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Mara Gama

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Câmara aprova PL da Grilagem, que anistia e incentiva invasões

Assentamentos no Pará são ameaçados por grilagem, violência e fogo - Paulo Fridman/Corbis via Getty Images
Assentamentos no Pará são ameaçados por grilagem, violência e fogo Imagem: Paulo Fridman/Corbis via Getty Images

Colunista do UOL

04/08/2021 15h08

"O parlamento segue priorizando a flexibilização de regras e não a proteção de vidas", sintetizou a deputada federal Joenia Wapichana (Rede-RR) ao comentar na noite desta terça (3), a aprovação, por 296 votos, na Câmara dos Deputados, do texto base do PL 2.633 de 2020, o PL da Grilagem de terras.

O projeto de lei é chamado assim porque anistia invasões de terra ao dar títulos a propriedades que foram tomadas, privatizando bem público ou de direito de indígenas. E, além de seu efeito estrito na questão fundiária, de estímulo à continuidade das ocupações ilegais, tem potencial de aumentar o desmatamento e consequentes emissões de gases do efeito estufa, comprometendo a qualidade de vida e as metas ambientais globais do Brasil.

Foram 136 votos contra e uma abstenção. O PL agora segue para o Senado e há expectativa de que o texto possa piorar, recebendo trechos ainda mais favoráveis aos invasores de terras e à flexibilização das salvaguardas ambientais.

O projeto estabelece que as terras ocupadas até 2008 podem ser regularizadas, mas prevê que áreas de ocupação posterior possam ser legalizadas por licitação, com regras definidas por decreto do Poder Executivo.

O texto aumenta o tamanho de terrenos da União passíveis de regularização sem vistoria do Incra dos atuais quatro módulos fiscais (o módulo varia de tamanho dependendo da região) para seis módulos fiscais. Essa liberação de vistoria é danosa, pois impede que sejam apontados impedimentos para preservar áreas de unidades de conservação e terras indígenas.

Para obter título da terra ocupada, são necessários documentos básicos e apenas uma declaração do ocupante da terra de que está seguindo normas ambientais da região. Isso abre caminho para legalização de invasões onde há comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas.

O estudo "Conexões entre o CAR, desmatamento e o roubo de terras em áreas protegidas e florestas públicas", do Instituto Socioambiental (ISA), detectou a explosão da invasão de terras públicas na Amazônia e o consequente aumento do desmatamento nessas áreas entre 2018 e 2020 e apontou relação direta entre a grilagem e a destruição da Amazônia.

O estudo analisou os registros do Cadastro Ambiental Rural (CAR), declaração do próprio proprietário, que deveria ser validado pelos órgãos ambientais dos Estados. O caso é que essa validação nem sempre acontece.

O desmatamento acumulado no interior dos registros do CAR em sobreposição com as florestas públicas explodiu em 2020 quando comparado com o ano de 2018, passando de 185.065,8 hectares para 366.660,4 hectares, um aumento de 98%, segundo o estudo. Além dos problemas já apontados, o documento destaca que a aprovação do PL favorece médios e grandes produtores rurais em detrimento de agricultores familiares, povos indígenas e comunidades tradicionais.

"O PL traz como uma das principais mudanças a possibilidade de regularização fundiária de posses em terras públicas não destinadas em todo o país. Com essas mudanças é possível regularizar cerca de 55 a 65 milhões de hectares de terras da União não destinadas em todo o Brasil".

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O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
Imagem: Mateus Bonomi/AGIF/Estadão Conteúdo

Como registrou o Observatório do Clima, a aprovação do PL da Grilagem deve turbinar a corrida às terras públicas na Amazônia, o principal motor do desmatamento do bioma, responsável por mais de um terço da devastação. E como o desmatamento é responsável por cerca de 45% das emissões brutas de gases de efeito estufa no país, o PL da Grilagem deve também aumentar substancialmente as emissões do Brasil.