regiões estamos avaliando as oportunidades nos polos já existentes de comércio e indústria locais para estimular parcerias em economia circular.
O que pode vir das parcerias internacionais?
Hoje já existe em vários países trabalhos para estabelecimento de metas de produção que auxiliem o combate ao aquecimento global, com várias iniciativas e acordos. Precisamos participar e construir nossas metas. Então, nos unimos a países também em desenvolvimento para somar esforços na construção desse entendimento. Queremos montar a carta brasileira de economia circular. Estamos começando a discutir o regramento no âmbito das cidades inteligentes. Precisamos de indicadores e achamos que seria interessante ajudar a construir documentos dessa natureza. Somos um catalisador para isso.
Existem índices que comparam a circularidade de vários países
Sim, existem métodos criados por empresas, que você pode aplicar ou não, mas o fato é que no Brasil isso não é claro, não sabemos quão circular o país é. Queremos fazer a discussão das metas do Brasil. Quer queira quer não, temos de ter um posicionamento estratégico para acompanhar as mudanças. Pegue por exemplo as metas europeias no plano de ação de economia circular da comunidade europeia. Ali, no tópico do ecodesign, existem parâmetros como que os produtos têm de ter uma porcentagem determinada de matéria secundária (reciclada). Ou sobre não uso de determinado resíduo perigoso. São criados normas e sistemas para que os materiais voltem para a economia, circulem.
O Chile lançou em janeiro um compromisso nacional com a economia circular
Há várias iniciativas na América Latina. A diferença da nossa entrada é que nós já temos um trabalho nesse meio industrial, já trabalhamos com pesquisa tecnológica e já temos uma rede de conexões que ajudam nessa transição e entendimento. Podemos trazer o conceito e parte dessa cultura de mudança para as empresas.
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